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Como eu vivi o 7 de Setembro

“Fujam camaradas!” – com este grito Areosa Pena, então jornalista do Notícias avisava os colegas das oficinas para um perigo eminente. Qual?

Estava-se a 7 de Setembro de 1974, seis meses após o golpe de Estado em Portugal. As movimentações entre a Frelimo e os capitães de Abril em Lusaka encontravam-se no auge. Porém, em Maputo, o grupo denominado “FICO” tinha tomado a Rádio Moçambique e o alvo a seguir era o Notícias. Os nossos cidadãos, liderados pelos democratas, haviam mobilizado os maputenses para uma greve geral, com concentração num Estádio da Machava, cheio como um ovo, com toda a gente entoado hinos do partido libertador.

Arruaça

Na altura eu era compositor mecânico – operador na máquina linotype – e não tinha bem a dimensão do que se estava a passar. Fugir de quem, de quê e porquê? A quem beneficiaria a tomada do matutino? Aos FICO ou à FRELIMO?

Pelas traseiras, com os restantes colegas, “pernas para que vos quero”, descemos as escadas, duas a duas.

O que se passava então cá fora, diante da sede do jornal?

Um considerável grupo de reaccionários à possibilidade da Independência de Moçambique, vociferava impropérios, colava cartazes e cuspia sobre fotografias do Presidente Samora Machel, atirando pedras que destruíam os vidros da fachada principal da empresa, ao mesmo tempo que colocavam de rodas para o ar todas as viaturas com o timbre Notícias. Um dos maiores pandemónios que presenciei na minha vida.

Eu e outros colegas optamos por recolher às nossas casas, tendo a edição do dia sido concluída por jornalistas e gráficos identificados com os revoltosos.

Fogo na rotativa

Retomada a “normalidade”, regressamos ao trabalho. Porém, dias depois…

A edição estava praticamente pronta para avançar para a máquina de impressão, uma rotativa de 4 corpos, quando um grupo de mascarados invadiu as instalações do Notícias. Dois dos invasores apontando uma pistola, controlavam o aterrorizado porteiro, enquanto os restantes despejavam combustível na rotativa, ateando fogo, para em seguida se porem em fuga. Bombeiros, apoiados pelos operários, com muito trabalho, acabaram debelando as chamas.

Como agora manter a tradição de fazer o jornal chegar às mãos dos leitores, honra e glória daquele matutino?

Técnicos da empresa e operários da Electricidade equacionaram o assunto. A máquina, na plenitude, operava com quatro corpos. Felizmente para nós, apenas dois haviam sido afectados. As outras unidades, com pequenos arranjos iriam funcionar.

Moral da história: num acto que considero de heroicidade por uma causa pública – imprimir, dobrar, entrecalar – o matutino acabou saindo, embora com o dobro do trabalho.

O país vivia então sedento de novidades, a pátria nascia e o tempo era de auto-estima que ficou demonstrada naquela militância… no verdadeiro sentido!

 

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