O País – A verdade como notícia

Um ano de transformações profundas e metas não atingidas…

Há um ano que a imagem de Maputo não é mais a mesma. Vidas de milhares de pessoas mudaram e Moçambique tornou-se no país com a ponte com maior vão suspenso de África. Mas nem tudo isso ajudou a atingir as metas em termos de número de travessias.

No dia 10 de Novembro de 2018 o mundo assistiu a inauguração da ponte com maior vão suspenso de África. Era a Maputo-KaTembe, com ela, as estradas KaTembe-Ponta de Ouro e Bela Vista Boane, com 178 quilómetros.

Celebrava-se os 131 anos da capital do país, numa festa a duplicar, ou melhor, a triplicar, até porque celebrava-se também o futuro que se esperava risonho. E a esperança foi manifestada pelo Presidente da República Filipe Nyusi, momentos depois do corte da fita e descerramento da lápide.

“A ponte irá permitir a exploração do ecoturismo, o turismo de praia e de lazer. Com a reserva especial de Maputo, as praias da Ponta D´Ouro, Ponta Mamoli, Ponta Malongane e Machungulo a cumprirem o seu papel de desenvolver riquezas através do turismo”, disse Filipe Nyusi.

E os primeiros sinais não tardaram, veio o mundo inteiro para ver e sentir como é andar sobre a Baía de Maputo por via de uma ponte de vão suspenso. Só para se ter uma ideia, nas primeiras 24 horas mais de seis mil viaturas fizeram a travessia.

Entretanto, essa tendência foi mesmo pela curiosidade, até porque a média baixou e pouco tempo depois estabilizou-se. Até 1 de Outubro deste ano, já tinham atravessado a Ponte Maputo-KaTembe 1 100 000 viaturas. Todos os dias passam por lá mais ou menos 3 350 mil carros.

Estes números não são exactamente o que tinha sido projectado para o primeiro ano da majestosa ponte. “No nosso modelo desenvolvido estávamos a prever que no primeiro ano teríamos 1.5 milhão de viaturas, ou seja, vamos fechar o ano com aproximadamente 73 a 75 por cento do que tinha sido desenhado”, revelou  ngelo Macuácua, Presidente do Conselho de Administração do Fundo Nacional de Estradas.

O Fundo explica que isso tem efeitos no que diz respeito à verba que se deve gerir e aplicar na manutenção da obra. “Existem manutenções periódicas e do dia-a-dia. Com o que arrecadámos neste primeiro ano, apenas poderíamos fazer as do dia-a-dia e para as periódicas teríamos um deficit”. Bem, desta vez o défice não se fez sentir, já que, “no primeiro ano as manutenções são da responsabilidade do empreiteiro”.
Em termos de receitas, o Fundo diz que foi arrecadado, nestes primeiros 12 meses, 217 milhões de meticais de receitas. Isto numa situação em que “prevíamos que, no primeiro ano, estivéssemos em torno de cerca de 240 milhões de meticais”, valor que seria necessário para garantir a manutenção da infra-estrutura.

Sobre os preços praticados pelas portagens e que têm vindo a ser motivo de reclamação por, supostamente, serem altos, o Fundo reitera que estão bastante abaixo do que seria necessário. “Se fosse para viabilizar todo o investimento só através da cobrança das portagens, poderíamos cobrar acima de 1000 meticais para viaturas de classe A”.

Para viabilizar ainda mais o projecto e encontrar formas alternativas, o Fundo Nacional de Estradas tenciona erguer um museu e um miradouro da Ponte Maputo-KaTembe. A ideia é que as pessoas possam posicionar-se no miradouro e façam fotografias para imortalizar a sua presença naquela histórica infra-estrutura. Claro, haverá necessidade de pagamento.

AS PROFUNDAS TRANSFORMAÇÕES
Antes da Ponte Maputo-KaTembe, a Transmarítima transportava cerca de 2 705 pessoas por dia através das suas embarcações Bagamoyo, KaMpfumo e Paulo Santos que usavam a Ponte-Cais.

Entretanto, até 18 de Março deste ano, última vez que os ferryboats fizeram-se ao mar, a média diária tinha baixado para 192 pessoas. Nesta situação, a empresa não viu outra opção senão indemnizar os trabalhadores afectos àquele ponto e rescindir contratos com os mesmos.

Entre eles está o senhor Fabião, 64 anos de idade e que é amigo da água há 39 anos. Antes trabalhou no Porto de Maputo, mas os últimos anos foram passados transportando pessoas através das embarcações da Transmarítima. Ficou desempregado em Junho deste ano.

“Chamaram-nos aqui na empresa e disseram para parar com as actividades porque já não temos condições para continuarmos, já que não há mais passageiros nem carros. Os barcos vão parar porque não vemos mais rendimento”, conta o senhor que falava de olhos fixos ao mar, um local que, depois da sua casa, é onde passou mais tempo da sua vida.

Já lá se vão cinco meses sem ouvir o som do motor a roncar a partir da sua cabine de ferryboat, mas o que não consegue evitar são algumas visitas ao mar. “Sempre venho visitar… mesmo ao Porto eu vou visitar, pela saudade”.

Mais e mais transformações. A vida na KaTembe mudou e continua em constante mudança. Há mais estabelecimentos comerciais, há transporte público-rodoviário de e para KaTembe. Aliás, é dele que se socorrem também os que não conseguem pagar pela portagem. Parqueiam seus carros neste espaço e tomam os machimbombos que vão até a Baixa da cidade de Maputo.

Sentado na varanda da sua casa, Fernando Matimbe, 80 anos de idade, é um espectador assíduo das transformações. Com a idade e o problema no pé esquerdo, os movimentos passaram a ser menos frequentes, mas em nenhum deixou de prestar atenção nas mudanças.

Matimbe mora na KaTembe muito antes da existência sequer do Ferryboat. Ele lembra que nos seus tempos de juventude, quando dependia do seu esforço para sustentar-se a si e à sua família, atravessar para Maputo era um verdadeiro luxo e “às vezes não conseguíamos atravessar devido à ventania, os barquinhos não suportavam a fúria do mar”.

Depois veio o Ferryboat e as coisas melhoraram muito… de tal forma que não se vislumbrava mais nada melhor que aquilo. “Depois de muito tempo, disseram que se construir uma ponte e nós não acreditávamos. Mas o tempo passou e os chineses vieram implantar os pilares no mar”, conta.

Com o rosto coberto de barba e a cabeça de cabelos brancos, Matimbe guarda memórias de quando a vida na KaTembe era muito cara.

Entretanto reconhece que agora melhorou muito, até porque já pode comprar tudo num piscar de olhos. “basta tomar o machimbombo”.
Melhorou a vida de Fernando Matimbe, melhorou também a ligação de KaTembe-Ponta de Ouro e Bela Vista Boane com as novas estradas que vieram com a ponte. Estas trouxeram transformações.

Com direito à passagem pela Reserva Especial de Maputo e o vislumbrar dos vários animais, visitar as belas praias da Ponta D´Ouro ficou mais cómodo e rápido.

Além das águas, dos lounges e da gastronomia, a Ponta D´Ouro tem esculturas peculiares. Se antes os turistas sul-africanos eram a maioria neste ponto do país, hoje a realidade pode ter mudado.

Com os seus companheiros a jogar cartas, Benedito Chavane celebra a melhoria dos rendimentos no seu negócio de esculturas. Um facto que o deixa mais feliz é por serem clientes maioritariamente moçambicanos.

“Antes nós tínhamos de produzir a ter em conta as vontades dos sul-africanos, mas agora já trabalhamos com os nossos irmãos de Maputo que antes não pediam chegar aqui à Ponta”, relata o jovem que assegura que até a comunicação ficou mais facilitada.

O céu limpo, o sol escaldante, as águas azuis, tudo numa mistura à moda Ponta D´Ouro, inspiram qualquer um a aqui vir, inclusive para reuniões de trabalho. E por isso a estância Kaya Kweru tem vindo a receber várias reuniões de diferentes instituições, “inclusive de instituições do Estado”.

Partilhe

RELACIONADAS

+ LIDAS

Siga nos