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Sexualidade inconsciente e degradação do desenvolvimento

Por: Bena Filipe

 

Com tristeza, tomei conhecimento de 95 casos de violação sexual, durante a quadra festiva de 2022. Em 2021, a UMAR (União de Mulheres Alternativa Resposta) de Portugal, recebeu a comunicação de 299 casos de violação sexual, perfazendo 25 casos em 1 mês, o que contrasta com os ascendentes do ano seguinte 2022.

Segundo a médica legista A. Neves, no período de Janeiro a Setembro de 2022, receberam 1737 casos, dos quais 76% presenciais e 24% on line. Foram detidas 153 pessoas, mas, possivelmente, 15% das queixas eram falsas para justificar namoricos, conflitos conjugais, onde a mãe acusa o pai, e ou o pai acusa o companheiro da ex-esposa/companheira por conflitos para guarda de paternidade.

Esber (2009) aponta que os violadores são de todas as classes sociais, faixas etárias, grupos étnicos. Estão numa sociedade que legitima a sua condição. Por isso, a mulher é desvalorizada e coisificada. Em muitas partes do mundo, os perpetradores da violação/abuso sexual são do perfil descrito por  Esber (2009), mas, na nossa realidade, temos agentes da lei, frequentemente citados, o que legitima a qualquerização da mulher, bem como a fragilidade da educação familiar/formativa.

Um estudo sobre violência sexual feita em Moçambique, por Britgite Bagnol, e publicado em Fevereiro de 2011, avança variáveis como pagamento de multas e casamento para anular o crime.

Hoje, com a escolarização, acesso à informação e aos serviços, estas notificações podem estar a ascender, não pelo número de casos, mas como aumento da própria notificação. De preocupar, existem casos de violação sexual reportados, em que os autores são menores  e  adolescentes, o que demostra que a sociedade está muito doente.

Em relação aos 60 mil casos de registo de nascimento, sem o nome do pai, predominante no Centro e Norte do país, pude apreciar que, em outros quadrantes, como Brasil, temos as cifras de 100 mil nascidos sem registo do pai, em 2021.

Em Portugal, mais de 5700 exames foram pedidos para confirmar a paternidade. A procura da paternidade no contexto norte-americano e outros países (Alemanha, Reino Unido, Dinamarca, Itália e Espanha), preocupa-se mais com a questão do sustento e bem-estar da criança, do que com direito à identificação pessoal.

No contexto norte-americano, o estado é o motor da busca pela paternidade (Rottisein et al: 2005; Manson, 1997). Nos casos em que a mãe omite a identidade do pai, e não depende dele para o sustento, caber-lhe-á a decisão de querer ou não que o estado identifique o pai biológico (Rothstein et al. 2005).

Em Portugal, independentemente da situação económica da mulher, a averiguação da paternidade é quase obrigatória, enquanto que a obrigatoriedade em outros países decorre de imperativos económicos. Percebe-se que o assunto é complicado, e que as políticas se adequam com a realidade, colocando em primeiro lugar a criança, não o pai ou a mãe e sua guerras ou interesses. Nós sabemos que é bom ter um filho de um pai comprometido, mas que vai pagar as mesadas, uma  vez provado a paternidade. Aqui escuso-me de comentar. Ao invés disso, incentivo as mulheres para irem atrás dos seus direitos.

A partilha desta informação, dos 60 mil casos de registos de nascimentos sem que conste o nome dos pais, é de louvar e elogiar, pois convida-nos a reflectir sobre quantos desses foram para confirmar a paternidade.

O Governo e a sociedade civil, sectores que lidam com esta matéria, devem cada vez mais fazer e cumprir as leis, e respeitar os direitos humanos.

Nos dois contextos, cria-se um espaço muito fértil para aumento de casos de HIV. Podemos assumir que, no acto de violação, ou contacto sexual com gravidez, corre sempre o risco de infecção por HIV, tanto para o agressor ou para a vítima. Ninguém tem cara, aparência de HIV. Todos temos, até prova em contrario.

Aparece agora uma nova faixa etária, que está a destacar-se na violação sexual e nas infecções de HIV. Dependendo das circunstâncias, e as razões, não gosto de as procura entender, porque nem sempre as vítimas são vítimas, o autor deve assumir e pagar pelas suas consequências. Só assim este ciclo de qualquerização vai diminuir, sabendo que a mulher sofre porque não terá um homem do seu lado, a sua criança não terá pai, e terá de cuidar sozinha da criança e enfrentar sozinha as dificuldades económicas. Temos à vista um futuro de risco para ambos, por comportamentos desviados, e um desenvolvimento como sociedade comprometido, por causa de um acto prazeroso que se podia evitar, tomando anticoceptivos e usando preservativo. Ambos sabiam o que estavam a fazer e devem assumir as consequências, salvo em menores de idade e onde temos outros elementos agravantes.

Esses problemas vão entrar nas nossas vidas, directa ou indirectamente, cedo ou tarde. Fugir para lugares mais calmos e regrados e contornar não é a solução. Mas exige-se, urgentemente, atitudes conjuntas e corajosas, independentemente de quem esteja envolvido.

 

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