O País – A verdade como notícia

João Figueiredo reconduzido a PCA do Moza Banco

Os sócios do Moza Banco decidiram, esta segunda-feira, reconduzir João Figueiredo ao cargo de Presidente do Conselho de Administração (PCA) e da Comissão Executiva desta

João Figueiredo reconduzido a PCA do Moza Banco

Os sócios do Moza Banco decidiram, esta segunda-feira, reconduzir João Figueiredo ao cargo de Presidente do Conselho de Administração (PCA) e da Comissão Executiva desta

Depois de em Julho o Banco de Moçambique ter anunciado o fim da intervenção ao Moza Banco, com o processo de recapitalização concluído, um evento que se tornou possível através do aumento do capital por entrada de um novo accionista na instituição de crédito, o Moza Banco aprovou, em Novembro, o aumento do seu capital. E, foi ontem, que procedeu à incrementação do montante.

A operação de aumento de capital no montante de 3.5 bilhões de Meticais, aproximadamente 59 milhões de dólares americanos, incrementou o capital social total do Moza Banco para 13.8 bilhões de Meticais, aproximadamente 230 Milhões de dólares americanos. E a maior parte do capital é detido pela Kuhanha.

Segundo João Figueiredo, Presidente do Conselho de Administração do Moza Banco, o aumento de capital visa assegurar a implementação do Plano Estratégico (2017 – 2021), e permitir ao Moza Banco reforçar o seu posicionamento estratégico e comercial, mantendo um compromisso com o desenvolvimento do sistema financeiro nacional em geral.

Com a concretização da operação de aumento de capital social a estrutura accionista do Moza Banco continua a ser dominada pela Kuhanha S.A, tendo aumentado a sua participação de 80 para 84% do capital, a Moçambique Capitais com 7,8%, a NB ÁFRICA, SGPS com 7,5% e, por fim, António Matos com 0% de capital.

Criado em 2008, o Moza Banco previa uma participação maioritária dos accionistas moçambicanos, cuja, na altura, a Moçambique Capitais detinha 51 por cento das acções, e seu parceiro português 49 por cento.

O governador do Banco de Moçambique desvalorizou, ontem, o parecer da Comissão Central de Ética, segundo o qual ele violou a Lei de Probidade Pública ao recapitalizar o Moza Banco através da Kuhanha, uma instituição onde é Presidente do Conselho de Administração (PCA). Rogério Zandamela reitera que tomou a decisão mais acertada, que até lhe deixa bastante orgulhoso.

“Na minha vida, se há uma coisa que estarei pessoalmente orgulhoso de ter feito, com sucesso, é esta. Para mim está fechado, o processo está terminado e é irreversível”, disse esta quinta-feira o governador do Banco Central. 

Zandamela está orgulhoso por ter completado a recapitalização do Moza Banco com sucesso e admite que era uma tarefa muito complicada que teria colocado o sistema financeiro nacional num buraco sem saídas.

“Trabalhámos duramente, fomos criticados, mas temos que tomar as decisões. Nós não vivemos de comentários, compete a nós tomar decisões. Eu, pessoalmente, assumo as decisões que tomei. Para mim foi uma operação certa e de sucesso. Fizemos o que era necessário para a sociedade. Quem quiser criticar que critique”, desafia Rogério Zandamela.
 

A Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM) defende a nulidade do processo que determinou a entrega da recapitalização do Moza Banco, a Kuhanha, uma instituição detida pelo fundo de pensões dos trabalhadores do Banco de Moçambique.

Reagindo ao parecer da Comissão Central de Ética Pública, que na sua última deliberação concluiu haver conflito de interesse e, consequentemente, violação da Lei de Probidade Pública, na decisão tomada pelo Banco de Moçambique (BM) o bastonário da OAM disse, de forma taxativa, que há espaço para se agir judicialmente contra a decisão.

“Há espaço para se agir contra esta decisão do Banco de Moçambique”, sentenciou o Bastonário da OAM.

De acordo com Menete, a acção inevitável é declarar nula a decisão de Rogério Zandamela, Governador do BM e seu elenco.
“Em virtude desta decisão há espaço para agir no sentido de se declarar nula esta decisão, e, relactivamente às nomeações, a consequência jurídica que a lei estabelece é a anulabilidade”, disse Menete, em alusão às nomeações de Joana Matsombe e João Figueiredo, nomeadamente, administradora e Presidente do Conselho de Administração do Moza Banco.

O líder da Ordem considera que o parecer da Comissão Central de Ética Pública veio confirmar o que estava à vista de todos e que era questionado a vários quadrantes.

Perante o cenário actual, Menete defende que as autoridades judiciais devem agir em conformidade, tirando as devidas consequências jurídicas e, no caso, exige que a Procuradoria-Geral da República (PGR) faça o seu papel que, na sua opinião, “já devia ter agido faz tempo”.

Repetir processo de selecção

Flávio Menete considera que perante a confirmação da existência de conflito de interesse no processo da recapitalização, não resta outro caminho, se não repetição do processo, que é uma das consequências da declaração de nulidade que deve ser accionada.

“Dada a nulidade, que é o mais grave, porque tem efeitos retroactivos, naturalmente que, a ser confirmada por um Tribunal, volta tudo a estaca zero, o que quer dizer que volta à situação em que o banco está a ser gerido pelo Banco Central e tem de se repetir o processo todo, ou é tomada uma outra decisão”, frisou.

Numa altura em que não há certeza se haverá ou não consequências desta polémica recapitalização, Menete considera que o “certo é que nós não nos podemos habituar a situações de conflito com a lei em situações tão relevantes quanto estas e ficarmos indiferentes”.

 

Em deliberação, datada de 19 de Julho, a Comissão Central de Ética Pública conclui que o Governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, violou a alínea a) do artigo 39 da Lei de Probidade Pública ao ter decidido sobre uma matéria que a beneficiária, neste caso a Kuhanha, é uma entidade em que o mesmo é Presidente do Conselho de Administração.  

A Comissão diz que Rogério Zandamela agiu em conflito de interesse, na medida em que o artigo ora citado estabelece que “considera-se existirem relações patrimoniais passíveis de criar conflitos de interesse quando o servidor público seja titular ou representante de outra pessoa em participações sociais ou acções em qualquer sociedade comercial, civil ou cooperativa que tenha interesse numa decisão, negócio ou qualquer outra relação de natureza patrimonial, com a entidade a que pertence ou tenha interesse na decisão a tomar”.  

Ora, o Governador do Banco de Moçambique decidiu a favor de uma entidade que é Presidente do Conselho de Administração da mesma, ao indicar, em Maio, a Kuhanha para recapitalizar o Moza Banco.  
“Se o Senhor Governador do Banco de Moçambique, como titular da entidade pública que disciplinadora e supervisora dos bancos comerciais, agiu na plenitude das suas competências, já se torna problemática a situação em que a Kuhanha se propõe a subscrever o capital do Moza Banco, e sede de um processo conduzido pelo servidor público Rogério Zandamela”, lê-se na deliberação.

Por outro lado, a deliberação conclui ainda que João Figueiredo encontra-se numa situação ilegal como Presidente do Conselho de Administração do Moza Banco, na medida em que ao ter sido nomeado antes Presidente do Conselho de Administração Provisório do Moza Banco foi circunstancialmente investido de poderes públicos como gestor em nome do Banco de Moçambique.

“Desta plataforma legal, ao senhor João Figueiredo aplicam-se as disposições previstas nas alíneas a) e b) do número 2 do artigo 46 da Lei de Probidade Pública, que impõe a proibição, no período de dois anos contados da data de cessação de funções, de prestar qualquer tipo de serviço à pessoa jurídica com quem tenha estabelecido relacionamento relevante em razão do seu cargo e a aceitar cargos nos órgãos sociais com pessoa jurídica cujo objecto social ou actividade esteja relacionado com o seu anterior cargo”, lê-se no documento.   
Quanto à Administradora do Moza Banco, Joana Matsombe, a Comissão de Ética Pública diz que está também em conflito de interesse numa similaridade de situação a do senhor João Figueiredo, pelo facto de ter sido nomeada administradora provisória do Moza Banco na altura em que o banco estava a ser intervencionado e pelo facto de ter sido administradora do Banco de Moçambique na altura em que tomou a decisão de intervencionar o Moza.

O Moza Banco estava a ser intervencionado pelo Banco de Moçambique desde Setembro de 2016, num processo que culminou com a escolha, em Maio, da Kuhanha para recapitalizar o banco em dificuldades. A Kuhanha injectou 8.1 mil milhões de meticais.  
Num comunicado enviado aos órgãos de comunicação social, o Banco de Moçambique anunciou, no dia 1 deste mês, o fim da intervenção no Moza Banco.

 

 Banco de Moçambique terminou ontem a intervenção que vinha fazendo no Moza Banco.

Num comunicado enviado aos órgãos de comunicação social, o Banco de Moçambique veio a público comunicar o fim da intervenção no Moza Banco. Isto acontece nove meses depois, tendo em conta o regulador vinha intervindo no Moza desde Outubro de 2016, quando o quarto maior banco tinha uma situação financeira insustentável e um rácio de solvabilidade abaixo de zero.

O Banco de Moçambique lembra que a conclusão do processo de recapitalização do Moza Banco tornou-se possível através do aumento do capital por entrada de um novo accionista, neste caso a Kuhanha, que é a sociedade gestora do fundo de pensões do Banco de Moçambique.

“Com a recapitalização e a consequente normalização da situação financeira e prudencial do Moza Banco cessam as razões que ditaram a intervenção do regulador”, lê-se no comunicado do Banco de Moçambique”.

A autoridade reguladora acrescenta que terminam assim com as providências extraordinárias impostas ao Moza Banco e a exoneração do Conselho de Administração provisório, passando a instituição a funcionar dentro da normalidade e com órgãos próprios.

Após ter injectado 8.1 mil milhões de meticais,  a Kuhanha detém 80 por cento de Moza Banco. Os outros accionistas mantêm os restantes 20 por cento, portanto 10 por cento para o Novo Banco, e 10 por cento para a Moçambique Capitais.

Na segunda-feira passada, o governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, pronunciou-se sobre a escolha da Kuhanha para gestão de 80% das participações do Moza Banco. O objectivo da conferência de imprensa era dar a conhecer as decisões da reunião de Política Monetária do Banco Central, mas a Kuhanha acabou por ser o tema central.

Como quem estava preparado, Rogério Zandamela falou perto de uma hora das razões que conduziram à selecção do Fundo de Pensões do Banco de Moçambique para dono de um dos bancos mais importantes do país, destacando que não conhece um processo mais transparente no mundo.

Essencialmente, Zandamela disse que a Kuhanha não concorreu à compra do Moza Banco; que a decisão foi tomada num quadro legal apertado; que não há conflito de interesses por ser governador e ao mesmo tempo PCA da Kuhanha; que o uso do Fundo de Pensões foi acautelado; que foi o Banco Central quem foi buscar João Figueiredo para gestor do Moza Banco e que os pequenos bancos enfrentam actualmente problemas de liquidez.

Os pronunciamentos do governador do Banco de Moçambique levantam, no entanto, várias questões desde a contradição entre as declarações dentro da instituição, passando pela possibilidade de conflito de interesses, risco de uso de Fundo Pensões, até ocultação de informação de interesse público e quebra de confidencialidade.

“O País Económico” seleccionou oito pontos e várias perguntas que ficaram por ser esclarecidas pelo Banco de Moçambique após as declarações de segunda-feira. Vamos por partes:   

Contradição

No dia 31 de Maio passado, o administrador do Banco de Moçambique para o pelouro de Estabilidade Financeira, Alberto Bila, anunciou a selecção da Kuhanha para gestão de 80% das participações do Moza Banco. Alberto Bila disse que a empresa gestora de Fundos de Pensões do Banco de Moçambique concorreu com outras entidades e foi seleccionada por apresentar a melhor proposta.

“Feita a verificação da conformidade da entidade seleccionada com os requisitos prudenciais, dentre os quais a capacidade financeira para garantir a estabilidade da instituição, adequação do plano de negócios e dos membros dos órgãos sociais propostos, o Banco de Moçambique constatou que a Kuhanha preenche os requisitos para recapitalização do Moza Banco. Importa realçar que o direito concedido à Kuhanha na qualidade de concorrente seleccionada decorre do facto do accionista Moçambique Capitais ter abdicado do exercício de direito de preferência dentro do prazo estabelecido”, disse o administrador do Banco Central num discurso lido.

Ora, estas declarações contradizem as afirmações do governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, quando disse no passado dia 19 – segunda-feira – que a Kuhanha não concorreu à compra do Moza Banco. “Começámos a pensar num plano B, de contingência, e a Kuhanha, para ser franco, não era nenhum concorrente. Ela aparece para concorrer consigo própria, no sentido de que, se a concorrência que fosse posta de uma maneira transparente não produzisse os resultados aprovados pelos accionistas, na reunião de 23 de Janeiro, teríamos uma alternativa para salvaguardar o interesse público”, explicou.

O que ficou por explicar?

Ficou por explicar se a Kuhanha concorreu ou não à compra do Moza Banco, considerando as contradições entre os responsáveis do Banco de Moçambique. Em outras palavras, o que disse o governador do Banco Central não corresponde ao que afirmou o seu administrador para Estabilidade Financeira.

As questões são: qual das duas é a declaração certa? É aceitável, numa decisão crucial e sensível para o sistema financeiro nacional, existirem duas versões sobre o mesmo facto?

Falta de informação relevante

O governador do Banco de Moçambique disse que a sua administração já tinha conhecimento dos problemas no Moza Banco e que encomendou um relatório a KPMG para confirmar as dificuldades da instituição financeira. Rogério Zandamela disse ainda que em dois ou três anos o Moza Banco dará lucros, no quadro do seu plano de negócios.

O que ficou por explicar?

Por que o Banco de Moçambique não divulga ao público o relatório de auditoria ao Moza Banco se se trata do instrumento orientador para intervenção na instituição financeira?

Por que o Banco de Moçambique não apresenta também o plano de negócios do Moza Banco e a informação financeira sobre a Kuhanha para comprovar a viabilidade da selecção do seu Fundo de Pensões e a produção de lucros em dois ou três anos pelo Moza Banco?

Considerando que o relatório de auditoria determinou a injecção necessária e, eventualmente, levantou as falhas de gestão e a característica do crédito mal parado, entre outra informação, não seria de interesse público a sua divulgação para compreensão das decisões do regulador?

A Assembleia da República aprovou, em 2014, a Lei de Direito e Acesso à Informação que no número 2 do artigo 4 estabelece que o exercício do direito à informação rege-se pela máxima divulgação de informação, interesse público, transparência das entidades públicas e privadas e permanente prestação de contas aos cidadãos. A questão é: o banco regulador está a prestar toda a informação necessária aos cidadãos em obediência à Lei de Direito e Acesso à Informação? O relatório de auditoria ao Moza Banco é informação classificada? – a que reporta dados cuja natuerza seja considerada, conforme o caso, segredo de Estado, confidencial, secreta ou restrita? Se é, por que o Banco Central não o diz?

Falta de informação relevante

O governador do Banco de Moçambique disse que a sua administração já tinha conhecimento dos problemas no Moza Banco e que encomendou um relatório a KPMG para confirmar as dificuldades da instituição financeira. Rogério Zandamela disse ainda que em dois ou três anos o Moza Banco dará lucros, no quadro do seu plano de negócios.

O que ficou por explicar?

Por que o Banco de Moçambique não divulga ao público o relatório de auditoria ao Moza Banco se se trata do instrumento orientador para intervenção na instituição financeira?

Por que o Banco de Moçambique não apresenta também o plano de negócios do Moza Banco e a informação financeira sobre a Kuhanha para comprovar a viabilidade da selecção do seu Fundo de Pensões e a produção de lucros em dois ou três anos pelo Moza Banco?

Considerando que o relatório de auditoria determinou a injecção necessária e, eventualmente, levantou as falhas de gestão e a característica do crédito mal parado, entre outra informação, não seria de interesse público a sua divulgação para compreensão das decisões do regulador?

A Assembleia da República aprovou, em 2014, a Lei de Direito e Acesso à Informação que no número 2 do artigo 4 estabelece que o exercício do direito à informação rege-se pela máxima divulgação de informação, interesse público, transparência das entidades públicas e privadas e permanente prestação de contas aos cidadãos. A questão é: o banco regulador está a prestar toda a informação necessária aos cidadãos em obediência à Lei de Direito e Acesso à Informação? O relatório de auditoria ao Moza Banco é informação classificada? – a que reporta dados cuja natuerza seja considerada, conforme o caso, segredo de Estado, confidencial, secreta ou restrita? Se é, por que o Banco Central não o diz?

Conflito de interesses

O governador do Banco de Moçambique defendeu que não há conflito de interesses por desempenhar simultaneamente as funções de governador do Banco de Moçambique com as de Presidente do Conselho de Administração da Kuhanha. As suas palavras foram as seguintes: “Eu não era desde o início o PCA (da Kuhanha). Não era porque não queria, cria dores de cabeça. O Presidente da República já me tinha incumbido tarefas muito complicadas e difíceis, e eu não estava preparado para acrescentar outras tarefas. Conversámos dentro do banco, durante meses, e foi-me dito que você é governador e tem de sinalizar que se interessa não só com os trabalhadores que estão no activo, mas também com os trabalhadores que dedicaram toda a vida e hoje são pensionistas. O governador deve ser uma referência para esses trabalhadores. Aceitei esse cargo nesse contexto, mas não quer dizer que tem de ser assim. E eu digo: não queria. Conflito de interesses não há, porque isso não me traz nenhum, é um trabalho a mais que não me traz nada”.

O que falta explicar?

Por que os órgãos sociais do Moza Banco foram anunciados pelo administrador do Banco Central, Alberto Bila, quando se trata de uma aquisição entre entidades privadas, nomeadamente a compra de 80% das participações do Moza Banco pela Kuhanha?

Isto quer dizer que o Banco de Moçambique pode anunciar os órgãos sociais do banco privado Y como resultado da sua aquisição pela empresa privada X?

O Banco de Moçambique usou ou não informação privilegiada de todas as partes para selecção da Kuhanha como principal dono do Moza Banco? Não se conhecendo os concorrentes, fica a impressão de que a Kuhanha terá sido preparada, previamente, para assumir a posição de gestora do Moza Banco. Ou melhor, se a Kuhanha não era concorrente e acabou assumindo o Moza, então, já tinha informação privilegiada sobre a situação do banco, o que sugere, mais uma vez, ter sido uma decisão previamente preparada pelo Banco Central.

Ao afirmar que a Kuhanha fazia parte de um plano B, subentende-se que a autoridade monetária fez uma intervenção em nome do Estado num banco privado, contando com um privado como backup. Isso faz sentido numa economia de mercado?

Pode a intervenção do Estado, no contexto de um plano B, contar com recursos privados?

Por ser PCA da Kuhanha, o governador do Banco de Moçambique terá um papel importante na estratégia do Moza Banco, incluindo a participação nas reuniões de Assembleia-Geral. Onde fica a fronteira entre o árbitro e o jogador?

Ademais, o artigo 35 da Lei de Probidade Pública diz e passamos a citar: “o servidor público deve abster-se de tomar decisões, praticar qualquer acto ou celebrar contrato sempre que se encontre em qualquer circunstância que configure o conflito de interesses ou possa criar no público a percepção de falta de integridade na sua conduta”.

O artigo é esclarecedor: enquanto governador do Banco de Moçambique – entidade pública – e ao mesmo tempo PCA da Kuhanha – entidade privada -, Rogério Zandamela foi exactamente seleccionar… a Kuhanha para gestão do Moza Banco, abrindo campo para percepção de falta de integridade na sua conduta.

Concorrentes de índole duvidosa

Rogério Zandamela afirmou que houve vários tipos de investidores, os tradicionais da praça e outros internacionais. “Todos tinham os critérios aprovados pelos accionistas. Mas, na realidade, esse grupo queria pedaços do Moza Banco e isto não se enquadra naquilo que foi aprovado pelos accionistas e o regulador não pode vender pedaços do Moza ou de nenhum banco. Mas, em muitos países, pode fazer-se: separar o banco bom do banco mau. Estes investidores que queriam comprar o banco em pedaços caíram fora. Havia outros que entendiam claramente que o banco não podia ser vendido em pedaços, mas eram investidores de índole duvidosa que iam criar-nos problemas. Uma boa parte tinha dinheiro, mas não podia demonstrar a sua fonte. O critério foi muito bem feito, quando se pediu garantia bancária, não foi por casualidade, foi para evitar que investidores trouxessem sacos de dinheiro ao Banco de Moçambique para investir no Moza. Queríamos saber da proveniência do dinheiro, queríamos estar seguros de que o Moza Banco não estaria a ser usado para lavagem de dinheiro. E não vou mentir, houve investidores que vieram com essas intenções”, disse.

O que falta explicar?

Em primeiro lugar, estas declarações colocam em causa a seriedade das propostas para aquisição do Moza Banco antes da divulgação pública, afectando a confidencialidade de informação que devia prevalecer até que se torne público os contornos dos concursos.

Não ficou claro, desde cedo, quem são os concorrentes, visto que o Banco Central não revelou. Não há, por isso, matéria suficiente para que o público possa aferir se, de facto, os concorrentes eram de índole duvidosa ou não. Além disso, ao referir que “queríamos estar seguros de que o Moza Banco não estaria a ser usado para lavagem de dinheiro” e que “houve investidores que vieram com essas intenções”, o governador do Banco Central dá a entender que há matéria para polícia. O Banco Central denunciou ou propôs uma investigação aos investidores com intenções de lavagem de dinheiro?

Nomeação de João Figueiredo

O governador do Banco de Moçambique defendeu a nomeação de João Figueiredo para Presidente do Conselho de Administração do Moza Banco nos seguintes termos: “João Figueiredo não veio ao Banco de Moçambique à procura de emprego. Nós fomos atrás dele. Não foi ele que apareceu aqui desempregado à procura de ajuda. Veio porque procurávamos o melhor. Contactámo-lo e ele hesitou. Mas insisti, dizendo que é um assunto de interesse nacional e que “por favor, temos de estar juntos nesse trabalho”. Ele aceitou e fez um bom trabalho, estou satisfeito e, claramente, toda essa especulação de que a Kuhanha foi para manter o João Figueiredo… a coisa mais importante num banco é o plano de negócios, isso é que faz recuperar um banco. O plano de negócios do Moza Banco é sério, diz que esse banco tem de ser recuperado e, no máximo de dois a três anos, tem de dar lucros”.

O que falta explicar?

Em que qualidade Rogério Zandamela nomeou João Figueiredo para presidente do Conselho de Administração do Moza Banco? Foi como governador do Banco de Moçambique ou PCA da Kuhanha? Esta questão resulta de não estar claro em que momento o governador do Banco Central fala como tal e em que momento fala na qualidade de PCA da Kuhanha. Por exemplo, na conferência de imprensa desta segunda-feira Rogério Zandamela falou da compra do Moza Banco como governador ou como PCA da Kuhanha?

“Vou ser franco: surpreende-me esse ruído da sociedade pela nossa decisão de gestão do Moza Banco. Eu estava à espera que a sociedade celebrasse”. As palavras do governador do Banco de Moçambique saem embargadas e num tom de desilusão de quem “evitou o descalabro”, mas não é compreendido pelo grande público.

Rogério Zandamela convocou uma conferência de imprensa, ontem, para explicar as decisões da reunião de Comité de Política Monetária, mas foi sobre a Kuhanha que mais falou. E disse o que não foi dito no primeiro pronunciamento sobre a decisão do destino de um dos bancos mais importante do país.

 Afinal, segundo Rogério Zandamela, a empresa gestora do Fundo de Pensões do Banco de Moçambique não chegou a concorrer para a aquisição do Moza Banco. A Kuhanha funcionou como um plano B ou “plano de contingência” usado pelo regulador, após concluir que todos os concorrentes não estavam em condições de gerir o Moza Banco. “Digo com clareza que nós saímos do sufoco que vivíamos diariamente”, desabafou.

À mesa de Zandamela chegaram dois tipos de propostas de aquisição do Moza Banco. A primeira passava pela compra da parte saudável da instituição financeira e a segunda pelo controlo do seu conjunto. A primeira falhou por não estar em conformidade com os termos de referência definidos pelos accionistas, associado ao facto de o Banco Central não ter atribuições legais para a venda de bancos em partes. A segunda foi colocada de lado por acarretar riscos de branqueamento de capital. “Queríamos estar seguros de que o Moza Banco não estaria a ser usado para lavagem de dinheiro. e não vou mentir, houve investidores que vieram com essas intenções”, revelou.

O governador do Banco de Moçambique frisou, ainda, que a decisão de entregar a gestão do Moza Banco à Kuhanha é definitiva, sendo que fica ao critério da empresa colocar as acções no mercado.

Sobre as linhas de força do relatório da KPMG que conduziram à venda do Moza Banco, nem uma palavra. Como o próprio governador do Banco de Moçambique assume, “não é isso que importa, o mais importante é estabilizar o sistema”.

 

Perante a alegada situação de conflito de interesses na selecção do seu fundo de pensões para gerir o Moza Banco, o Banco de Moçambique deverá prestar esclarecimentos à Comissão Central de Ética Pública, que vai analisar a decisão nos próximos dias.

Cerca de uma semana depois da controversa decisão do Banco Central de aprovar a proposta da Kuhanha, sociedade que controla pensões dos seus trabalhadores, para assumir a gestão do Moza Banco, o caso chega à Comissão Central de Ética Pública.

O Banco de Moçambique argumentou que os passos dados e que indiciam, para muitos analistas, violação da lei e da ética foram superados por uma decisão superior de gestão, a qual evitou os danos que teriam se notado caso esta solução não tivesse tido lugar.

Não bastou o reforço do seu posicionamento, através de um comunicado para o Banco Central calar a massiva reacção da opinião pública. Agora, estará sob a mira da Comissão Central de Ética Pública, que deverá emitir um parecer brevemente sobre a matéria.

É que a compra do Banco Moza pela Kuhanha levantou questionamentos de possível conflito de interesses do Banco Central, uma vez que a Kuhanha é a sociedade que controla pensões dos trabalhadores do Banco de Moçambique.

O porta-voz da Comissão Central de Ética Pública, Alfredo Gamito, garantiu ao “O País” que foi solicitado o dossier do concurso na compra do Banco Moza para análise do processo.

O Moza Banco estava sob intervenção do Banco Central desde Setembro do ano passado, devido a problemas de liquidez. Como nova gestora, aprovada num concurso que durou oito meses, a Kuhanha deverá recapitalizar o Moza Banco com um valor de 8 170 milhões de meticais.

Na nova estrutura de accionistas, a sociedade Kuhanha detém 80% do Banco Moza, o Novo Banco 10% e a Moçambique Capitais 10%.

 

Contra todas as críticas, o jurista e especialista em mercado de capitais, João Matsinhe, elogia a decisão de venda de 80% das acções do Moza Banco a Kuhanha. Matsinhe diz que na venda não houve atropelo a lei e que as pessoas criticam a decisão movidas por presunções.

O jurista e docente universitário considera ainda que apenas haverá violação da lei se alguns trabalhadores do Banco de Moçambique forem ao mesmo tempo gestores do Moza Banco.

 

+ LIDAS

Siga nos