O Governo nega-se a dizer se as câmeras de segurança, instaladas em Maputo, funcionam ou não, justificando tratar-se de questões operativas. O Executivo não fala também sobre a unidade anti-rapto prometida em 2021 e que ainda não existe.
O rapto do empresário proprietário dos Armazéns Atlântico ocorreu diante de muitas câmaras de segurança privada.
Consumado o crime, os raptores seguiram com a vítima na sua viatura pela Avenida Ho Chi Min. No percurso que fizeram até atravessar a Guerra Popular e alcançar a Filipe Samuel Magaia, não há câmaras de segurança instaladas na via pública pelo Governo. Mas há, nestas avenidas, forte presença policial que, no dia do rapto, não reagiu.
Depois de raptar o empresário, numa numa acção que durou quase três minutos, os raptores seguiram viagem num percurso de 700 metros até chegar à Avenida Filipe Samuel Magaia.
Estima-se que os supostos criminosos tenham feito esta viagem em três minutos e, neste período, não se viu a reacção da Polícia.
“Onde é que está o funcionamento do mecanismo de alerta? Os agentes deviam ligar uns para os outros a comunicarem-se sobre qualquer coisa suspeita. Mas, nos pontos estratégicos, onde estão essas brigadas, o que estão a fazer para reagirem a este mal? Como é que funciona este canal de comunicação? Isto tudo pode estar a falhar”, concluiu o criminalista Paulo de Sousa.
E fundamenta o seu posicionamento: “Não faz sentido os raptores passearem pela cidade com uma viatura identificada trocarem viatura sem que haja o seguimento”.
Porque não houve seguimento, os raptores tiveram, ainda, tempo de parar na Avenida Filipe Samuel Magaia para trocar de viatura.
“O País” sabe, também, que os supostos criminosos teriam mudado de roupa no mesmo local. Tudo isto aconteceu perante as câmaras de videovigilância instaladas pelo Ministério do Interior.
Esta ousadia dos raptores, segundo o criminalista, só tem uma explicação. “Estes indivíduos, provavelmente, tenham feito um estudo do funcionamento das câmaras de vigilância, da reacção da Polícia pelas avenidas por onde passaram. Eles não vão fazer este trajecto sem ter um estudo anterior. Os mecanismos de resposta a isto é que devem ser eficazes”, observou Paulo de Sousa.
As câmaras na via pública foram instaladas pelo Ministério do Interior em 2016, para ajudar a esclarecer vários tipos de crimes, incluindo os raptos.
Confrontámos o Governo sobre o funcionamento das câmaras na via pública e a resposta foi a seguinte: “Eu não lhe respondo a estas questões de forma directa. As câmaras foram colocadas onde estão por alguma razão. Não posso mencionar nesta conferência questões de natureza operativa, porque estaríamos a desvirtuar o papel que tem sido levado a cabo pelas nossas autoridades policiais e judiciais. Por isso, prefiro que esperemos que, como Governo, entendamos que temos material para partilhar sobre estas questões e aí vamos globalizar as respostas para satisfazer a questão que me coloca”, argumentou Filimão Suazi, porta-voz do Conselho de Ministros .
UNIDADE ANTI RAPTO “EM BANHO-MARIA”
Outra questão colocada ao Governo, e que também não foi satisfeita, está relacionada à existência e acção da unidade anti-rapto. “Falar de raptos na Cidade de Maputo e não só, falar da unidade anti-raptos, são questões do dia-a-dia. Não as abordamos apenas hoje. Essas são matérias que fazem parte do nosso sumário diário. São preocupações do Governo. São matérias sobre as quais temos estado a trabalhar dia, tarde e noite e auguramos que tenhamos soluções para todas essas situações”, acrescentou o porta-voz do Conselho de Ministros.
A solução para os raptos, entende o criminalista Paulo de Sousa, passa por capacitar os agentes das Forças de Defesa e Segurança.
“Se nós não nos actualizarmos, não colocarmos indivíduos formados para reagir a este tipo específico de crime, vamos sempre ter crime sem solução e sem descobrimento dos autores. Então, será um conjunto de crimes contra desconhecidos e sem a identificação dos criminosos”, afirmou Paulo de Sousa.
Em Novembro de 2021, o Comandante-Geral da Polícia anunciou o início da formação de forças especiais da PRM para combater crimes de rapto, cuja duração seria de seis meses. Ora, passam-se mais de dois anos e nunca se viu nenhuma unidade anti-rapto e muito menos a sua intervenção no esclarecimento deste tipo legal de crime.
A formação de forças especiais para combater os raptos, e não só, iria decorrer no distrito de Manhiça, Província de Maputo.
“A ferramenta é do Estado moçambicano e é para servir, exclusivamente, aos moçambicanos honestos e não aqueles que pensam que têm de continuar a raptar para extorquir o cidadão e fazer fugir os investidores”, exortou o Comandante-Geral da PRM, Bernardino Rafael, aquando do lançamento da formação.
Pouco depois de dois anos, a força anti-rapto, que contaria com formadores moçambicanos e ruandeses, ainda não existe e, em Maio do ano passado, confrontámos a ex-ministra do Interior, Arsénia Massingue, que explicou o porquê.
“Ao nível interno, não encontrámos essa capacidade de formar as forças. Estamos a trabalhar com parceiros externos para podermos a formação, com muita rapidez, desta brigada para agilizarmos a prevenção e combate a este tipo legal de crime”, justificou, em Maio de 2023, a ex-ministra do Interior, Arsénia Massingue.
Enquanto a brigada anti-rapto continua inexistente por conta da incapacidade interna para a formação desta força, os crimes de rapto vão-se intensificando, minando o ambiente de negócios, sobretudo na capital do país.