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SED e FMF “alinhadas” na “polémica” desistência dos “Sub-23” e “Sub-17” de provas internacionais

Foto: O País

O presidente da Federação Moçambicana de Futebol, Feizal Sidat, confirma que as selecções de Sub-23 e Sub-17 não vão competir nas provas internacionais por falta de fundos. A justificação foi secundada pelo secretário de Estado de Desporto, Gilberto Mendes, que diz não haver fundos também no organismo que dirige.

Em comunicado publicado quinta-feira última no seu site e plataformas digitais, a Federação Moçambicana de Futebol, numa decisão que fez levantar muita poeira e alimenta calorosos debates no meio desportivo, anunciou que as selecções nacionais de Sub-23 e Sub-17 não vão disputar as competições africanas de qualificação aos Jogos Olímpicos e aos Jogos da AUSC-R5, devido a problemas financeiros.

Dias depois, em entrevista à Rádio Moçambique, o presidente da Federação Moçambicana de Futebol, Feizal Sidat, reiterou que os combinados nacionais das categorias Sub-23 e Sub-17 não vão mesmo competir em provas internacionais.

Sidat, que num passado recente esteve alinhado com o seleccionador nacional, Chiquinho Conde, no processo de dimensionamento das selecções de formação e esteve sempre na linha da frente na conquista do Torneio COSAFA em 2020, diz que que comunicou com antecedência a desistência do país das provas que iriam envolver as selecções Sub-23 e Sub-17.

“A Federação Moçambicana de Futebol tem exiguidade de fundos. Os custos para ir às Maurícias estão na casa dos USD 60 mil. Os custos para ir ao Gana estão na ordem dos UDS 90 mil. Nós endereçámos a nossa desistência com antecedência à CAF”, garantiu Feizal Sidat, que se contradiz, depois, quanto ao futuro da selecção Sub-17. Ou melhor, anunciou a desistência, mas depois diz que a Secretaria de Estado de Desporto, dirigida pelo seu “amigo” Gilberto Mendes, tem uma palavra a dizer quanto à participação do combinado nacional Sub-17 nos Jogos da AUSC.

“Quanto à selecção Sub-17, devo dizer que ainda não houve desistência. Estamos a articular com a Secretaria de Estado de Desporto. Os Jogos da AUSC estão sob alçada do Governo.”

Alinhada com a Federação Moçambicana de Futebol, com quem articulou e deu luz verde para se pagar 1 207 386,25 Meticais (um milhão, duzentos e sete mil, trezentos e oitenta e seis Meticais e 25 cêntimos) para os Mambas jogassem no FNB Stadium (Soccer City) diante do Ruanda, em jogo da 1ª jornada do grupo L de acesso ao CAN-2023, a Secretaria de Estado de Desporto reconhece, agora, haver exiguidade de fundos para viabilizar a movimentação das selecções Sub-23 e Sub-17.

Gilberto Mendes, que falava à margem do Conselho Coordenador da Secretaria de Estado de Desporto, em Vilankulo, Inhambane, disse que a notícia “caiu que nem uma bomba, mas temos que perceber as explicações que nos são dadas, porque sempre tivemos o desporto de formação como prioridade, pelo que era de todo interesse que marcássemos presença nessas provas”.

Os representantes de África nos Jogos Olímpicos de Paris 2024, a nível do futebol, serão encontrados no CAN Sub-23. E estar no maior evento desportivo do planeta é motivo de orgulho. Regalo. E a verdade manda dizer que países com projectos desportivos sérios apostam nas selecções de formação para projectar o futuro. O que não acontece com Moçambique!

Ainda assim, O secretário de Estado de Desporto entende que “não se pode tapar o sol com a peneira!” para a realidade. Daí que, argumenta Gilberto Mendes, “é preciso não fecharmos os olhos à realidade, a FMF tem muitas frentes, visto que tem a equipa principal, a qualificação ao CHAN, a equipa Sub-23, o futebol feminino que deve ir às Maurícias, Gana e eSwatini e tudo isto necessita de dinheiro, pelo que é preciso encontrar outras frentes para custear estas operações”.

Recorrer, uma vez mais, ao Estado para custear as despesas de participação das selecções nacionais pode ser o caminho, num mundo em que o futebol se transformou numa indústria e cada vez menos dependente da intervenção dos governos na injecção de dinheiro? Eis a questão que não quis calar!

“Muitas das deslocações da equipa principal têm sido custeadas pelo Governo, mas é preciso perceber que a SED não tem apenas a responsabilidade de arcar com as despesas das equipas de futebol. Há outras selecções nacionais que precisam do apoio da SED e não há dinheiro suficiente para todos. Todo mundo atravessa uma crise e temos que saber racionalizar os meios e os esforços; é um bocado disto que a FMF tem estado a fazer”, argumentou o SED.

Mesmo com a redução drástica dos valores alocados às federações desportivas nacionais, no quadro dos contratos-programa anualmente assinados entre as mesmas e o Fundo de Promoção Desportiva, a Secretaria de Estado de Desporto reclama um papel fundamental na viabilização da movimentação de quase todas modalidades em provas internacionais.

“Nós temos um contrato-programa com as FMF e com todas as federações; é preciso ficar claro que a maior parte das deslocações ao exterior das selecções nacionais é suportada pelo Governo, desde o futebol, passando pelo voleibol, basquetebol, boxe; não há dinheiro que está a sair do bolso dos presidentes ou de outras instituições, e os contratos-programas estão largamente estourados e só podemos trabalhar com o que está programado, claro que, por vezes, há situações que as selecções se qualificam de uma fase para outra, mas essa é a dinâmica do desporto, pelo que temos que nos reinventar todos dias”, recordou Mendes.

 

ENQUANTO HOUVER VIDA…HÁ ESPERANÇA

O secretário de Estado de Desporto deu a entender que poderá haver uma luz no fundo do túnel para viabilizar a participação da selecção Sub-17 nos Jogos da AUSC-R5, porquanto, diga-se, este evento tem uma componente política ao nível da região.

“A FMF disse que não tem capacidade financeira para custear essas despesas, de facto não há dinheiro, os jogos são agora em Novembro e temos que ter uma delegação que deve ser bem composta, também temos que olhar para a nossa capacidade financeira e esperança de resultados positivos, pelo que estamos a perguntar à Federação se para indo aos Jogos da AUSC  para além da rodagem aos miúdos existe ali esperança de algumas vitórias. Para nós, era interessante que todos participássemos, haverá razões que a FMF evoca, pela forma como tenho estado a lidar com o desporto, não atiro a toalha ao chão antes de esgotar todas as hipóteses e possibilidades. Aquela  foi a posição da Federação, no entanto, se conseguirmos fintar o destino, acredito que ainda possa haver alguma reviravolta de encontrarmos financiamento para a deslocação da selecção Sub-17”, disse o secretário de Estado de Desporto.

 

EX-MAMBAS E JORNALISTAS CRITICAM DECISÃO DA FMF

O ex-capitão da selecção nacional de futebol, Tico-Tico, diz não fazer sentido que as camadas de formação não compitam em provas internacionais, que podem conferir maior traquejo aos jogadores e assim funcionarem como o espelho para a renovação dos Mambas.

“Caiu que nem uma bomba. As pessoas estão todas surpresas. Como é que isto é possível”, questionou a lenda do futebol moçambicano.

Tico-Tico, que contabiliza 94 jogos pela selecção nacional de futebol, recorde superado por Dominguez no duelo contra o Níger, diz que este cenário não ajuda nem tão pouco o futebol moçambicano, no geral, e Mambas, em particular.

“Quando pensamos que está tudo bem vem esta situação. É este vaivém que, em algum momento, mancha o futebol moçambicano”, chamou atenção Tico-Tico, que foi nomeado embaixador do Torneio COSAFA na sua edição de 2018.

Por sua vez, o também ex-internacional moçambicano, Tomás Inguana, critica a decisão dos gestores do futebol moçambicano. “Era preciso que a direcção da Federação Moçambicana de Futebol encontrasse soluções, portanto não esgotar. Portanto, era preciso ir atrás, até porque temos várias empesas”, disse Tomás Inguana, antigo jogador do Desportivo Maputo, Ferroviário de Maputo e Orlando Pirates, este último histórico do futebol sul-africano.

Para o jornalista e presidente da Associação Moçambicana de Imprensa Desportiva (AMIDE), Adão Matimbe, os argumentos apresentados pela Federação Moçambicana de Futebol para a desistência dos Sub-17 e Sub-23 não fazem sentido. E explica, Matimbe, num processo tão básico quanto determinante para o sucesso de qualquer actividade:  “Planificação é igual à orçamentação de actividades. Então, estas actividades foram planificadas e até serviam de bandeira do actual presidente da Federação Moçambicana de Futebol que deviam vir acompanhadas de alguma orçamentação”, disse Adão Matimbe, para depois sentenciar: “É um argumento falacioso. Os jogadores do Moçambola, muitos deles que vão às selecções nacionais, são atletas que estão acima da faixa dos 23 anos. São jogadores que têm mais do que essa idade”.

Alinhando pelo mesmo diapasão, o jornalista Óscar Paul refere que “devia estar tudo orçamentado” porque, em boa verdade, “não é no próprio dia que se descobre que não há dinheiro. No início do ano, é aprovado um orçamento e, no dia do sorteio, é anunciada a desistência”.

Segundo Óscar Paul, “se havia orçamento que foi aprovado, tem que ser executado. Se não havia dinheiro, já se devia ter comunicado há muito tempo”.

Quem também questiona a decisão da Federação Moçambicana de Futebol (FMF) é o jornalista Henrique Aly. “Tudo isto acontece depois de virmos de período de cerca de dois anos, por causa da pandemia, e que não houve competição nos níveis base. É mau. É mau porque passamos uma imagem, infelizmente, de um país que não tem uma orientação de base para aquilo que quer fazer com a sua formação”.

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