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“Os oito maridos de dona Luíza Michaela da Cruz” já estão na Alemanha

O escritor, poeta e artista plástico, Adelino Timóteo, apresentou a obra “Os oito maridos de dona Luíza Michaela da Cruz”, em mais uma cidade europeia. Desta vez, foi Berlim, Alemanha, e o evento aconteceu quinta-feira passada, informa o órgão DW, realçando que, com o romance histórico, o autor pretende registar o poder da mulher no período colonial.

O lançamento aconteceu na Embaixada do Brasil, em Berlim, durante o evento “Convergência e Divergência: A CPLP como Espaço de Cultura e Economia e sua Percepção na Europa”, organizado pela Sociedade Alemã para os Países Africanos de Língua Portuguesa (DASP), em que foram realizadas diversas palestras sobre temas moçambicanos, de acordo co, DW.

O livro “Os oito maridos de dona Luíza Michaela da Cruz” de Adelino Timóteo é um romance histórico com notas de ficção e conta um pouco sobre a vida de Dona Luíza Michaela da Cruz, dona de um prazo, (nome dado às terras arrendadas pela coroa portuguesa em Moçambique), na província da Zambézia – no período colonial.

“Este romance procura fazer uma radiografia sobre esses territórios e, ao mesmo tempo, demarcar o poder que essa senhora tinha naquela altura e elucidar sobre até que ponto esse poder influía sobre os seus súbditos e a relação dela com um poder, digamos, hierarquicamente superior. Porque extravasava. Ela acabava tendo mais poderes do que a coroa [em Portugal],” disse Timóteo, falando sobre o livro lançado há dias na Alemanha.

Adelino Timóteo conta que escolheu dona Luíza para personagem central de seu romance porque “não se fala dela em Moçambique, praticamente não se fala – embora esteja na história”.

O autor quis, assim, cita DW, “chamar a atenção sobre uma pessoa que durante uma certa época de vida em Moçambique já tinha um certo dom, digamos, varonil. Era uma mulher que tinha uma atitude social mais empenhada, diferente, muito avançada para a época. Tinha uma atitude guerreira, era uma senhora de armas, dirigia combates e enfrentava os homens como se fossem seres, às vezes, inferiores”.
Poder e ambiguidades

Para garantir sua influência e seu poder, dona Luíza não poupava esforços. “Quem não fosse de acordo com a perspectiva dela, ela podia mandar matar. Ela tinha uma lagoa de crocodilos. Ela tinha homens, ordenava, e lançavam-no à lagoa de crocodilos”, acrescentou o escritor.
Adelino Timóteo diz que, nas suas pesquisas, leu sobre quatro maridos. Mas explica como chegou ao título “Os oito maridos de dona Luíza Michaela da Cruz”. “A imagem que ela tinha que fazia com que Portugal impusesse que o marido dela tinha de ser um português. Não podia ser um negro. Mas, ao mesmo tempo, ela fica grávida de um negro. Quer dizer, há uma ambiguidade não só de poder, há uma ambiguidade de normas que, na prática, são violadas”, avalia.

Outra personagem histórica a quem o escritor dá nova vida neste livro é o missionário e explorador britânico David Livingstone, que foi ao Vale do Zambeze para evangelizar e combater o tráfico de escravos no século XIX. Na obra, o personagem assume o papel de narrador. “O Livingstone era bastante crítico à escravatura e visitou o prazo de Guengue e, ao mesmo tempo, fez uma reportagem manifestando o seu desagrado sobre a escravatura naquela altura,” relata. “Eu aproveito essa situação, na qualidade do moralista que ele era, para aquela altura. Certamente, eu imagino, na pele dele, um indivíduo que viveu naquela altura e que vai contar a história como quem testemunhou as situações todas em Guengue,” diz o autor.

Ao recuperar a história de dona Luíza Michaela da Cruz, o escritor moçambicano pretende também levantar debates, conforme disse ao DW: “Hoje fala-se de feminismo. E o feminismo, muitas vezes, quando se aborda, é visto como algo que sai do ocidente e se expande pelo mundo. A minha ideia é mostrar que em diversas partes do mundo, em épocas diferentes, houve mulheres que tiveram poder e são independentes dessa gênese do tal feminismo que se diz,” avalia Adelino Timóteo.

Para o autor, o lançamento do livro em Berlim é o ponto alto da sua divulgação fora do espaço de língua portuguesa. “É o momento alto, na medida em que vou interagir com um público diferente, mas falante de língua portuguesa. Isso alarga um bocadinho aquela dimensão que nós temos quando criamos. Estamos a pensar num espaço geográfico e esse espaço vai se alargando,” considerou.

Agora, Adelino Timóteo, de acordo com DW, espera que haja interesse em traduzir-se o seu livro para outras línguas e, assim, dar asas, como diz, à sua publicação.

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