No seu livro Elementos de semiologia, Roland Barthes designa a língua como uma instituição social e um sistema de valores. Para aquele estudioso francês, a língua afirma-se como a parte social da linguagem, visto que um indivíduo, por si só, não pode nem criá-la nem modificá-la. O que Barthes pretende dizer, essencialmente, é que a língua, enquanto conjunto de regras, é um contrato colectivo ao qual os falantes devem submeter-se em bloco, se quiserem comunicar.
As características sobre a língua apontadas por Roland Barthes são extensivas a todas às línguas do mundo, inclusive as bantu, com o mesmo valor de preservar e transmitir a cultura dos seus falantes ao longo do tempo. No entanto, para sobreviver, não basta que a língua seja um sistema de valores e esteja socialmente estabelecida, é fundamental que aumente o seu número de falantes e adapte-se às várias transformações tecnológicas e científicas que acontecem, pois, num mundo tão “globalizado” o diálogo multicultural tem-se estabelecido com maior velocidade, obrigando, muitas vezes, que certas línguas dominem as outras, o que a longo prazo pode determinar o desaparecimento das “fracas”.
Este artigo intitula-se As limitações das línguas bantu (moçambicanas) porque, se, por um lado, cada idioma falado no país apresenta suas especificidades e pertence ao seu grupo étnico próprio, por outro, todos partilham os mesmos dramas no que concerne ao futuro. A verdade é uma. Há um enorme risco de pelo menos algumas línguas bantu faladas em Moçambique desaparecem, por exemplo, daqui a 200, 300 ou 500 anos. A razão desse risco está no facto de, em muitos casos, as línguas bantu de Moçambique estarem circunscritas a um lugar ou região. Ou seja, mesmo no caso do emakhuwa, a mais falada de Moçambique, cobrindo toda a região Norte e parte da Zambézia, no Centro, não tem uma dimensão nacional como o swahil na Tanzania. Logo, um makhuwa que não fale português ou outra língua de origem europeia não tem como se comunicar com os seus compatriotas do sul do Zambeze. Esta situação, muitas vezes, obriga os falantes a investirem mais na língua oficial ou no inglês, francês e espanhol porque disso advém um factor de oportunidade: emprego, negócios ou educação escolar. Por isso, não poucas vezes, há cada vez mais pais e encarregados de educação a matricularem os seus filhos em escolas que lecionam em línguas estrangeiras, afastando, propositadamente ou não os adultos de amanhã da sua cultura, que se manifesta através de uma determinada língua.
Este cenário limita o desenvolvimento das línguas bantu, pois, ao invés de aumentar o número de falantes, vai perdendo gradualmente de geração em geração. Além disso, os poucos que ainda falam as línguas bantu vão se afastando do rigor linguístico de tal modo que ao fim de cada frase recorrem ao português para buscarem certos vocábulos por já não saberem o nome de um objecto na sua língua de origem. E o problema não termina por aqui.
Como referimos acima, o desenvolvimento tecnológico traz para o léxico contemporâneo muitas palavras novas, criadas essencialmente a partir do inglês, a língua que domina o mundo. Ao inserirem-se no contexto bantu, esses termos não passam por uma tradução. Pelo contrário, entram como neologismos, pelo facto de não terem formas próprias de designar, por exemplo, telemóvel, televisão ou internet. Logo, o facto de as línguas bantu serem demasiadas limitadas do ponto de vista tecnológico, faz com que estas a esse nível sejam dependentes das outras.
Em suma, enquanto as línguas bantu continuarem com as limitações presentes, no que concerne ao aumento de falantes e adaptação aos novos tempos, o que implica acompanhar o desenvolvimento da ciência; enquanto não ultrapassarem o domínio comunitário e estenderem o raio da leitura e escrita a mais indivíduos, dificilmente se tornarão competitivas, pois o tempo e o contexto mundial conspiram para que as mesmas desapareçam.