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O caminho ainda é longo, senhor presidente

Saiu de uma campanha pouco expressiva, tímida e atípica para o partido do batuque e maçaroca, uma campanha voltada para uma comunicação em quatro paredes, forçada pela rejeição coral das massas, que à luz do sol não escondiam o seu desprezo e apatia pelo partido que sempre governou, mas agora com a percepção de baixa satisfação.

Na capital, foi mesmo assim. A caça ao voto não foi tarefa fácil para o candidato da Frelimo. Rasaque Manhique não encantou à primeira vista. O povo, saturado de falsas promessas, vociferou impropérios e deu costas sem aceitar ouvir a cantada política, fez pré-juízos e seguiu às cegas comprando outros discursos sem certificados de veracidade. Mas isso não importava.

Foi uma prova dos nove reprovada e ofuscada pela acidez da oposição, que maquiavelicamente plantava a semente do ódio em terra fértil, mas que ironicamente não colheu vitória, colheu tempestade num poço com profundidade infinita.

Hoje, como uma fénix ressurgida dos escombros do processo eleitoral, temos, de facto, a oportunidade de conhecer o presidente do Município de Maputo. Aquele que, no silêncio da campanha, não se agitou nas ruas, mas construiu um projecto que agora se faz visível, em termos de ideias, e vai à avaliação popular.
Entrou forte, cheio de moral, de peito aberto, de cabeça firme e erguida, fito num propósito que ainda ansiamos por conhecer. Dominamos as intenções verbais, mas navegamos ainda na fina luz da verdade, essa que apenas o tempo nos vai revelar no compasso do relógio que não vai parar. O tempo será o seu árbitro, num jogo sem prolongamentos, e o cronómetro, um juiz rígido, aguardando o fim do mandato para proferir a sentença.

Na audácia das promessas de Rasaque Manhique, ouvimos: “Não sejamos, nós, esbanjadores do erário público”, aplaudimos e depois ouvimos: “Não faz sentido que ocorram construções de forma desordenada na Cidade de Maputo. Não faz sentido demolir. Onde estávamos quando foram edificadas?”, aplaudimos com mais energia e continuámos atentos e ouvimos: “Não é elegante ver disputas entre a polícia municipal e a população (…). Não é para fomentar o informalismo, mas não é para actuar sem dó. Não é bonito a polícia municipal arrancar água de coco. Este edifício (Conselho Municipal) não bebe água de coco, temos de disciplinar…”, colocámo-nos de pé e aplaudimos bem mais alto e mais promessas ouvimos: “Empolar valores na facturas de obras, ou qualquer outro serviço, não tem outro nome senão roubo. Ao tomar conhecimento, vamos imediatamente anular os contratos (…)”. Com o subir de tom, sentimos que era hora de frear a emoção e trazer a razão ao de cima. Mas ainda estamos sob o efeito analgésico dos discursos até agora consumidos.

E Rasaque Manhique não pára, soma e segue coleccionando sonhos no imaginário colectivo. Entrou como um exímio conhecedor dos problemas e ancorou-se em discursos melosos que confundem resultados com uma versão ebriamente aumentada da sensação de acção. Vale-se da retórica para estes ganhos iniciais. Suas promessas adubam expectativas e elevam a ameaça de sincronização com os resultados projectados. O caminho ainda é longo, sr. presidente.

Nosso cérebro, esta máquina de construção de significados baseada na experiência, chama-nos para sermos pessimistas, porque é insano ignorar o conhecimento produzido pelo registo do tempo que passou. Mas porque o conhecimento não é estático – ele renova-se constantemente e reformula-se –, acreditar que pode ser diferente ajuda a contribuir para que os bons resultados venham. Pregar desgraça para o irremediável também seria insano. Mas registar as promessas, observar as acções e deixá-lo trabalhar é o mais sensato.

Os dias vão passar e os resultados serão conhecidos, sejam eles positivos ou negativos. Com a sabedoria do tempo, a verdade não será enviesada nem nos chegará estilhaçada ou desfocada. Será cristalina e estará pronta para que, com os óculos de cada munícipe, se formule a verdade individual conveniente, aquela cuja discussão é de total estupidez, até porque o voto resulta da percepção individual de capacidade de realização.

O caminho ainda é longo, senhor presidente.

 

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