O País – A verdade como notícia

DAS ELEIÇÕES AO OLHAR UNIDIMENSIONAL DE JOSEPH HANLON

Moçambique vive um momento de grande disputa política e torna-se por essa via um campo fértil ao debate, com análises do processo eleitoral marcadas por olhares abertos de diversos ângulos. Dessas análises, atraiu a minha atenção à do investigador Joseph Hanlon. Fazendo fé ao que pude ler publicado na imprensa, sobre a sua visão do processo eleitoral em curso no País, saliento o facto de este renomado cientista social considerar que estas "foram as piores eleições de sempre de Moçambique". Julguei bastante interessante esta conclusão e assim fiquei impelido a tentar compreender o sustentáculo da sua constatação.  

Joseph Hanlon sustenta a ideia de que estas foram as piores eleições de sempre de Moçambique, realçando aspectos como: i) o facto de  em algumas mesas de voto ter havido observadores que foram obrigados a ficar de pé e, noutras, expulsos, porque, alegadamente, tinham o carimbo errado na credencial; ii) os agentes dos partidos políticos foram impedidos de entrar em assembleias de voto; iii) ocorrência de violência como elemento de pressão sobre os partidos da oposição, ainda impedidos de falar e, por último, iv) houve atraso no financiamento.

Ao ler essas considerações, um aspecto não passou despercebido em mim, o facto de o académico estar marcado por um olhar unidimensional, analisando somente por um ângulo, um processo que envolve diferentes actores e realidades.

Quero afirmar que faço qualquer análise política com a visão que tenho de uma reacção química, onde colocamos, por exemplo, no mesmo tubo de ensaio os reagentes necessários  para obter um ou vários produtos desejados, em perfeito equilíbrio de fases.  Portanto, a avaliação de Joseph Hanlon está ferida de privação desse equilíbrio, não sendo para mim nenhuma análise, mas um mero exercício de manipulação, pois não avalia todos os termos da “equação eleitoral.”

Das constatações de Hanlon, busco a afirmação de que “nalgumas mesas de voto ter havido observadores obrigados a ficar de pé e noutras expulsos, porque, alegadamente, tinham o carimbo errado na credencial.” Ora, pessoalmente, não encontro motivo para um observador não fazer a observação pelo simples facto de não estar sentado, além de que este, por vezes, se faz um elemento circulante. Honestamente, não deixei de rir-me ao pensar que, possivelmente, o académico tenha-se enganado, não querendo reclamar a falta de assentos, mas sim a não distribuição de óculos aos observadores, o que seria uma inovação no rol de recomendações dos observadores. Por outro lado, refere que noutras mesas de voto, “observadores” foram expulsos, porque, alegadamente, tinham o carimbo errado na credencial.” Aqui levanta um aspecto bastante sério, a expulsão. Todavia, essa expulsão é porque tinham na credencial o carimbo errado, ficando a ideia dúbia de que cada observador por si, carimbara a credencial ou alguém da CNE trocara a estampa do carimbo. Dizer “carimbo errado” sabe-me ainda a eufemismo, pelo qual Joseph Hanlon foge da possibilidade de admitir a ideia de um carimbo falso.  “Carimbo errado” purifica o portador dessa credencial, com que base?
Segundo, ao afirmar que “também os agentes dos partidos políticos foram impedidos de entrar em assembleias de voto”, isso é bastante grave, os agentes dos partidos políticos têm o direito de entrar e, aí, ao académico faço justiça. Mas,  não é exagero dizer que os agentes dos partidos políticos foram impedidos? Pois fica aqui, para quem lê, por exemplo, de fora do País, a ideia de que todos os agentes não entraram, visto que  “os agentes” abarca todo o universo de agentes. Será um lapso de articulação ou uma cuidadosa e intencionada hipérbole?

Ainda seguindo o olhar unidimensional do académico, ao dizer simplesmente que “houve atraso no financiamento” torna impolutos os partidos da oposição, nas consequências desse facto. No meu entendimento, quem recebe tarde os fundos para a campanha eleitoral procuraria rentabilizar o tempo que lhe sobrava, não viajaria para Europa, com direito a passeio aos campos de renomados clubes de futebol para sessões de fotografias. Custava ao académico dizer que houve atraso no financiamento, sim, mas, por outro lado, analisar a utilização imediata do valor concedido e daí chegar à conclusão de como esse elemento pesaria para estas serem as melhores ou piores eleições de sempre de Moçambique. Quanto a mim, essa afirmação é falaciosa, pois equiparo-a a dois quilos de batata aferidos numa balança de pratos sem um peso-padrão.

Ainda na sua abordagem, o renomado pensador,  Joseph Hanlon, avança que "tivemos três mil observadores da sociedade civil independentes que não conseguiram credenciais para observar as eleições” voltando a pecar pela leitura de olhar estreito, não olha o incremento do número de observadores credenciados para as eleições do dia 15. Dos dados avançados pela mídia, contra os dez mil do anterior escrutínio, quarenta mil observadores se fizeram ao terreno, e, trocando isto em percentagem, estamos a falar de um ascendente de 400 porcento. Pouco ou muito, depende do olhar e interesse particular de cada um.

Desses quarenta mil, Joseph Hanlon lembra que “tivemos milhares de observadores de grupos alinhados à FRELIMO, dos quais nunca ninguém tinha ouvido falar, e eles conseguiram credenciais". Penso aqui que o cientista social devia apontar alguns, ou trazer mínimos indicadores, sob risco de pensarmos, por exemplo, na União Europeia (UE), no Parlamento Europeu, Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), no Instituto Eleitoral para a Democracia Sustentável em África, na Commonwealth e na Organização Internacional da Francofonia,  como alinhados da Frelimo ao considerarem “que as eleições decorreram de forma ordeira e pacífica”, um debate que por ora adio quaisquer comentários. Mas, algo me arrisco a afirmar, fundado nas declarações de Joseph Hanlon, ainda não há bases para afirmar-se que estas “foram as piores eleições de sempre de Moçambique.”

 

 

Partilhe

RELACIONADAS

+ LIDAS

Siga nos