Joburg, Braamfontein, 16 de Setembro de 2024
Diz-se que os mortos pertencem a uma dimensão superior à nossa. Nós, os que ainda estamos à espera da morte, não passamos de vermes erectos, parasitas relativamente evoluídos. A civilização não é se não a expressão do nosso desejo de transcender a mesquinhez da existência mundana. Morrer não é apenas o nosso fatal destino, mas também o nosso mais ardente desejo. Todo Homem deseja a sua morte desde o dia que nasce. Uma morte gloriosa é o que andamos todos à procura.
Há uma semana, certas circunstâncias da vida levaram-me ao exílio voluntário, que vivo pela primeira vez na cidade de Joanesburgo, em Braamfontein. E ontem decidi transcender os recifes, ir para além das muralhas invisíveis que separam o centro da cidade à periferia, decidi atravessar a ponte aérea, o viaduto que liga Braamfontein à New Town. Do outro lado da cidade a realidade é mais dura, o comércio informal, a indigência e a violência formam a paisagem. Finalmente senti-me em casa.
Na rua, logo na entrada de New Town sou surpreendido com um concerto, dois jovens fazem uma dupla musical, um faz de DJ e de corista, o outro, o mais janota, vestido rigorosamente a la Michael Jackson de microfone na mão protagonizam um dos mais bonitos momentos artísticos que já testemunhei na minha vida. Joburg é uma aparição.
Regresso ao outro lado da cidade de cigarro na boca e a pensar. Maputo fica a cinco horas do futuro. Pelo caminho, de novo na ponte, encontro-me com um grupo de mendigos a fazer à cama, dou-lhes cigarros, como em Maputo, dois deles são moçambicanos, ambos mestiços, são simpáticos, oferecem-me tudo que têm, amo os mendigos de todos os lugares, neles a essência da liberdade e o verdadeiro rosto da nossa hipocrisia como sociedade.