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Katembe: A cidade do futuro…

No passado, a cidade de Maputo e Katembe eram duas terras divididas pelas águas do mar, mas hoje são dois horizontes ligados por uma grande infra-estrutura:  A ponte Maputo-Katembe.

Trata-se de uma evolução que abre espaço para uma nova era no Distrito Municipal da Katembe, mas, divide opiniões entre os nativos e as autoridades.

O histórico cronológico revela que, no ano 2012, o então presidente da República, Armando Guebuza procedia ao lançamento da primeira pedra de construção da Ponte. Paralelamente, naquela altura, foi criado o Plano Geral de Urbanização do Distrito Municipal da Katembe, que em Junho de 2015 foi decretado como uma Lei. Dois anos depois do lançamento da primeira pedra o projecto saiu do papel

E hoje é uma realidade: Uma das maiores pontes de tabuleiro suspenso em África e no mundo. São estas nomeclaturas que dão dimensão internacional à infraestrutura.

O ritmo frenético dos tripulantes do ferryboat, que junta Katembe e a cidade de Maputo, caracteriza diariamente a ponte caes. Pessoas, mercadorias e viaturas, dependem unicamente do via marítima para atravessar a baia de Maputo. É uma realidade visível todos os dias aos olhos da gigante ponte em fase final de construção.

O distrito Municipal da Katembe tem, actualmente, cerca de 25 mil habitantes. As previsões do Instituto Nacional de Estatística de Moçambique (INE) e do Banco Mundial apontam para um crescimento demográfico  na área metropolitana de Maputo, duplicando  os actuais valores dentro de 20 a 30 anos.

Perante a dificuldade de expansão de Maputo para Norte, onde a cidade já está muito condicionada e caracterizada pela urbanização não planeada, perpectiva-se um grave problema social, a que KaTembe dá resposta positiva, através de um potencial urbanístico a Sul de Maputo. Graças a um plano projectado a 30 anos, a cidade nova da KaTembe estará devidamente preparada para acolher 400 mil habitantes.

O Plano de Urbanização compreenderá diversas áreas de actividades: a área de comércio e serviços representa 20,3% das áreas de construção por actividade., 58% estão destinados à habitação e os restantes estão destinados a indústria e logística (11%), equipamentos e colectivos (6,1%), e 3,1% da área está destinado ao turismo. O plano tem um total de treze áreas com actividades mistas, segundo mostra o gráfico.

Tiago Mendoça é engenheiro civíl e é o Director técnico da empresa responsável pela elaboração Plano Geral de Urbanização da Katembe. O engenheiro prevê que com a abertura da ponte haverá um crescimento acelerado da população, mas há grandes desafios socioeconómicos.

‘’O desafio sócio-económico é que temos uma oportunidade única em África de fazer um novo centro urbano. Com a densidade populacional da Katembe a possibilidade de se construir uma nova cidade é mais facilitada, porém é preciso que haja seriedade’’, disse.

Katembe conta hoje com algumas vias de acesso asfaltadas, infraestruturas em construção entre outros sinais que apontam para uma cidade do futuro. Mas há ainda muitos desafios: com a abertura da ponte a necessidade de mais vias de acesso melhoradas poderá aumentar.

As vias de acesso contradizem a grandeza arquitetónica da infraestrutura da Ponte, porque Katembe tem problemas de estrada e um sistema de transporte que depende maioritariamente de carrinhas de caixa de aberta.

Tudo que vier do Plano Geral de Urbanização da Katembe terá impacto sobre todos moradores deste distrito municipal e para todos aqueles que por aqui passam.  Quem assim garante é  este operador turístico, de uma famosa estância.

‘’Com a ponte, vamos ter mais clientes, vamos ter mais turismo, mas um dos grandes desafios são as vias de acesso. Porque de nada adianta ter a ponte e não haver vias de acesso para as zonas’’, revelou.

De olhos postos ao mar, ‘’Diogo’’ é o lugar que recebeu o primeiro presidente da Moçambique, antes de rumar a Tanzânia. Por ali encontramos até uma galeria de fotos de personalidades que, ou por ali passaram ou fizeram parte da história.

O Plano Geral de Urbanização do Distrito Municipal da Katembe estabelece 4050 hectáres dos cinco bairros que compõem esta área, nomeadamente, Guachene, Incassane, Chamissava, Chalí e Inguide.

Os impactos das mudanças na Katembe

No bairro Chali encontramos Alice Arone de 46 anos de idade. Katembe é a terra que a viu nascer. É parte dos cerca de 80% de habitantes que vivem de agricultura neste distrito municipal.

Os passos suaves em terra escaldante marcam uma caminhada diária indo ou voltando da sua machamba. Herdou um espaço dos seus pais, desde então nunca conseguiu ter O Direito de Uso e Aproveitamento de Terra.

“Ainda não temos DUAT’s, dizem que nos vão dar, mas ainda não começaram a dar. Desde o tempo passado nunca consegui’’, disse.

A senhora Alice vive com a sua família e depende da agricultura para o seu sustento. Ela tem um receio: que com a expansão da urbanização perca o seu espaço por não possuir um DUAT. ‘’Tenho medo, porque falando assim podem aparecer pessoas e tirarem-nos das nossas casas’’, comentou.

Os impactos trazidos pelas mudanças e pelo processo de urbanização, em qualquer parte do mundo suscitam conflitos entre a população nativa de uma determinada área e as autoridades e Katembe é disso um claro exemplo.

Um grupo  de residentes nativos da Katembe juntou-se para reivindicar as suas terras, porque o município da cidade de Maputo avisou que deveriam retirar-se deste espaço para dar lugar a construção de uma escola tecnico-profissional. A ideia não foi bem recebida.

Helena Chilaule é proprietário de um terreno de 100 metros quadrados e junta-se a mais proprietários para reclamar a acção das autoridades.

“O que nos desagrada é que temos 26 anos a cultivar nessas terras, quando chegamos não havia ninguém, era só mato, tal como vê. Mas desde 2016, 2017 até 2018. Em 2016 começaram a entrar e parcelar sem dizer-nos nada’’, reclamou.

A indignação é tanta, porque os nativos dizem não ter um destino definido. “É para ocuparem este espa,co que estão a ver. Quando perguntamos aonde vamos, eles dizem que saberemos no futuro’’

À semelhança da Senhora Helena, a senhora Ana Ernesto mostra a sua revolta. ‘’O meu filho não pode entrar nos meus terrenos. É para ele comprar com o Governo, faz sentido isso? Estás a ver. 3,5 hectares de terra?’’

O vereador do distrito municipal da Katembe, António Tovela, diz que esta é uma das áreas abrangidas para a construção de infraestruturas.

“No plano há áreas que estão projectadas para actividades agrícolas e algumas são para infraestrutura, mesmo que estejam ocupadas, em cumprimento do plano a população deverá retirar-se’’, explicou.

O vereador refere ainda que a lei deve ser cumprida sim, mas o plano deve ser respeitado. ‘’O facto de a lei de terras dizer que uma ocupação de mais de 10 anos é conferida a propriedade, não significa que quando houver um bem público as pessoas não devam sair’’, esclareceu.

O engenheiro responsável pela elaboração do plano de urbanização diz que o processo de reassentamento deve ser feito respeitado as partes envolvidas.

“É preciso sempre haver negocição entre as partes e chegar-se a conclusões que não lesem as partes’’, alertou.

Cenários como estes revelam falha no processo de implementação do Plano de Urbanização. Quem assim o diz è o Presidente do Conselho Municipal da Cidade de Maputo, David Simango.

“Neste momento estamos a retomar as trabalhos de parcelamento, tivemos um periodo longo de conflito com os residentes, fizemos uma média de seis ou sete reuniões. Já estamos a trabalhar com outros grupos, no geral o trabalho retomou depois do período dificil”, disse.

O edil da cidade de Maputo diz que as condiçoes financeiras podem comprometer o cumprimento do plano de urbanização.

“O que pode comprometer são as condições económicas, não o lado da disputa entre os nativos e as autoridades. Como sabe, quando desenhamos o plano não tínhamso a crise que estamos a viver hoje’’, acrescentou.

Diante de todos os desafios, uma verdade… cedo ou tarde a Ponte Maputo-Katembe levará o distrito municipal a uma linha contínua de desenvolvimento…

O lado mítico da Katembe

Mais do que os desafios de hoje, Katembe guarda a sua história de existência, guarda os seus mitos. Amélia Tembe ou melhor, Rainha da Katembe, tem 62 anos de idade e é a continuidade de uma é a continuidade da linhagem que deu origem a este distrito municipal. “Os ‘Tembes’ vieram do outro lado da Matola, eram muitos, homens e mulheres’’, contou.

O seu olhar franzino e tranquilo revela histórias de um legado que ela carrega com exclusividade, afinal é um título de magestade.

“Chegaram aqui e encontraram os ‘Cossas’, pediram licença e disseram que precisam de ser governados, estamos a pedir ao rei para nos apresentarmos. Eles disseram que não tem um rei. E os ‘’Tembes’’ disseram, governem para que nos possamos apresentar e eles disseram, governem vocês que estão a chegam porque são muitos, nós somos poucos, não vamos conseguir. E a seguir o ‘’Tembes’’ distribuiram-se as zonas e disseram, ‘você fica aqui… você fica aqui…’’.

O tempo traz outras dinâmicas e a Katembe de ontem não é a mesma de hoje e não será a mesma de amanhã.

“As pessoas estão a vir para cá. Depois da ponte vieram-nos apresentar e fizemos tudo para receber a ponte e obra começou e eles não fazem nada sem que nos digam’’.

São palavras de autoridade e poder, ditas por quem conhece a história de um lugar que  hoje reflete muito verde… De prosperidade.

 

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