O Presidente da Comissão Executiva (PCE) do Banco Nacional de Investimento (BNI) apresenta estratégia adoptada pelo BNI para o financiamento à agricultura familiar, face as dificuldades que este seguimento enfrenta para o acesso ao crédito bancário tradicional.
Acompanhe na íntegra a entrevista a Tomás Matola, no âmbito da segunda edição da MOZGROW.
O Banco Nacional de Investimento posiciona-se como um banco que aposta para o desenvolvimento sustentável em Moçambique. Qual é a diferença que o BNI tem em relação aos outros bancos comerciais?
A primeira grande questão entre o banco de desenvolvimento e os outros bancos comerciais está na própria natureza. Enquanto bancos comerciais, são bancos, normalmente detidos por investidores privados que, existindo pretendem a maximização de lucros, o banco de desenvolvimento é um banco normalmente detido parcial ou totalmente pelo Estado, cuja missão é promover o desenvolvimento socioeconómico sustentável, financiando projectos de infra-estruturas e o sector produtivo com impacto relevante para a economia. As diferenças são várias, mas eu gostaria de me concentrar em três que a primeira tem a ver com as próprias fontes de financiamento dos bancos, a segunda as condições de financiamento às empresas e a terceira, o tipo de projectos financiados sob ponto de vista de impactos esperados. Primeiro, em termos de fontes de financiamento, as principais fontes de financiamento dos bancos comerciais são os depósitos, que têm a maturidade máxima até um ano, enquanto a principal fonte de financiamento de um banco e desenvolvimento são os recursos públicos, portanto recursos do tesouro que são destinados a promover o desenvolvimento. São transferidos para a economia através de um banco de desenvolvimento. Infelizmente, o BNI foi criado num contexto adverso e até agora não se tem ainda beneficiado desta importante fonte de financiamento que são os recursos do Estado e tem utilizado como principal fonte os empréstimos. Empréstimos obrigacionistas para o financiamento do balanço em meticais, empréstimo bancário de outras instituições financeiras de desenvolvimento, neste caso internacionais, para o financiamento em moeda estrangeira. Portanto, para o BNI, neste momento, a principal fonte de financiamento no painel da segunda edição da MOZGROW, subordinado ao tema: “Financiamento de Transformação de Agro-negócios”, o Presidente da Comissão Executiva do Banco Nacional de Investimento abordou as vários formas de acesso ao crédito bancário pelo sector agrícola no país, os desafios, soluções e as perspectivas do sector agrícola.
Mas há perspectivas que o BNI possa, nos próximos tempos, de facto também ter o financiamento por parte dos fundos públicos?
Sim. Estamos a trabalhar com o Governo para ver se nos próximos anos começamos, de facto, a beneficiar deste financiamento porque só assim vamos, de facto, desempenhar nosso papel como banco de desenvolvimento. Mas nós compreendemos. Estamos a viver períodos de crises. O próprio Governo tem estado a enfrentar dificuldades e é, exactamente, por isso que nós procuramos alternativas para ainda assim continuarmos a desempenhar a nossa função. A outra diferença importante, são as condições de financiamento às empresas. Enquanto os bancos comerciais financiam em condições de mercado, comerciais, sobretudo de preço e taxas de juro de mercado, o banco de desenvolvimento tem que financiar em condições mais acessíveis de taxa e de prazo. Taxas de juro mais baixas, prazos mais longos, quer dizer, mais ajustados o perfil de risco e retorno dos projectos. Exactamente pelo facto de o financiamento do banco de desenvolvimento ser por fundos públicos que são mais baratos, este banco deve repassá-los a economia, aqueles projectos com mais impacto social taxa de juro, também mais baixa. Neste caso que ainda não beneficiamos do financiamento de fundos públicos para o nosso balanço, o que temos feitos é, os empréstimos quem têm estado a financiar o nosso balanço, procuramos negociá-los com os nossos investidores, no sentido de que estejam a taxas de juro mais baixas, a prazos mais ajustados para que também possamos repassar estes cursos em condições acessíveis para as empresas que, efectivamente, demandam recursos mais acessíveis quem têm impacto social para a economia, mas esperamos que quando o país estiver em condições de investir no BNI como um banco de desenvolvimento, conseguiremos dar condições de financiamento ainda mais baixas e acessíveis do que conseguimos agora. A terceira diferença importante tem a ver com o tipo de projectos financiados do ponto de vista do impacto esperado. Enquanto os bancos comerciais perseguem a maximização do lucro, naturalmente que eles olham para projectos apenas, financeiramente viáveis enquanto para nós, para além de serem financeiramente viáveis, os projectos devem ser, socialmente viáveis. Ou seja, nós não olhamos apenas para a viabilidade financeira, mas sim a económica, mas sobretudo a social dos projectos. Isto é, este projecto que impactos vai gerar quantos empregos vai gerar, que ligações empresariais este projecto vai criar, quantos outros negócios este projecto vai mover, em termos de valor, quanto é que este projecto vai gerar de novos impostos. Na verdade, nós olhamos para todos os impactos que projecto poderá gerar para podermos financiá-lo. O que significa que mesmo que o projecto seja financeiramente viável, se ele não nos demonstrar uma viabilidade social, significa que o projecto pode ser financiado via banco comercial, é um projecto comercial. Para dar um exemplo, um projecto poder ser muito bom e financeiramente viável, mas quantos empregos vai gerar, dois ou três, existem esses tipos de projecto. Para nós não nos interessa, a banca comercial pode financiar. Esta é uma diferença também, extremamente importante entre o banco de desenvolvimento e banco comercial. Gostaria de fechar esse ponto, esclarecendo que nós não concorremos com a banca comercial. Pela minha explicação que dei, percebe-se que nós nos complementamos por que muitas vezes, nós entramos onde banca comercial não se interessa.
Muitas vezes, há aqueles projectos que não são muito apetecíveis para a banca comercial porque as taxas de retorno que eram esperadas são mais baixas ou porque o período de investimento é mais longo, no entanto esse projecto tem impacto social, para banca comercial, naturalmente que não vai interessar muito, mas para nós interessa porque tem um impacto social e somos um banco do Estado então temos que entrar para promover esse negócio.
Os objectivos do desenvolvimento sustentável estabelecem entre outros, a fome zero e a agricultura sustentável bem como promoção do trabalho digno. Qual deve ser o papel da banca de desenvolvimento na materialização desses objectivos?
O papel da banca de desenvolvimento tem que ser, essencialmente, encontrar soluções financeiras que sejam ajustadas ao perfil de risco de retorno do sector do agronegócio, nomeadamente, financiar e assistir todos os intervenientes da cadeia de valor do sector do agronegócio, encontrar soluções que permitam a redução do risco e crédito que é perseguido e determinado pelos bancos comercias, o que acaba afectando o nível de acesso o financiamento bancário por parte dos projectos do agronegócio, procurando olhar para cada um dos intervenientes e ver como financiar, como assisti-lo de modo que não se quebre a cadeia. Que haja certeza de que, cada interveniente na cadeia vai ter o mercado e o banco ter garantia de que ele vai gerar recursos para poder fazer face ao financiamento. Portanto, tem que encontrar soluções em termos de instrumentos de cobertura de risco de crédito como fundo de garantia, este é o papel do banco de desenvolvimento, mas também olhando para outra fonte de risco dos projectos do agronegócio, particularmente da agricultura que é a despreparação ou falta de capacidade por parte dos operadores de produção de planos no âmbito de estruturação dos seus negócios, o banco de desenvolvimento tem esse papel de assistir apoiar esses intervenientes, produtores na estruturação dos seus projectos, elaboração de planos de negócio para que eles sejam, de facto, bancáveis. Quer dizer, o banco de desenvolvimento não deve olhar apenas para aqueles projectos que já estão bem estruturados e já são bancáveis. Tem que preparar e assessorar os que tem boas ideias, no entanto não conseguem estruturar os projectos, têm bons projectos, mas não estão bem estruturados, não têm planos de negócio. É papel do banco de desenvolvimento financiar essa estruturação e preparação dos planos para assegurar que estes também passem a ser bancáveis. Isso vai ser importante para a redução do risco de crédito para que esses projectos possam até ser financiados pela própria banca comercial. Outro problema importante tem a ver com a fonte de risco dos bancos, dos operadores da agricultura é a questão, e olhando para o nosso país, de parte significativa da produção agrícola, ser por produtores familiares e são que praticam a agricultura, basicamente, de subsistência, não mecanizada, utilizam semente de fraca qualidade ou não certificada e, consequentemente, o nível de produtividade é baixo e o rendimento também vai ser baixo. É papel do banco de desenvolvimento criar condições para o financiamento, a mecanização da produção, ma também criar condições para a utilização de semente de boa qualidade, certificada e também criar condições para capacitação dos produtores para assegurar o aumento da produtividade e do rendimento. Fazendo isso, garante-se a redução do risco de crédito associado à agricultura e nessas condições a agricultura estará em condições de ser financiada pela própria banca comercial. Portanto, estando perante uma agricultura mecanizada, que utiliza semente certificada, que aumenta a produtividade e criando condições para que esta produção seja colocada no mercado, apoiando os outros intervenientes na cadeia, nomeadamente os agro-processadores e os comerciantes que colocam a produção no mercado então o nível de risco reduz porque os bancos têm a garantia de que estes produtores vão se concentrar apenas na produção, vão aumentar a produtividade, tem alguém a quem entregar, tem onde colocar aos distribuidores ou agro-processadores. Portanto, é mais fácil financiar esse agricultor porque há garantia de que os recursos vão ser reembolsados e vai conseguir, de facto, vender, portanto, este é que é o nosso grande papel como banco de desenvolvimento.
Assistência e assessoria aos produtores na elaboração de projectos – E no caso específico do Banco Nacional de Investimento, que tipo de assistência tem sido dada aos agricultores em termos de elaboração, estruturação dos seus planos de negócio?
Nós, conforme disse no início, quando olhamos para a agricultura, olhamos para toda cadeia. Nunca olhamos para um ponto porque aí é comprar o risco e vai ser muito difícil ter o reembolso do valor. Portanto, nós procuramos sempre integrar os intervenientes. Sempre que financiamos um ponto, é porque temos a certeza da sua ligação deste interveniente com os outros que vão garantir, efectivamente, que consiga vender. Como é que nós fazemos isso? No banco, nós temos dois grandes segmentos. O seguimento da banca de desenvolvimento que é responsável por assegurar o financiamento bancário tradicional depois do seguimento da banca de investimento, responsável por assegurar a assessoria financeira na estruturação dos projectos e elaboração de planos de negócio. O que nós fazemos, desenhamos projectos em que identificamos produtores com potencial de um lado e por outro identificamos distribuidores e agro-processadores que também tenham mercado. Olhamos, igualmente, para o seu mercado final e depois para toda a cadeia para ver como é que podemos apoiar toda ela. Os primeiros produtores, que tipo de apoios precisam? Antes mesmo do próprio financiamento, eles precisam mesmo de assistência para a elaboração e estruturação dos seus projectos e aí nós fazemos esse trabalho através do seguimento banca de investimento, mas também através de parcerias com outras instituições do Estado cuja função é promover o desenvolvimento de pequenas e médias empresas, neste caso o IPEME e ele (IPEME) se encarrega de estruturar e elaborar um plano de negócio e apoiar esses produtores. No projecto que nós desenhamos inclui essa componente para o pagamento do IPEME, porque ele está a prestar aqui um serviço. Com projectos bem estruturados, nós entramos e financiamos e depois de financiar, garantimos, através das nossas áreas específicas, mas também da parceria com IPEME e outros intervenientes, como a Agência do Vale do Zambeze, a assistência ao acompanhamento o processo produtivo para assegurar que, de facto, esse beneficiário vai cumprir com o que foi programado. Uma vez feita a produção que estes produtores tenham mercado para colocar ou têm distribuidores por entregar, se forem produtos que sai da machamba como acabados ou têm indústria de agro-processamento para entregar e nós procuramos ver como é que assistimos esses intervenientes. Como é que podemos financiar os distribuidores e os próprios produtores industriais. Então, os financiamos para assegurar que esses vão comprar a produção e depois colocar no mercado. Portanto, assim conseguimos fechar a cadeia e assegurar sucesso nessas operações. Só para dar um exemplo, nós temos estado a contribuir muito para a exportação de cereais como milho, soja e gergelim, mas também de castanha de caju. Fazendo isso, nós conseguimos que estes agro-processadores integrem os produtores familiares sem precisarmos de financiá-los directamente porque nós conseguimos influenciá-los através do financiamento aos agro-processadores. É assim que nós procuramos actuar. Primeiro na própria assistência para assegurar que os projectos estejam bem estruturados, no financiamento para a produção e depois na assistência e financiamento a toda cadeia para assegurar que ninguém fique sem gerar receitas porque tem problemas de colocação no mercado.
A agricultura e o agro-negócio, de uma forma genérica, são sectores estratégicos para o desenvolvimento do país, a questão que coloco em relação a esta afirmação é que avaliação faz da disponibilidade e acessibilidade de o financiamento para este sector em Moçambique?
O nosso entendimento é que a disponibilidade e o acesso ao crédito bancário tradicional para o sector do agro-negócio ainda têm muitos desafios. Entendemos que ainda é insuficiente. Mas é o PCE do BNI defende que os programas governamentais têm sido alternativas, determinantes para financiamento à agricultura familiar ciso explicar porque razões para não se perceber que os bancos já não querem financiar por causa do tipo de agricultura que é praticada. O nível de risco acaba sendo alto porque sendo a agricultura familiar não mecanizada, que utiliza pouca semente certificada, a produtividade é baixa e, consequentemente, rendimento será baixo e isso eleva o risco de crédito, a probabilidade deste produtor gerar não crédito. Mas a outra fonte de risco nesta aspecto é depois da produção, a própria colocação, portanto aqui a ausência de integração dos vários intervenientes da cadeia faz com que o risco seja alto porque mesmo lhe financiando e produzindo, não havendo certeza de onde ele vai colocar o produto, isso eleva o risco do negócio. Depois a terceira fonte é a questão da incapacidade de os próprios produtores familiares, que são a maioria dos produtores agrários em Moçambique, de estruturação dos próprios projectos. Não havendo essa capacidade de estruturação dos projectos, isso limita o seu acesso ao crédito bancário tradicional. Por causa desses factores, posso dizer que o acesso ao crédito bancário tradicional por parte da agricultura ainda é um grande desafio. No entanto e porque o Governo sempre reconheceu a importância estratégica da agricultura estas dificuldades que a agricultura enfrenta face a banca, o executivo sempre criou alternativas de financiamento a agricultura, projectos que visem financiar a agricultura. Actualmente, por exemplo, o Sustenta, mas antes do Sustenta, o FDA é uma instituição do Governo que sempre trabalhou na promoção e financiamento para o desenvolvimento a agricultura, o antigo Incaju, também é uma instituição criada para fomentar a amêndoa da castanha de caju e tantas outras instituições do Estado, que sempre trabalharam na criação de fontes alternativas para apoiar a agricultura. É exactamente por isso que a agricultura continua a liderar, em termos de contribuição dos sectores no nosso Produto Interno Bruto, com cerca de 25% em média, historicamente, a agricultura é o sector com maior contribuição, mesmo com essas dificuldades e acesso ao crédito porque o Governo sempre prestou especial atenção e sempre criou alternativas de financiamento a agricultura para que ela continue a liderar a produção em Moçambique. Agora, com o Sustenta e outros programas acredito que a contribuição o agro-negócio vai melhorar e com o banco de desenvolvimento que é o BNI que também vem apoiando de forma muito forte e que tem projectos em carteira que ainda vai implementar no apoio ao agro-negócio, naturalmente que a contribuição da agricultura vai aumentar. O nosso objectivo é que consigamos substituir as importações, particularmente dos produtos alimentares porque não entendemos que não se justifica que, com as condições climatéricas que nós temos, a terra que temos e o seu nível de fertilidade, continuemos a importar comida, por exemplo, da África do Sul. Então, o grande desafio é esse e nós estamos para contribuir e continuaremos, de facto, a contribuir.
Olhando para essa questão que Dr. Matola acaba e levantar que tem a ver com a estrutura da nossa agricultura associada, por algumas fragilidades, que não obstante a existência delas, ela continua dando a sua contribuição de acima de 20% do PIB, uma das coisas que se coloca tem que ver com o risco que o sector da agricultura representa para a banca. Dr. Matola falou disso, mas queria conduzir essa questão na perspectiva de factores de produção, terra, trabalho e capital. Qual é o elo mais fraco neste trinómio?
Provavelmente seja capital porque terra temos, trabalho também temos embora haja desafios sob ponto de vista de qualificação dos trabalhadores do sector, mas trabalho nós temos muita oferta na agricultura. O sector da agricultura, como indicam as estatísticas, é um dos que mais empregam em Moçambique. O ele mais fraco, eu entendo que seja o capital porque com o capital conseguimos mitigar o impacto do facto de a nossa mão-de-obra não ser qualificada. Podemos, com capital, financiar a formação dos técnicos que trabalham no sector da agricultura. Portanto, o elo mais fraco é o capital. É por isso que o Governo tem estado muito a apostar na disponibilização de recursos financeiros para o financiamento à agricultura e nós, também, como banco de desenvolvimento temos um papel importante na mobilização de recursos financeiros nos mercados internacionais a taxas de juro mais acessíveis para nós para que nós também possamos repassar esses fundos ao agro-negócio a taxas de juro mais acessíveis. Portanto, resumindo, o grande desafio entendo que seja o capital.
Olhando para esta cadeia de produção, há alguma corrente de opinião que olha para esses grandes projectos de financiamento a agricultura como sendo bons, mas de certa forma há um receio de que esse massivo investimento que se está a dar a nossa agricultura sem uma cadeia de valor cada vez mais sólida e robusta e estruturada possa gerar uma cris de super produção a médio e longo prazo. Qual é a sua opinião em relação a esse ponto?
A minha opinião é de que esses investimentos para o sector do agro-negócio devem, também, incorporar uma componente de estruturação de toda cadeia para mitigar esse risco. Ou seja, o investimento na agricultura, não pode se apenas na produção. Porque se o investimento for apenas na produção aí vamos ter esse problema de super produção, mas se o investimento for na produção, mas também na integração dos outros intervenientes da cadeia, portanto produção, agro -processamento e distribuição, aí nós conseguimos mitigar esse risco. É preciso olhar, também, para os elementos que são essenciais para assegurar essa integração: a questão das infra-estruturas. Ainda que haja produção, compradores, indústria para transformar, continuarmos com dificuldades para aceder a alguns locais de produção, aí o risco vai prevalecer. Significa que esses investimentos massivos para a agricultura, devem incorporar uma componente para assistir toda a cadeia. Entendo que o programa Sustenta, os seus mentores olham para isso e percebi, quando li, que está assegurada essa questão. O programa Sustenta, para além de integrar todos os intervenientes, ele assegura o melhoramento de todas infra-estruturas necessárias para o escoamento da produção e assegurar que a produção saia dos pontos de produção para os mercados, centros de processamento, a custos de transação mais baixos. O grande problema da ausência de infra-estruturas é que isto eleva os custos de transação, mesmo que a produção chegue aos mercados, vamos constatar que chega lá a um custo mais alto daí que os preços ficam menos competitivos que a produção importada e isso acontece. Nós temos exemplos. No mercado do Zimpeto, temos produção local, alguma até de Maputo, que, em termos competitivos, não consegue competir com a produção que vem da África do Sul que atravessou a fronteira, pagou impostos por causa dos custos de produção. Muitas vezes os custos de produção estão associados aos custos de transação quando as infra-estruturas não são muito boas e não permitem o acesso fácil às zonas de produção. Em suma, os investimentos ao agro-negócio devem olhar não só para a produção, mas para todos os intervenientes da cadeia. – Sob ponto das nossas estatísticas, os actores que estão envolvidos na agricultura, 90 praticam a agricultura de subsistência ou familiar. A questão que se coloca é como garantir que esta produção do sector familiar possa beneficiar destes apoios, tendo em conta que o objectivo fundamental é fazer com que gradualmente, os agricultores familiares passem para uma agricultura mecanizada com toda a tecnologia possível que lhes possa produzir dentro daquilo que são só prazos já previstos e disponibilizar no mercado em tempo útil para que possa também em tempo útil fazer face às suas obrigações financeiras que possam contratar junto à banca, no caso concreto junto do Banco Nacional de Investimento. O meu entendimento é que, nesta fase em que estamos, quer para o BNI, com banco para o desenvolvimento, quer para os bancos comerciais, não é fácil financiar directamente os produtores familiares. A estratégia que nós adoptamos é utilizar integradores desses produtores familiares, nomeadamente os grandes produtores e a indústria de agro-processamento. Nós financiamos os grandes produtores nos grandes centros de produção e a indústria de agro-processamento a taxas de juro mais baixas e acessíveis sob a condição de eles integrarem os produtores familiares. O que significa que os produtores familiares vão ter acesso a esse financiamento de forma indirecta. Os integradores vão distribuir os insumos de produção, incluindo a tecnologia e equipamento sob a forma de crédito com a garantia de que, uma vez feita a produção, eles vão tomar a produção. O que significa que aqueles produtores familiares vão ter acesso a tecnologia, insumos, equipamentos, a assistência e vão produzir, mas a preocupação deles vai ser só produzir porque eles já sabem que, uma vez produzido, têm onde colocar. Do lado do banco, tem garantia de reembolso porque sabe que este grande produtor, agro-processador financiado tem estrutura que permite ao banco fazer análise de crédito, de risco e decidir se de facto tem mercado para colocar a sua produção. Então o banco está mais seguro em financiar o grande produtor. Do lado dos produtores familiares, porque eles agora têm equipamento, insumos e semente certificada incluindo a assistência a produtividade aumenta e quando a produtividade aumenta, aumenta o rendimento. O que vai acontecer é que ele, com aquele aumento, já vai ter capacidade de, por exemplo, se deslocar para agência do banco comercial do seu distrito para fazer um depósito. Passa a ter a capacidade de ir, como particular, porque muitos dos agricultores familiares não estão estruturados como empresa. É por isso que nós não como financiá-los directamente. Mas como particular, porque ele já tem rendimento garantido, vai ter capacidade de se deslocar ao banco e pedir um empréstimo para comprar uma viatura ou fazer sua casa. O banco vai estar confortável porque sabe que ele está a produzir e logo a seguir tem comprador. Então aí o risco de crédito reduz. Ou seja, nós, com a nossa actuação, sem financiar directamente os produtores familiares, contribuímos para o aumento do seu rendimento para depois criar condições para ele passem a utilizar a banca comercial. É por isso que dizia que a banca para o desenvolvimento e a comercial se complementam porque tudo que fazemos depois vai gerar negócio para a banca comercial. Essa é a actuação.
Nas áreas de actuação, quando falamos das alternativas de financiamento para o sector o agro-negócio, não sob de vista daquilo que o BNI tem, mas as áreas que tem sido estratégicas sob ponto de vista de apoio?
Os apoios que temos dado ao agro-negócio, tem a componente da assistência técnica na componente da estruturação de projectos e a do próprio financiamento. Nós financiamos directamente ao micro pequenos agricultores, aqueles que já estão estruturados como empresas e têm toda a formação legal e financeira que nos permite avaliar e para os produtores familiares, nós intervimos através de financiamento aos integradores, aos grandes produtores e agro-processadores. Os nossos financiamentos são o médio e longo prazo. Todos os financiamentos de curto prazo estão atrelados a um financiamento de longo prazo. Do ponto de vista de impactos, na nossa actuação no agro-negócio, só nos últimos três anos e até a agora a nossa carteira é de cerca de 1.5 mil milhões, geramos empregos directos e indirectos cerca de 63 mil empregos, ou seja, beneficiamos 63 mil famílias. Em termos de beneficiários totais, estamos a falar de 300 mil. Em termos de produção, estamos a falar de cerca de 83 mil toneladas de vários produtos que foram produzidos com a nossa intervenção e em termos de montantes estamos a falar de cerca de 2.5 mil milhões de meticais. Veja que investimos 1.5 mil milhões e em termos de produção gerou-se cerca de 2.5 mil milhões, quase o dobro. Portanto, sentimos que temos estado a contribuir, significativamente, com os nossos produtos para o agro-negócio e mesmo nos casos em que nós não financiamos directamente, que é a agricultura familiar, procuramos influenciar através do financiamento aos integradores e temos estado a contribuir para a geração de rendimento. Em termos de produtos especificamente, voltando a tua questão inicial, nós oferecemos serviços de assessoria, estruturação financeira, elaboração de estudos de viabilidade, mobilidade de recursos financeiros quando nós não conseguimos financiar com o nosso balanço, pedimos mandato do cliente para mobilizar nos mercados internacionais porque há daqueles projectos de agricultura muito grandes que demandam milhões de dólares que, com o nosso balanço, não conseguimos financiar. Nós não rejeitamos porque não podemos financiar, pedimos mandato e mobilizamos e temos estado também a contribuir para agricultura através de financiamentos que são feitos pelos nossos parceiros internacionais. Mas mais ainda nós contribuímos para a redução do nível do risco de crédito, fornecendo instrumentos de cobertura do risco de crédito como fundos de garantia. Temos, por exemplo, um fundo de garantia que estruturamos com o FDA que faz a cobertura do risco de crédito para financiamento a cadeias de agro-negócio até 80 %. Por causa deste fundo, conseguimos que projectos da agricultura fossem financiados a 7% por causa desta cobertura de risco garantido deste fundo. Portanto, esses são outros instrumentos que nós conseguimos providenciar, mas também facilitamos a importação de diversos equipamentos agrícolas através da emissão de cartas de crédito e também emitimos garantias bancárias para facilitar várias transações dos operadores sobretudo na área de agro-processamento.
Que programas de financiamento existem no BNI, visando a promoção do empreendedorismo juvenil em termos de agro-negócio?
Relativamente a promoção do empreendedorismo juvenil, nós temos um programa chamado FAE, que é uma linha de financiamento ao agro-negócio. Tivemos uma fase piloto que foi apenas na região centro do país e cobriu todas as províncias banhadas pelo rio Zambeze e fizemos esse projecto com parceria com a Agência para Desenvolvimento do Vale do Zambeze. Foi um projecto interessante, tanto que agora estamos a mobilizar recursos para expandir o projecto para todo o país. É um projecto que visa promover o empreendedorismo que financia projecto micro e pequenas empresas de jovens, mas mais do que isso a iniciativa financia jovens recém-graduados dos institutos técnicos profissionais de modo que eles ao saírem da formação não engrossem a lista de jovens que estão à procura de emprego, mas têm oportunidades de criar seu próprio negócio empregar-se a si próprios, seus familiares e a sua comunidade. Foi um projecto que teve um impacto muito positivo na região centro, parte significativa dos mercados são abastecidos pela produção desses jovens que nós financiamos. Agora vamos expandir o projecto para outros pontos do país porque foi um projecto muito bem-sucedido e conseguimos criar empresários de zero. Eram jovens que eram singulares, eles conseguiram, com nosso apoio, estruturar em sociedades e empresas e agora são empresários que estão a operar. Queria destacar neste projecto, a parceria que temos com o IPEME, uma entidade de promoção de pequenas e médias empresas pertencente ao Ministério da Indústria e Comércio que é um parceiro muito importante com quem nós trabalhamos, o IPEME tinha a responsabilidade de apoiar todos os jovens na elaboração de planos de negócio para submissão para financiamento. Portanto, todos os projectos que nós financiamos eram projectos que tinham sido alvo de viabilidade com o apoio do IPEME porque naqueles recursos disponibilizamos uma parte para assistência técnica. O próprio IPEME é remunerado quer dizer que não trabalhava de borla. E em todos os nossos projectos procuramos incorporar essa componente que é para assegurar o sucesso. Acreditamos que no próximo ano, esse projecto vai estar em todo o país e vamos poder apoiar mais jovens em Moçambique. Só para dar exemplo de alguns impactos, nós geramos empregos directos e indirectos cerca de 8.500 empregos o que significa que influenciamos 8.500 famílias e em termos de beneficiários finais estamos a falar de cerca de 62 mil pessoas e estamos a falar de cerca de 11.1 mil toneladas de produção de diversos produtos alimentares com maior destaque para tomate, cebola, batata-reno e arroz. Portanto, esses são os produtos de maior destaque, mas há outros e também produção de frangos e ovos. Tudo isso feito por jovens.
Neste capítulo da inclusão, que atenção está a ser dada a mulher rural que está integrada, de certa forma na agricultura e agro-negócio?
Relativamente à mulher, ainda não temos produtos específicos dedicados a mulher, mas o que acontece é que, em todos os nossos projectos e produtos, mulher tem acesso, é elegível e sempre damos um tratamento especial quando se trata de projectos da mulher. Portanto, o tratamento é sempre especial. Vamos no futuro, provavelmente no próximo ano, desenhar projectos específicos para apoiar a mulher, mas ainda assim, nós prestamos atenção nos nossos actuais produtos.
Sem pensar em estágios lineares, que perspectivas se abrem para o futuro tendo em conta a situação da nossa agricultura neste exacto momento?
Eu acho que as perspectivas são muito boas. A recente decisão do Governo de alocar mais recursos financeiros à agricultura, tenho impressão de que vai mudar muita coisa. O programa Sustenta no novo formato não há dúvidas que transformar a nossa agricultura. Nós, também, como banco, estamos a fazer a nossa parte, estamos a mobilizar mais recursos para apoiar a agricultura em toda a sua cadeia de valor. As perspectivas, olhando para esses eventos, na minha óptica são muito boas e acredito que, em poucos anos, provavelmente ainda neste mandato, nós vamos conseguir substituir parte significativa das importações de produtos alimentares. A agricultura, na nossa forma ver, é um sector de presente e do futuro e ainda vai gerar muitos rendimentos, não só para as famílias moçambicanas, mas também para própria economia, no seu todo. Tenho entendimento de que a agricultura vai continuar a liderar a contribuição do Produto Interno Bruto.
Mais menos a dobrar? Estamos a falar de um sector estratégico. Se agora falamos de uma contribuição de 20 a 25%, esperamos que com esse volume de investimentos, essa contribuição possa duplicar nos próximos cinco anos.
Essa contribuição pode duplicar, provavelmente, não nos próximos cinco anos, mas nos próximos dois ou três anos até começar entrada de receitas das operações do gás do Rovuma porque, tenho entendimento de que, nessa altura essas estatísticas de distribuição do PIB por sector vão alterar porque o sector de recursos minerais vai entrar com maior peso. Agora, dependendo da forma como esses recursos vão ser alocados para a diversificação da economia, isso pode fazer com a contribuição da agricultura continue a crescer porque se parte significativa desses recursos forem alocados para apoiar a agricultura, naturalmente que ela vai continuar a aumentar a sua contribuição porque nós o mercado doméstico muito grande para absorver toda a produção da agricultura, mas também temos algum mercado a nível regional. Então temos que começar a pensar que, depois de cobrirmos a demanda local, podemos olhar também os mercados internacionais, tal como alguns subsectores da agricultura têm estado a exportar muito. Portanto, há ainda muito espaço para nós continuarmos a aumentar a produção.
Com isto, Dr. Matola está a considerar que, com uma agricultura bem estruturada e producente, podemos ter, de facto, nos próximos anos, Moçambique a experimentar um crescimento no índice de desenvolvimento humano?
Com certeza porque com o investimento, a agricultura tem essa grande capacidade de afectar directamente os produtores familiares e as zonas rurais. É nas zonas rurais, onde temos maiores índices de pobreza. Agora, se nós apostamos numa agricultura que afecta as zonas rurais, naturalmente que os nossos índices de desenvolvimento humano vão melhorar significativamente. E essa abordagem que eu expliquei de apontar para agricultura familiar através do financiamento dos integradores, que permite que os agricultores familiares, ainda que não tenham capacidade de aceder directamente a banca ou financiamentos, eles poderão ter acesso aos insumos, produzir e colocar a sua produção, não haverá dúvidas de que nós estaremos, de facto, a caminhar para um desenvolvimento sustentável, no sentido de que ele consegue absorver todas as camadas sociais, sobretudo para a camada que é maioritária que é das zonas rurais, a mais afectada pelos níveis de pobreza.