O País – A verdade como notícia

Mediatização da COVID-19 gerou pânico nos profissionais da saúde e utentes do HCB

Foto: O país

A mediatização da COVID-19, e por vezes com informações pouco claras, criou pânico no meio dos profissionais da saúde afectos na maior unidade sanitária da região Centro do país, o Hospital Central da Beira (HCB), inclusive nos seus utentes, um facto que contribuiu para que centenas de doentes deixassem de frequentar a unidade sanitária e sofressem nas suas residências de diferentes enfermidades e alguns morreram por falta de cuidados médicos.

De acordo com Ana Tambo, directora clínica do HCB, a mediatização da doença sobre a sua propagação, locais de contaminação e mortes provocadas, foi mal interpretada ou difundida com algumas lacunas, o que gerou pânico nas comunidades.

“Notamos que o número de utentes que frequentava o hospital e de internados nas enfermarias baixou quase para metade. As enfermarias estavam vazias e um estudo por parte da comissão científica do HCB, que fora criado para lidar com a doença, concluiu que os doentes estavam nas suas residências, alguns morreram porque temiam dirigir-se ao hospital, já que, para eles, era o foco da doença, quando, na verdade, a maior contaminação foi sempre comunitária”, explicou Ana Tambo.

Fátima Manuel, uma das utentes do HCB, que a nossa equipa de reportagem encontrou na enfermaria de ortopedia, é uma prova dos doentes que evitaram os cuidados hospitalares, por temerem contrair a doença. Ela adiou uma consulta de ortopedia durante 14 meses.

“Eu tinha medo. Diziam que aqui, no Hospital Central da Beira, havia muita contaminação da doença. Eu preferia suportar as dores que sinto no meu pé em casa em vez de vir aqui e contrair a doença com todos os riscos de infectar toda a minha família. A doença abrandou e julgo que é uma oportunidade para receber cuidados médicos”, disse Fátima Manuel.

Ao nível do Hospital Central da Beira, de acordo com a directora clínica, todos os profissionais e o pessoal de apoio contraíram a COVID-19. “Chegou uma altura em que a COVID ficou descontrolada. No nosso seio, fomos igualmente afectados. Não existe nenhum funcionário que possa afirmar que nunca apanhou a doença e cada um no seu tempo. Infelizmente, quatro colegas morreram. Foram momentos separados, mas cada vez que isso acontecia, nós sentíamo-nos derrotados. Felizmente, lutamos e, hoje, continuamos, aqui, firmes, lutando todos os dias contra a pandemia”, avançou Ana Tambo.

Octávio Camacho, médico afecto ao Hospital Central da Beira, afirmou que atender um doente no auge da COVID-19 e com informações diárias diferentes sobre o comportamento da doença, propagadas pela media e canais oficiais internos do sector, era bastante desafiador.

“Tínhamos que nos reinventar para salvar vidas e cuidar da nossa saúde. Sabendo que a doença é altamente contagiosa, todo o cuidado era pouco. Era preciso saber preservar o nosso slogan – ‘o nosso maior valor é a vida’ – para continuar a salvar. Um desafio nada fácil, tendo em conta que o mínimo descuido podia ser fatal para mim ou para o meu paciente. Não sei, até hoje, onde busquei forças para continuar firme. Felizmente, o pior já passou”, louvou Octávio Camacho.

Para a directora clínica, apesar de todas as medidas de prevenção terem sido relaxadas, é importante manter uma vigilância activa. Ana Tambo afirmou ainda que o HCB aprendeu com a doença que é importante estar em prontidão permanente.

“Aprendemos que, apesar de termos poucos recursos, somos capazes de salvar vidas e termos equipas preparadas 24 horas por dia. Portanto, há necessidade de melhoria nos nossos recursos humanos em qualidade e quantidade”, terminou Ana Tambo.

Partilhe

RELACIONADAS

+ LIDAS

Siga nos