O Filósofo Severino Ngoenha desafiou as elites políticas, económicas e intelectuais do país a agirem com sabedoria, ao invés de esperteza, bem como a promover transparência nas suas acções públicas. Ngoenha respondia a uma carta de um estudante Moçambicano na Serra Leoa, em que comparava as realidades sócio-económicas e políticas dos países.
O Filósofo e pesquisador Samuel Joina Ngale, que se encontra na Serra Leoa a estudar, desafiou o seu homólogo, o Professor Severino Ngoenha a pensar nos desafios de Moçambique, comparando com a realidade leonesa.
Na sua carta, Ngale diz que os dois países partilham um histórico de guerras civis, motivados por disputa por recursos naturais, altos níveis de corrupção, desemprego e desníveis sociais.
“Nas províncias do Norte, a combinação de tensão religiosa, exclusão econômica e falta de oportunidades levou os jovens a insurreições extremistas (Morier-Genoud, 2020). Orre e Forquilha (2023) observam que esquemas de emprego mal desenhados reforçam as percepções de captura do Estado. Ambos os contextos revelam como os jovens negligenciados podem tornar-se catalisadores da instabilidade social”, lê-se no documento.
O também escritor prevê um Moçambique mais instável, se nada for feito.
“Moçambique encontra-se numa encruzilhada. Se a corrupção, a desigualdade e a exclusão juvenil persistirem, o conflito pode se espalhar. No entanto, aprendendo com a experiência da Serra Leoa – tanto o seu colapso como a sua recuperação – Moçambique ainda pode evitar o desastre através da transparência, inclusão e renovação institucional”.
Severino Ngoenha reagiu aos escritos, como se a concordar com cada linha de pensamento de Ngale, no que considerou um espelho lúcido para Moçambique.
“Quero dizer com toda a clareza: o povo falou entre outubro e março. E falou de pobreza e desigualdade, mas também de uma humilhação silenciosa – a de ver o país crescer sem si. Se fecharmos os ouvidos, se reduzirmos a sua dor à agitação de [grupos], se nos refugiarmos em tecnicalidades procedimentais, repetiremos a trajectória que arrastou Serra Leoa ao desastre. Com um agravante: a guerra em Cabo Delgado expõe uma linha de fratura que, se negligenciada, pode fragmentar a comunidade política que com tanto custo edificámos”.
Para uma nova realidade, o Professor Ngoenha deixou desafios, primeiro para o que chamou de Elites.
“...peço às elites políticas, económicas e intelectuais um compromisso inequívoco: trocar espertezas de curto prazo por sabedoria de longo prazo; substituir a retórica da vitória por pedagogia de pactos; aceitar a auditoria pública das nossas práticas e instituir mecanismos de transparência forte (contratos abertos, fiscalização parlamentar efectiva, protecção de denunciantes, cortes reais nos privilégios de captura). Sem partilha, não há coesão; sem coesão, não há Moçambique.”
E depois desafiou a juventude a ser sujeito Político.
“…peço o cidadão novo: formado na escola da responsabilidade, capaz de ligar liberdade a dever, criatividade a serviço. Que as universidades, os ateliês de filosofia, os centros cívicos e as comunidades religiosas sejam oficinas de prevenção: lugares onde a crítica se transforma em projeto e o protesto em proposta”.
Severino Ngoenha termina a carta advertindo para que as audições públicas em curso não sejam manobra, nem encenação para ganhar tempo, mas caminhos para a paz efectiva.