Quando minha mãe engravidou de mim, meu pai pediu-a para fazer um aborto. Ele não queria mais ter filhos, pois já era pai de duas meninas, e a probabilidade de ter uma terceira era maior. No entanto, minha mãe decidiu forçar e levar adiante a gestação, e assim nasci, uma menina. Meu pai esqueceu-se de sua posição anterior e celebrou o meu nascimento, orgulhoso por ser pai das “três irmãs”.
Na infância, eu era a melhor amiga do meu pai dentre as minhas irmãs, e ele o meu melhor amigo. Adorava ir ao futebol com ele e ficar sem camisa na varanda, mimetizando sua atitude. Sinto saudades do meu pai. Infelizmente, ele partiu, levando consigo o meu melhor amigo. No entanto, antes de partir, em seu estado de coma no hospital, ele ainda encontrou uma maneira de fazer-me chegar o que estava em seu coração. Na madrugada em que ele partiu, tive um sonho com ele, onde ele me disse: “Minha filha, estuda, a vida está difícil”, e mais nada disse. Ao acordar, tivemos a triste notícia de sua partida. Que descanse em paz!
Cresci e tornei-me mulher. Casei-me e, em determinado momento, fiquei grávida. Meu esposo estava eufórico pois seria pai pela primeira vez, e a expectativa dele era ter um menino. Isso criou em mim uma pressão psicológica e uma vontade de satisfazê-lo. Quando fiz a minha primeira ecografia para saber o sexo, a médica disse-me que parecia uma menina, mas não tinha certeza; que teríamos que esperar pela próxima ecografia. Após algum tempo, tivemos a certeza de que realmente carregava uma menina no meu ventre. Fiquei feliz, pois disse a mim mesma que teria uma “mini-eu”. Meu esposo, depois que ela nasceu, amou-a, talvez até mais do que eu, e continua a amá-la cada vez mais nos dias de hoje.
Com a minha própria experiência e outras que tenho acompanhado, percebi que na minha sociedade, ter um filho do sexo masculino é o que tem mais peso e mérito. Isso suscitou em mim a seguinte questão: até que ponto a sociedade moçambicana contribui para a discriminação e desigualdade de gênero?
A discriminação e desigualdade de gênero são questões profundamente enraizadas em muitas sociedades ao redor do mundo, incluindo a moçambicana. É vital que questionemos e desafiamos as normas estabelecidas, promovendo uma mentalidade mais igualitária, onde todos os filhos sejam valorizados e amados independentemente do sexo. A educação e a conscientização desempenham papéis fundamentais na mudança dessas percepções e na criação de uma sociedade mais justa e equitativa para todos.
Em certos pontos do meu país moçambique, muitas mulheres perdem seus lares por não poder conceber e em casos piores pelo facto de não conseguirem ter filhos do sexo masculino, são desprezadas e não tem valor nestas mesmas sociedades.
As dificuldades que as mulheres enfrentam em Moçambique devido à pressão para conceberem e terem filhos do sexo masculino são profundamente perturbadoras e refletem normas culturais arraigadas que perpetuam a desigualdade de gênero. É fundamental aumentar a conscientização sobre essas questões e promover a mudança nas atitudes sociais para garantir que todas as mulheres sejam valorizadas independentemente de sua capacidade reprodutiva.
Para combater esse tipo de discriminação e exclusão, é necessário um esforço coletivo que envolva a sensibilização pública, a promoção da igualdade de gênero e o fortalecimento das leis e políticas que protegem os direitos das mulheres. Além disso, é crucial oferecer apoio e recursos às mulheres que enfrentam essas dificuldades, garantindo que elas tenham acesso a cuidados de saúde adequados e apoio emocional.
Essa é uma questão profundamente enraizada na sociedade, mas com um esforço contínuo e a promoção de valores que valorizem todas as pessoas independentemente do sexo, é possível trabalhar para uma sociedade mais justa e inclusiva em Moçambique.