Os dados estão todos lançados. Idem a produção de provas em sede do julgamento, feita, diga-se, em apenas dois dias. A 27 de Janeiro do próximo ano, daqui a cerca de 40 dias, cada um dos réus do polémico “negócio” entre Instituto Nacional de Segurança Social e a CR Aviation vai saber do seu futuro: condenação ou absolvição.
Esta terça-feira, em mais um dia de audição, foram chamados à sexta sessão do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo seis declarantes, pessoas que directa ou indirectamente acompanharam ou estiveram envolvidas no processo de assinatura do memorando de entendimento e aprovação da entrada do INSS na estrutura accionista da CR Aviation, factos que permitiram o desembolso do valor do 84 milhões de meticais para aquela empresa privada, à margem da lei.
Devido ao desembolso em causa, Francisco Mazoio, então PCA do Instituto Nacional de Segurança Social, é acusado pelo Ministério Público dos crimes de abuso de cargo ou função, simulação e peculato; Baptista Machaieie, à data dos factos director-geral daquela instituição, é acusado dos mesmos três crimes; enquanto Miguel Ribeiro, então director-geral da CR Aviation, é acusado de ser cúmplice nos crimes de simulação e peculato.
E o primeiro a prestar declarações foi Alfredo Mauaie, sucessor de Baptista Machaieie, na direcção geral do INSS. Foi ele, segundo suas próprias palavras, quem depois de tomar posse fez revista a carteira de investimento tendo notado a existência do memorando entre as duas instituições, que haviam sido desembolsados a título de empréstimo 84 milhões de meticais e que a CR Aviation, como acordado, ainda não tinha cumprido com o condicionalismo de estar cotada na Bolsa de Valores para que o INSS pudesse avançar com a compra de acções.
Mauaie não hesitou e confirmou a ilegalidade afirmando que “o INSS não pode fazer empréstimos, de acordo com o regulamento de segurança social obrigatória, no capítulo que versa sobre investimentos. O empréstimo foi feito à margem do regulamento, o que consubstancia ilegalidade”. O memorando foi assinado pelas mãos de Mazoio e Baptista Machaieie foi quem ordenou os pagamos, disse o actual director.
Era também necessário saber que o Conselho de Administração presidido por Mazoio tinha conhecimento do memorando com a cláusula sobre o empréstimo “ilegal”. Foram então chamados então membros do Conselho de Administração. Entrava assim Adelino Buque, 58 anos, então administrador não executivo que disse ter tomado conhecimento da existência de um memorando depois do mesmo ter sido assinado e que ele e outros colegas com Conselho Directivo recomendaram que o assunto fosse levado ao Conselho de Administração (CA). Entretanto, segundo Buque, na sessão do CA não foi analisado o conteúdo do memorando, mas sim a proposta da compra de acções na CR Aviation, tenda esta recebido luz verde, sob condição daquela tratar de estar cotada na bolsa. Buque disse ainda que a proposta do negócio com a CR foi apresentado pela Direcção-geral, de Baptista Machaieie.
Como então membros do CA foram ouvidos ainda Jéssica Bule, que disse não ter tido conhecimento, no dia da aprovação do negócio com a CR Aviation, da existência do memorando. O terceiro membro do CA a prestar declarações foi Gonçalves Zitha, 61 anos. Reforçou que não era do conhecimento do conselho a existência do memorando entretanto contrariou o actual director-geral afirmando que a devolução do valor emprestado a CR Aviation foi ordenada pelo INSS em princípios de 2015. O director falou de inicio de 2016.
Depôs também Sérgio Fernandes, 39 anos, sócio da AVS Investimentos, sociedade que em 2015 comprou acções de Miguel Ribeiro e trabalhou com o falecido Rogério Manuel. Fernandes devia explicar as razões da recusa da CR Aviation em devolver o valor, tendo este afirmando que não tomou conhecimento que o INSS exigia devolução. Explicou que quando a sociedade que faz parte entrou empresa de aviação fez de tudo para fechar o processo de cotação na bolsa. Fez-se auditoria, obteve-se autorização do Banco de Moçambique, mas não conseguiram financiamento porque a polémica sobre o negócio já tinha sido despoletada na imprensa e nenhum banco contactado, nomeadamente BCI, BIG e BNI, queria ver seu nome envolvido. Foi então que também venderam as suas acções. As quatro aeronaves compradas pela CR Aviation foram vendidas pela Raní Investiments, sediada em Dubai e que em Moçambique é representado pela Raní Resorts, dona das torres Raní. Gestor financeiro desta sociedade também explicou o papel da empresa que representava.
ALEGAÇÕES FINAIS
Prático nos procedimentos, o juiz Rui Dauane anunciou o início das alegações finais. O Ministério Público, na voz da procuradora Sheila Matavele pediu a condenação dos três arguidos por terem sido provado o cometimento dos crimes de que são acusados. Já a defesa pediu absolvição dos três afirmando já ter sido provado terem sido cometidos os crimes que a acusação do Ministério Público arrola. É advogado de Francisco Mazoio Inácio Matsinhe, enquanto Elísio de Sousa defende o antigo accionista da CR Aviation, Miguel Ribeiro. Por seu turno, Abílio Simbine é advogado do antigo director do INSS, Baptista Machaieie. A leitura da sentença está marcada para última semana de Janeiro. Para o efeito, o juiz alegou que se trata de um caso mais complexo do que imaginara e vai precisar de algum tempo para analisar as provas produzidas.