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14 de Fevereiro – Drogar a namorada

Eram 8:30 da manhã, quando ela subtilmente tentava ofuscar os raios de sol – que persistiam em focar-lhe a cara – puxando o que julgava ser o lençol de seda, com que ela havia arrumado a cama, no dia anterior. Ao se aperceber que se tapara com uma capulana e que o colchão onde dormia não era o seu, Vanessa levantou-se bruscamente e avistou uma velha sentada a sua frente, como se esperasse pacientemente que ela acordasse.

Deu-se conta da sua nudez plena, ao que voltou a cobrir-se rapidamente. Tapou a cara, certa de que tivera sido sequestrada. Quando voltou a destapar-se, reconheceu a velhota como sendo avó de Fernando, seu namorado.

– Oh meu Deus, vovó! Onde está Fernando? O que se passa?
Vanessa deu uma olhada pelo quarto e reconheceu que se encontrava no quarto isolado do resto da casa, destinado aos membros da família que padecessem de doenças contagiosas. A avó de Fernando, uma senhora dos seus 75 anos, bem vividos, inclinou-se para o chão de cimento, pegou na única xícara de alumínio que lá se encontrava e serviu um líquido verde que Vanessa reconhecera logo como sendo água de cacana.

– Vovó, por favor, eu não estou doente! Onde está minha roupa e minha carteira? Que dia é hoje? 14 de Fevereiro? Ontem à noite eu estava em Maputo e hoje acordo em Chibuto, sem saber como vim parar aqui? – Vanessa fechou os olhos, deu um suspiro de epifânia quando a ficha finalmente lhe caíu.

Fernando levou-a a jantar ao “Manjar dos Deuses” no dia 13 de fevereiro porque no dia 14 tinha uma viagem marcada para JHB, onde devia estar, nas primeiras horas de quinta-feira, numa reunião com os seus sócios sul-africanos.

A última imagem de que se lembrava quando estavam no restaurante, era a de Fernando insistir que ela tinha de acabar o copo de vinho, quando ela não queria, pois havia preparado champagne em casa.

Seria uma noite memorável. Tirou folga para ir ao Spa. Por lá, fez de tudo para que o seu lençol novo, de seda, tivesse um efeito deslizante, em sua pele.
Espalhou pétalas de rosa pela casa toda. No corredor, foram pétalas brancas; na casa de banho, dentro e à volta da banheira espalhou pétalas vermelhas e no quarto, pelo chão e por cima do lençol de seda vermelho, espalhou pétalas brancas e rosas. Paz, paixão e amor, era o que desejava para o seu relacionamento conturbado.

É verdade que ela não aguentava com álcool. Quando estivesse bêbada, dava-lhe para dormir, por isso teve muito cuidado no restaurante, limitando-se a um copo. Nunca na vida havia perdido os sentidos até não perceber nem sentir que tivera sido transportada durante a noite, para Chibuto e sem dar conta, tivera sido despida. Ela estava certa de ter sido drogada. Perante esta realização, levantou-se rapidamente da cama e foi dar uma espreitadela à janela. Nada viu senão um galinheiro e alguns patos a andarem de uma lado para o outro.

– Vovó, deixa-me sair, por favor. Já estou bem!
– Eeh, minha filha, Fernando pediu para você tomar água de cacana primeiro. Não sai daqui sem…
– Fernando que vá à merda, vovó! Está onde ele? Vovó não vê que eu estou bem?!!
– Minha filha, não me traz problemas, eu…
– Vovó, eu não estou doente e estou aqui isolada e nua! Que doença tenho eu, de ontem para hoje?

Não é dia 14 hoje? Então?! Tenho a certeza que no dia 13 de Fevereiro, eu estava em Maputo e muito bem!! Agora dá licença, vovó. Dá-me a chave, quero sair! Vou lá dentro, tomar banho e ir embora! Minha carteira está lá dentro, né?

– Filha, não me traz problemas, toma esta água primeiro!
– Essa água é para quê? Para eu morrer de vez? Não, obrigada. Vou ao hospital! A chave, vovó! – ordenou Vanessa, extremamente impaciente, furiosa, a andar de um lado para o outro naquele quarto abafado, minúsculo, com bocados de areia a colarem-lhe os pés suados.

Rendida, a avó Margarida sorriu, levantou-se e deu uma coxeada até à porta. Olhou para Vanessa com um olhar submisso e voltou a sorrir, abanando a cabeça, como quem estivesse a contrariar ordens. Desamarrou sua capulana no extremo esquerdo, tirou do pequeno nó, a chave da porta do quarto e depois extraiu uma segunda chave do seu sutiã, que afirmara ser da casa lá fora.

Vanessa abriu a porta e saiu do isolamento descalça, embrulhada em capulana, em direcção à casa, numa velocidade de jato, tendo sido interrompida por um assobio que lhe era familiar. Quando olhou para o lado, viu Fernando, a sensivelmente 20m, sentado por baixo de uma árvore, numa mesa repleta do que parecia ser pequeno almoço, com pétalas vermelhas espalhadas pelo caminho que Vanessa teria de percorrer até ele e mais um detalhe: assim que Vanessa virou a cara em direcção de onde vinha o assobio, começou a tocar a música: “Isn’t she lovely” de Stevie Wonder. Fernando tinha consigo um pequeno gravador onde tencionava tocar todas as músicas preferidas de Vanessa.

Com as mãos na boca, dando risadinhas sem parar, Vanessa caminhava ao encontro de Fernando, semi-serrando os olhos, para ver o que havia na mesa. De certeza que não tivera sido a avó Margarida a preparar tudo aquilo. Estava com um aspecto de encomenda. Parecia um buffet de hotel.

Fernando fechou os olhos, levantou ligeiramente a cabeça e fez um biquinho com os lábios, em jeito de quem pedisse um beijo. Vanessa aproximou-se dele, deu-lhe um beijo e logo de seguida deu-lhe uma chapada carinhosa e disse:

– Desde quando é que drogar uma pessoa é romântico?
– Desde que o sorriso dessa pessoa seja tão radiante quanto aquele por qual me apaixonei!
– Credo, sou tão rabugenta assim?
– Praticamente…
– Hahaha! E que droga usaste para que me conseguisses violar sem eu me aperceber?
– Não te posso dizer, mas nada que te prejudique a saúde. E pus-te nua apenas para criar mais drama. E então, estou de parabéns?
– Parabéns?!! Que distorção, meu Deus! Tenho muita fome… esta comida não vai chegar. Vou te comer todo, hoje. E pode ser naquele quartinho contaminado, não faz mal. Hihihi.

 

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