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Chang não será responsabilizado em Moçambique por crimes julgados nos EUA

O Procurador-Geral da República disse, hoje, que Manuel Chang não poderá ser julgado em Moçambique, pelos mesmos crimes já julgados nos EUA. Américo Letela explicou ainda que o julgamento do  antigo ministro das Finanças não trouxe nenhum benefício a Moçambique, tanto pela pena aplicada, como pelo ressarcimento ao Estado. “Como se pode constatar, a pena que lhe foi aplicada é

Ainda sentado no banco dos réus, António Carlos do Rosário, o último réu a ser ouvido pelo Tribunal, disse, esta quinta-feira, que está estar a assistir a um festival de falsificação de documentos.

Tudo começou quando foi questionado sobre a existência de um interesse legítimo do co-réu Armando Ndambi Guebuza, no âmbito do projecto da Zona Económica Exclusiva e sobre a razão da troca da correspondência. A esta pergunta o réu respondeu positivamente, confirmando que é titular do endereço electrónico, mas nunca enviou e-mail ao co-réu Ndambi Guebuza, porque não tem o seu endereço electrónico.

“Para começar, nunca enviei nenhum e-mail, porque nunca tive endereço dele. Não conheço este e-mail, mas confirmo que o e-mail é meu. É difícil ter o endereço de alguém que não conheço. Se existe o tal e-mail gostaria de ver. Conheci o Ndambi no Língamo”, afirmou António do Rosário.

Do Rosário disse que não faz sentido ter sido ele a enviar o e-mail, porque, pelo conteúdo do mesmo, se trata de um assunto do serviço e não usa o seu e-mail pessoal para tratar de assuntos laborais. O réu alega que, na respectiva data (14 de Maio de 2015), a Ematum estava em funcionamento.

O réu foi confrontado com e-mails que terá trocado com o co-réu Ndambi Guebuza, mas manteve as suas respostas. O réu nega ter trocado os e-mails e disse que não podem constituir prova, porque não foram extraídos dos seus dispositivos, mas sim dos dispositivos de Ndambi Guebuza.

Relativamente ao contrato de financiamento da Ematum, o réu disse que já não se recorda quem negociou, mas faziam parte das negociações quadros do Ministério das Finanças, como é o caso de Isaltina Lucas e um quadro do Ministério da Defesa de cujo nome não se recorda.

Também não se recorda de quais eram os termos e condições exigidas pelo banco VTB para conceder o financiamento.  Referiu ainda que este banco foi indicado pelo coordenador do Comando Operativo, mas não se recorda do tempo em que tal aconteceu. Depois de ter percebido que o banco Credit Suisse estava a mostrar indisponibilidade para financiar, o réu António do Rosário disse que o coordenador orientou que se recorresse ao banco russo VTB.

Esta indicação, segundo o réu, foi feita numa reunião onde ele e co-réu Gregório Leão, na qualidade de director-geral do SISE, estavam presentes.

Segundo o Ministério Público, no dia 16 de Agosto de 2013, Gregório solicitou ao ministro das Finanças a emissão de garantia. Tendo em conta que, na altura, o PCA da Ematum era António Carlos do Rosário, o Ministério Público questionou ao réu se terá sugerido ao seu director para solicitar a garantia. A esta pergunta, o réu disse que a solicitação foi feita pelo coordenador do Comando Operativo.

“A solução de solicitar a garantia foi feita pelo coordenador do Comando Operativo e eu simplesmente tratei de redigir a carta para ser assinada pelo director-geral e não solicitou directamente ao Ministro das Finanças. As nossas instruções eram verbais e não escritas. A instrução foi dada oralmente” e, por isso, não tinha como provar.

“Como as decisões sempre foram orais, não existe nenhum documento que possa provar. O reu nunca apresenta um documento de suporte das suas legalizações”, acrescentou.

Na sequência do interrogatório, o Juiz disse que o réu não colabora por não revelar os nomes das pessoas para que o tribunal possa questioná-las.

O Ministério Público pediu ao réu que explicasse a discrepância do contrato de financiamento e o valor. E, por ainda descredibilizar as provas do Ministério Público, o réu solicitou a leitura dos contratos de financiamento e disse que não podiam ser reais, porque falta assinatura do Ministério das Finanças e do Credit Suisse que deviam estar nas mesmas páginas.

Questionado se, para além de emitir a garantia, o ministro das Finanças tinha obrigação de assinar os contratos de financiamento, o réu remeteu-se ao silêncio.

O réu António Carlos do Rosário disse, hoje, que o Governo materializou um documento para o incriminar, tendo sublinhado ainda que nunca submeteu ofício algum com rabiscos ao gabinete do Primeiro-Ministro.

Hoje, continuou o interrogatório a António Carlos do Rosário, tido como uma das peças-chave no caso das dívidas ocultas. No sexto dia da sua audição, as questões do Ministério Público (MP) estiveram viradas para os contratos de financiamento, de 500 milhões de dólares, do Banco Russo de Investimentos, VTB Capital, a empresa de reparações marítimas, MAM.

“Havia uma inclinação para Rússia por ser um país amigo. O primeiro contacto foi feito pelo conselho coordenador, onde estava o director-geral do Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE) e depois fomos apresentar a viabilidade ao Ministério das Finanças”, disse António Carlos do Rosário.

O réu diz ainda que não reconhece assinaturas que aparecem no documento que o liga a algumas operações que culminaram com uma parte das dívidas ocultas, acrescentando que não faz sentido que tenha trabalhado com a Procuradoria-Geral da República de forma íntegra em 2015 e, no ano seguinte, tenha entregado um ofício rabiscado ao Primeiro-Ministro.

O Juiz do caso, Efigénio Baptista, interveio afirmando que se o Tribunal concluir que a assinatura não é do réu, o documento será descartado, caso contrário, “a instituição que defende a Justiça, no país, vai pensar que o fez para confundir ainda mais o processo e seu advogado sabe o que fazer se o documento for falso”.

Na ocasião, o Ministério Público questionou sobre as especificações dos bens fornecidos e valores envolvidos na sua aquisição.

O réu respondeu que o valor do financiamento é maior que valor do estudo do projecto, devido às taxas das comissões no momento da organização para a sua implementação.

E é do mesmo contrato que deviam ser obtidas as lanchas, que o réu não quis por fazerem parte dos “segredos” do Estado, acrescentando que os itens adquiridos culminariam com as intervenções em três bases de Pemba.

“Nós nunca nos preocupamos com o preço de cada item, apenas queríamos gerar soluções de acordo com as necessidades do país à data dos factos”, disse Do Rosário.

A audição ao antigo director da Inteligência Económica do SISE, António Carlos do Rosário tem sido caracterizada por momentos de tensão.

O réu António Carlos António do Rosário, que continua a ser interrogado pelo Ministério Público (MP), no seu sexto dia, disse, esta quinta-feira, ao Tribunal que “A MAM é a nossa galinha de ovos de ouro do Sistema Integrado de Monitoria e Protecção (SIMP)”. Isto é, das três empresas (MAM, EMATUM e PROÍNDICUS) do SIMP, segundo o réu, a MAM era a empresa que tinha a possibilidade de gerar mais receitas e ir ao auxílio de outras duas.

O réu diz ainda que as Dívidas Ocultas foram problematizadas e não deviam existir.

Relativamente à criação da MAM, o antigo director de Inteligência Económica do Serviço de Informação do Estado (SISE), António Carlos do Rosário, disse ao Tribunal que a empresa surgiu da necessidade de garantir que os pequenos meios da PROÍNDICUS e EMATUM não se transformassem em sucata.

“A MAM surgiu como oportunidade de negócio crescente e tínhamos potencial, havia um mercado potencial que permitiria que as Forças de Defesa e Segurança (FDS), através da MAM, facturassem o suficiente para pagar o valor que se reclama hoje das Dívidas Ocultas que o Governo transformou em Dívidas Oculta contra nossa vontade”, explicou o réu.

Para o antigo PCA das três empresas, a MAM teria viabilidade para o sucesso da PROÍNDICUS e EMATUM. E, em dois anos, a empresa “teria pago essas dívidas que o Governo actual fez questão de transformar em dívidas do Estado. As projecções que se faziam para Moçambique teriam uma evolução de 60 milhões de dólares por conta do investimento”.

Na sequência da criação da EMATUM, o Ministério Público perguntou ao réu quem decidiu a composição dos accinonistas da MAM. A esta pergunta, António do Rosário respondeu que foi o coordenador do Comando Operativo, no seu gabinete. Entretanto, não se recorda da data, mas “foi no mesmo dia que esteve presente o co-réu Gregório Leão”.

O réu esclareceu ao Tribunal que a eleição dos accionistas foi feita por orientação do coordenador do Comando Conjunto.

“Os accionistas são indicados mediante a decisão do coordenador do Comando Conjunto. Nós cumprimos e não questionamos”, afirmou o réu.

Para os membros do Conselho de Administração, segundo o réu, foram eleitos o réu António Carlos do Rosário, o administrador Raúl Firá, Agy Alaué, da área técnica e operações e logística”.

Ainda no decurso do interrogatório sobre a composição dos membros do Conselho de Administração (CA), o Ministério Público perguntou ao réu sobre os critérios usados para a selecção dos membros do CA, da qual ele faz parte, tendo o réu explicado que foram indicados por causa da sua competência técnica.

“Eu era membro do SIMP e, segundo as instruções do Comando Operativo, eu tinha que estar a frente pela confiança e fiquei PCA. E os outros foram eleitos por serem quadros altamente competentes, de confiança e abnegados à causa”, disse o réu.

Tendo o objecto social da MAM, o réu foi questionado como entender que esta empresa (A MAM) está ligada às FDS. A esta pergunta, o réu esclareceu que a ideia, a partir do objecto, era esconder que a MAM era uma empresa ligada às FDS.

Uma vez que nada acontece por acaso, o Ministério Público perguntou ao réu por que na concepção da PROÍNDICUS houve um memorando assinado pelos titulares de órgãos de criação e o mesmo exercício não aconteceu na criação da MAM.

“Queríamos acautelar o risco de fuga de informação”, respondeu o réu.

ESTUDO DE VIABILIDADE

Assim como outras empresas, o réu esclareceu ao Tribunal que quem concedeu o estudo de viabilidade foi a mesma equipa do SIMP.

“Foi a minha equipa. Eu é que dirigi o estudo de viabilidade. A equipa era composta por mim, por um técnico do SISE cujo nome não posso revelar, um técnico da Defesa cujo nome também não posso revelar, porque estaria a pôr em causa o seu bom nome no desempenho das suas funções; dois consultores internacionais cujas identidades também não posso revelar”, acrescentou o réu.

Em termos de geração de receitas, António do Rosário disse que não se recorda do que previa o estudo.

“Já não me recordo, porque já não tenho acesso aos documentos. Não quero correr riscos de adivinhar.”

Uma vez que o réu não se recordava, o MP confrontou-o com o estudo que consta dos autos. António do Rosário confirmou que o documento em causa é da sua equipa.

“Confirmo que este documento é da minha equipa. Confirmo que tem elementos que fazem parte do estudo de viabilidade e de negócios, mas não sei como veio parar aqui.”

Depois de apreciar o documento, o Ministério Público quis saber do antigo director de Inteligência Económica do Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE) se conseguia extrair a componente de Defesa e Segurança. O réu reiterou que o objectivo do estudo não era referir que a empresa pertencia às Forças de Defesa e Segurança.

“Como disse, a ideia do estudo não era dizer que a MAM era das FDS. Tem [tinha] que parecer meramente empresa comercial. A ideia era encobrir, porque isso não mencionamos directamente nos estudos ou documentos.”

Questionado se os membros da direcção da MAM entendiam que a empresa estava ligada às Forças de Defesa e Segurança, o réu respondeu positivamente.

Relativamente ao contrato de fornecimento de 500 milhões de dólares, o réu afirmou que do lado moçambicano foi celebrado pela equipa do SIMP que incluía os quadros da Defesa e Segurança. Por motivos de segurança, o réu recusou-se a fazer referência aos nomes. António do Rosário disse que o contrato foi negociado em 2014, mas não se recorda da data exacta.

“A mesma equipa, que celebrou o fornecimento da PROÍNDICUS, é a mesma que celebrou este contrato. Era uma equipa séria.”

Segundo o réu, a negociação dos contratos das três empresas levou mais tempo, principalmente da MAM e a mesma equipa ia cobrar barcos.

ANTÓNIO DO ROSÁRIO DIZ QUE MAPUTO SHIPYARD PERTENCE 100% A MAM

Ainda na sequência do interrogatório ao réu António Carlos do Rosário no âmbito do “caso dívidas ocultas”, o Ministério Público questionou ao réu se existia alguma relação entre a empresa MAM e Maputo Shipyard e o que justifica a criação da Maputo Shipyard.

A esta pergunta o réu disse que “a Maputo Shipyard pertence 100% a MAM. A Maputo Shipyard, segundo o réu, é o desdobramento das operações da MAM.

“A era em que a MAM está a crescer. E vamos tornar a Maputo Shipyard uma empresa independente. O equipamento que lá está é adquirido pela MAM”, esclareceu Do Rosário, acrescentado que a empresa (Maputo Shipyard) não tem PCA e o réu nunca teve um gabinete naquelas instalações.

Pelo quinto dia, o réu António Carlos do Rosário que, à data da sua prisão, era director de Inteligência Económica do Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE), continua a responder às perguntas do Ministério Público (MP), tendo a uma das quais respondido que não existe nenhum documento que comprova que Ematum pertence às Forças de Defesa e Segurança (FDS).

Esta terça-feira, entre vários assuntos, a criação da Ematum voltou ao centro das atenções de debate, na tenda da B.O.

Inicialmente, em termos de estudo de receita, o MP questionou ao réu o que previa o estudo de viabilidade da Ematum. Ou seja, o que se teria em termos de receitas operacionais. Segundo o Ministério Público, consta dos autos que a Ematum devia gerar receitas operacionais estimadas em duzentos e vinte e quatro milhões, duzentos e trinta e seis mil, novecentos e dezoito dólares.

Antes que o réu explicasse sobre o estudo de viabilidade, o Ministério Público questionou ao réu quem elaborou o estudo. À questão o réu António Carlos do Rosário reagiu: “Este estudo foi dirigido por mim e foi elaborado com participação dos membros da minha equipa e dois consultores internacionais. Andei com eles nas instituições moçambicanas a colher informação”, disse, mas não revelou os nomes dos consultores.

“Para a segurança deles, atendendo que este assunto teve depois contornos muito difíceis para a vida de muita gente, uma vez que os contactei por via dos canais operativos do SISE, sou obrigado a protegê-los por lei”, acrescentou o réu.

Questionado se o estudo de viabilidade previa que a Ematum estivesse ligada à matéria de Defesa e Segurança, o réu disse que não estava expressamente ligada, “porque o estudo de viabilidade é submetido a várias instituições, incluindo os bancos. Nós não queríamos que os bancos soubessem que a Ematum estava ligada à segurança”.

Porque as respostas ainda não estavam claras, a procuradora Ana Sheila Marrengula perguntou ao réu se existia um documento que faz menção que a empresa (Ematum) está ligada à matéria de Defesa e Segurança. A esta pergunta, o réu afirmou que não existe.

“Não existe e fizemos de propósito não fazer isso. Documento como tal que diga que a Ematum pertence às Forças de Defesa e Segurança não existe, porque é uma vertente encoberta. A única prova que existe que ficou lá na empresa é a transferência do equipamento adquirido ao abrigo da Ematum para a PROÍNDICUS.

Neste 29º dia do julgamento do “caso dívidas ocultas”, António Carlos do Rosário foi confrontado pelo Ministério Público com o pedido adicional de garantias soberanas no valor de 278 milhões de dólares para a ProÍndicus, que haveria de totalizar mais de 900 milhões de dólares.

O antigo Director-Geral do SISE, Gregório Leão, solicitou a emissão de uma garantia no valor de 278 milhões de dólares, a acrescentar a dívida de 622 milhões de dólares para a ProÍndicus, permitindo assim um máximo de financiamento de 900 milhões de dólares. Ouvido pelo tribunal semana passada, o réu Gregório Leão disse que haviam questões operacionais que tinham de ser acauteladas, tendo remetido a questão a António Carlos do Rosário.

Esta terça-feira, o Ministério Público quis saber que questões operacionais eram essas. O antigo Director da Inteligência Económica do SISE afirmou que o pedido adicional de garantias soberanas no valor de 278 milhões de dólares, para a ProÍndicus, visava dois objectivos essenciais. Primeiro, a reestruturação da dívida da ProÍndicus, “porque queríamos evitar constrangimentos. Segundo, são questões operacionais emanadas no Comando Operativo, que, por serem classificadas e constituírem segredo de Estado, não vou versar”.

Durante o interrogatório, a procuradora Ana Sheila Marrengula perguntou se ao solicitar a garantia, no valor de 278 milhões de dólares, a ProÍndicus estava ou não a contrair mais uma dívida para restaurar a dívida anteriormente assumida. O réu António Carlos do Rosário respondeu que não estava a contrair outra dívida. “Garantia não é dívida, garantia é simplesmente um papel que nos permite ir ao credor com uma carta-conforto”.

O réu António Carlos do Rosário disse ao tribunal que “este Governo” sabotou as empresas ProÍndicus, MAM e EMATUM. Segundo o 19º réu implicado a ser ouvido no processo, exemplo disso é o facto de a MAM, empresa que seria responsável pela manutenção dos equipamentos da ProÍndicus e EMATUM, ter tido dificuldades “inexplicáveis” para construir os seus estaleiros.

Na sessão desta tarde do julgamento do “caso dívidas ocultas”, o réu viu problemas em vários documentos apresentados a si pelo Ministério Público, ora por não terem local e data de onde foram assinados, ora por terem assinaturas iguais à sua. Segundo o antigo director da Inteligência Económica do SISE, há muitos documentos falsos ou forjados que constam dos autos. Do Rosário, por isso, colocou em causa a idoneidade de colaboradores do Ministério das Finanças que, à data dos factos, produziram documentos, segundo disse, “martelados”.

O réu disse ao tribunal que questões relacionadas com documentos forjados não têm razão de ser. “Tragam documentos genuínos”, acrescentou: “Parece que, durante a minha prisão, alguém ficou a martelar os documentos. Estou assustado. Ainda bem que esta sessão está a ser transmitida pela televisão para o povo ficar a saber”.

 

EMISSÃO DA GARANTIA

A certa altura do julgamento do “caso dívidas ocultas”, a procuradora Ana Sheila Marrengula perguntou a António Carlos do Rosário por que a emissão inicial da garantia do Estado, na ordem de 372 milhões de dólares, foi feito pelo réu Gregório Leão. O antigo director da Inteligência Económica do SISE disse que isso não era verdade, que essa garantia tinha sido emitida pelo então ministro das Finanças, Manuel Chang. De seguida, Ana Sheila Marrengula referiu-se a uma carta do antigo director-geral do SISE sobre a garantia. Do Rosário pediu ver a carta do réu Gregório Leão, mas, depois, garantiu que a carta em causa não existia, ele tinha a certeza disso, porque quem preparava as cartas para Gregório Leão assinar era ele.

Como as mais de duzentas perguntas do Ministério Público (MP) ainda não se esgotaram, o interrogatório, pelo quarto dia, continua a ser conduzido pela procuradora Ana Sheila Marrengula.

Durante a audição, o réu António Carlos do Rosário, antigo director de Inteligência Económica do Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE), foi confrontado com o relatório da Kroll.

Segundo a magistrada Ana Marrengula, constam dos autos que existe uma grande discrepância entre os preços dos bens declarados pelo Grupo Privinvest e os preços demarcados à data dos factos. Com esta afirmação, o Ministério Público questionou o réu se podia explicar ao Tribunal que exercício terá sido feito para garantir que os preços aplicados fossem justos e em conformidade com os aplicados no mercado, tendo em conta que se optou pelo contrato do tipo chave na mão.

Mas, antes que o réu respondesse, o advogado de defesa tomou a palavra e afirmou que o relatório de auditoria da Kroll ignora por completo o contraditório das três empresas auditadas.

“Como vamos discutir um relatório de auditoria que postergou de forma gravíssima o contraditório?”, questionou Alexandre Chivale.

Para Alexandre Chivale, o relatório da Kroll está inclinado de vícios e não pode servir como elemento de prova e tão pouco ser discutido nesta audiência .

Entretanto, o posicionamento do advogado foi contestado pelo Ministério Público que afirmou que “as nulidades em processo penal se encontram descritas em conformidade com o código do processo penal aplicável ao caso e em todas as instâncias, a defesa teve oportunidade de se referir a este facto, não fez quando podia ter feito. O relatório da Kroll foi junto aos autos na fase da instrução preparatória e, neste momento, ainda que queira suscitar esta mesma nulidade, embora não tenha indicado qual das nulidades se refere”.

Chivale rebateu e disse que “estou a levantar uma nulidade da auditoria”.

“A Kroll foi solicitada pela Procuradoria-Geral da República por uma questão específica que tem a ver com contas. Qualquer relatório da auditoria que não tome em consideração o contraditório é nulo. Não havendo contraditório, este relatório da auditoria não pode ser tido como válido. As nulidades são invocáveis a todo momento”, defendeu o advogado de defesa.

Ainda sobre a nulidade da auditoria, o Ministério Público pediu, mais uma vez, que o advogado Chivale indicasse a nulidade do relatório da Kroll, a qual se refere, porque, segundo a procuradora Ana Sheila, as nulidades estão expressas de forma taxativa no código do processo penal aplicável ao caso.

“Persisto na minha posição anterior de solicitar ao ilustre advogado para que indique a nulidade e verificarmos se a mesma foi ou não sanada”, afirmou Ana Sheila Marrengula.

O réu António Carlos do Rosário pediu ao tribunal, esta segunda-feira, permissão para apresentar o contraditório da ProÍndicos, MAM e EMATUM à auditoria realizada pela Kroll, no “caso dívidas ocultas”.

No 28º dia do julgamento do “caso dívidas ocultas”, que decorre na Cadeia de Máxima Segurança da Machava, na província de Maputo, o Ministério Público reservou um momento para confrontar António Carlos do Rosário com questões relacionadas ao relatório da Kroll. Uma vez mais, o antigo director da Inteligência Económica do SISE protestou contra o facto de, na sua opinião, o Ministério Público dar primazia ao relatório da Kroll, em detrimento do contraditório apresentado pela ProÍndicos, MAM e EMATUM há quatro anos.

Segundo disse António Carlos do Rosário ao tribunal, na manhã desta segunda-feira, um processo de auditoria abre espaço para que o auditado apresente um contraditório. Entretanto, “neste processo, aquilo que foi o nosso posicionamento sobre o relatório da Kroll nunca foi levado em conta. Se for para colocar perguntas sobre o relatório da Kroll, que o tribunal nos permita ler o que dissemos na altura em relação ao documento”.

Tendo ouvido o pedido do réu, o juiz Efigénio Baptista perguntou ao Ministério Público o que tinha a dizer em relação a essa solicitação. Primeiro, a procuradora Ana Sheila Marrengula deixou a questão ao critério do tribunal. “Se a bem da sua defesa o réu entende que é essencial que se proceda à leitura [do contraditório à auditoria da Kroll], deixamos a questão ao critério do tribunal”. De seguida, a procuradora afirmou que o Ministério Público não sabia da existência do contraditório em referência.

O advogado Alexandre Chivale tomou, no entanto, a palavra e disse que era muito estranho o Ministério Público dizer que não foi notificado sobre o contraditório à auditoria da Kroll, quando o documento deu entrada à Procuradoria-Geral da República no dia 18 de Agosto de 2017.

 

O CONTRADITÓRIO À AUDITORIA DA KROLL

O contraditório à auditoria realizada pela Kroll às empresas ProÍndicos, MAM e EMATUM foi lido no tribunal pelo advogado Alexandre Chivale. Segundo o documento, o projecto de protecção da Zona Económica Exclusiva sempre foi público, ao contrário do que se diz. O documento lembra que houve, inclusive, exibições públicas de equipamentos com presença de líderes africanos que viram, se entusiasmaram pelo projecto e quiseram copiar.

Para o Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE), os equipamentos adquiridos na sequência do projecto de protecção da costa moçambicana são de qualidade e que o Governo sempre soube dos empréstimos. E diz mais, que além de viáveis, a ProÍndicos, MAM e EMATUM tinham, à data dos factos, parceiros e uma visão estratégica. Também, por isso, o facto de as três empresas serem geridas pelo mesmo PCA não é um caso exclusivo em Moçambique e no mundo.

Portanto, o contraditório apresentado ao tribunal a funcionar na Cadeia de Máxima Segurança da Machava defende que o relatório da Kroll não é realista, que as empresas ProÍndicos, MAM e EMATUM colaboraram com a auditora e que a Kroll ignorou dados.

António Carlos do Rosário disse ao Tribunal, no seu terceiro dia de audição, que as três empresas MAM, PROÍNDICUS e EMATUM tinham a sua própria fonte de renda

Segundo disse Carlos António do Rosário, as fontes de renda da empresa PROÍNDICUS eram a segurança de Oil e gás e outros e serviço de escolta e protecção destes produtos desde o local de exploração até ao de exportação. Estes serviços rendiam à empresa cerca de 200 milhões por mês.

As projecções é que a empresa rendesse entre 350 milhões de dólares a um bilião de dólares, prestando serviços a todos os operadores na Zona Económica Exclusiva.

A principal fonte de rendimento da empresa EMATUM eram pesca do atum e fauna acompanhante (outras espécies marinhas de grande valor) e rendia cerca de 90 a 200 milhões de dólares, por ano, avança o réu.

Do Rosário afirmou ainda que, desde a sua criação, a EMATUM dedicou-se à sua principal vocação e, nesse processo, a empresa pescou e exportou atum desde finais de Dezembro de 2014 a 2016. Só no primeiro ano, a empresa rendeu perto de 4 milhões de dólares, operando com apenas quatro embarcações.

Quanto à empresa MAM, as fontes de rendimento eram a construção e reparações navais, prestação de serviços de ferro e aço a qualquer operador comercial, privado ou estatal, construção de barcos e trabalho de logística à indústria de Oil e gás.

As três empresas faziam parte do projecto SIMP, sendo a EMATUM e PROÍNDICUS veículos que tinham um cunho de segurança da zona.

Do Rosário não se revê no estudo apresentado pelo Ministério Público, entregue ao Ministério da Economia e Finanças, para servir de garantia.

DO ROSÁRIO AFIRMA QUE FOI NYUSI QUEM SUGERIU FINANCIADORES

Ainda na audição desta sexta-feira, António do Rosário afirmou ter sido o então ministro da Defesa Nacional, à data dos factos Filipe Nyusi, actual Presidente da República, quem identificou o Credit Suisse como o banco que iria financiar o projecto de protecção da Zona Económica Exclusiva.

Do Rosária afirmou que foi através de uma carta que Nyusi comunicou o então ministro das Finanças, Manuel Chang, sobre a existência de financiador.

Nesta senda, o Ministério Público apresentou documentos que provam o envolvimento de mais pessoas na identificação de financiadores, incluindo os réus Teófilo Nhangumele e António do Rosário. No entanto, o réu desconhece a carta elaborada por Iskander Safa.

“No SISE, nós trabalhamos em compartimentação. Eu só entro onde sou chamado, quando não sou, não entro. Eu não tinha como saber como esta carta foi entregue, pois eu não era chefe da pessoa, apenas coordenador do projecto”, disse o réu, justificando o facto de não reconhecer a carta de Iskander Safa, enviada ao então Presidente da República, Armando Guebuza.

O réu diz que ele era o elo entre Iskander Safa e o projecto, por isso não percebe, nem acredita que o Iskander Safa possa ter escrito uma carta dirigida a Armando Guebuza.

 

DO ROSÁRIO DIZ QUE O VALOR DO PROJECTO SEMPRE FOI DE 622 MILHÕES DE METICAIS

Sobre os valores disponibilizados para o projecto de protecção da Zona Económica Exclusiva, António do Rosário diz estar admirado com os números avançados, pois no projecto que ele dirigiu apenas reconhece  o valor total de 622 milhões de dólares, desde o início.

O réu disse, ainda, que “na fase da celebração dos contratos de financiamento tivemos que parcelar os valores, sendo o primeiro contrato de USD 372 milhões e o segundo USD 250 milhões, o que corresponde a USD 622 milhões de dólares”.

Com estas declarações, o réu rejeita as declarações do Ministério Público de que o valor inicial teria sido de USD 320 milhões , tendo logo de seguida, com sua orientação, sido acrescentado 50 milhões de dólares (codificado por 50 galinhas da mesma raça) e outras mais vezes até que se chegou ao valor de 622 milhões de meticais.

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