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Entregues à sua sorte no mar?

Estalou o verniz no movimento olímpico nacional! Velejadoras moçambicanas qualificadas aos Jogos Olímpicos de Tóquio estão agastadas com as autoridades desportivas por falta de condições para a sua preparação. Os atletas reclamam o facto de recorrerem ao transporte público de passageiros na deslocação ao Clube Marítimo, local de treinos, situação que os expõe à contaminação do novo coronavírus.

 

Em Outubro de 2019, na Argélia, e Janeiro deste ano, em Angola, fizeram história ao colocar Moçambique na rota dos Jogos Olímpicos de Tóquio, evento adiado para 2020 devido à pandemia do Covid-19. O país desportivo jubilou. O seu feito foi exultado em folhas descritivas das glórias alcançadas pelos atletas nacionais no informe sobre o Estado da Nação.

Ensaiaram à sua preparação, em meio a falta de estágios pré-competitivo fora do país e sem acesso ao treinador identificado para liderar o processo de preparação para as olimpíadas de verão, mas o novo coronavírus travou o seu engajamento. Recuaram!

Mas uma “resolução” que autorizava excepcionalmente os atletas de alta competição a retomarem aos treinos, sobretudo os que se qualificaram ou estão na corrida ao maior evento desportivo planetário, permitiu que se fizessem novamente ao mar. Depois, claro, de concertações entre as federações, Comité Olímpico de Moçambique (COM) e Secretaria de Estado de Desporto e Ministério da Saúde no quadro de um protocolo sanitário.  Sem, diga-se de passagem, que se avançasse para o “plano A” que previa a acomodação, na vila Olímpica, dos atletas abrangidos pelo relaxamento de medidas de restrição, até porque o Comité Olímpico de Moçambique clarificou, em devido momento, que “não há condições para o efeito”. Entre concertações e atribuição de uma bolsa aos atletas que contempla USD 750 mensais, de quatro em quatro meses, abriu-se um novo capítulo no ciclo de preparação.

Um regresso sem a observação rigorosa das medidas de prevenção. Aliás, a velejadora Deisy Nhaquile, que reside em Khongolote, na Matola, recorre ao transporte público para se deslocarem ao local de treinos, numa fase em que a cidade de Maputo passou para a transmissão comunitária da Covid-19. “É uma situação muito triste ter que enviar mensagens aos meu treinador, logo cedo, a dizer que não sei se irei chegar cedo aos treinos devido à situação actual. Nos transportes, os motoristas e cobradores exigem que todos estejam sentados. Estamos numa situação crítica onde, de facto, o cobrador não aceita levar passageiros quando estes vão para destinos muito distantes”, disparou Deisy Nhaquile, velejadora em que Outubro de 2010 qualificou-se aos Jogos Olímpicos após conquistar o “Africano” de vela, na classe Laser Radial, prova realizada na Argélia.

A atleta questiona ainda: “São cinco atletas que se qualificaram para os Jogos Olímpicos e não conseguem transporte?”, indagou. E acrescentou: “Eu tenho colegas que vivem aqui perto. Mas se eu vivo distante e venho de transporte público ao local de treino fico 100% exposta ao vírus. Eu não vou conseguir salvaguardar a saúde das minhas colegas”, explicou a hexacampeã africana e com uma folha de serviço gloriosa no mar.

Denise Parruque, 17 anos, e Maria Machava, 15, são outras joias do mar! Ou seja, são atletas que ajudaram Moçambique a entrar para a história da vela e canoagem ao se tornar no primeiro país a colocar atletas com idades compreendidas entre os 15 e 20 anos nos Jogos Olímpicos. Deram tudo pela pátria, ficaram agora expostas ao novo coronavírus.

“Estamos a treinar para conseguir alcançar um bom resultado, mas está a ser complicado chegar ao local de treinos. Temos a colega Deisy Nhaquile que é uma atleta que vive longe e, por isso, para poder chegar aqui tem que tomar o transporte público de passageiros. Nós não temos carro para transportar os atletas no trajecto casa/local de treinos e vice-versa”, lamentou Denise Parruque, velejadora que em Janeiro último vencer a última do torneio de apuramento na classe 470, na contra costa da Ilha de Luanda, em Angola.

E foi secunda por Maria Machava, outra atleta que entrou para o grupo de elite ao se qualificar para os Jogos Olímpicos na prova de qualificação realizada na capital angolana.

“Há colegas a se fazerem aos treinos de transporte público de passageiros. Isso não é bom porque nós não sabemos com quem ela fala durante este percurso de casa ao local de treinos”, observou.

 

OS VALORES DA DISCÓRDIA

“Felizmente, as atletas têm vindo treinar. Infelizmente, ainda não tem nenhum apoio vindo do Estado. Elas estão a usar o valor da bolsa cedida pelo Comité Olímpico de Moçambique, que é de quatro em quatro meses. Isso tem criado alguns constrangimentos naquilo que é o processo de preparação, tendo em conta que treinam todo dia. Precisam alimentar-se e deslocar-se de casa para o local de treinos”, começou por dizer Hélio da Rosa, presidente da Federação Moçambicana de Vela e Canoagem.

Não há, igualmente, asseverou da Rosa, uma resposta à falta de um barco adequado (ndr: 470 é o que as atletas irão usar nos Jogos Olímpicos)  para a categoria na qual as atletas irão competir em Tóquio.

Sem acesso a fundos dos contratos-programa assinados anualmente com o Estado, a Federação Moçambicana de Vela e Canoagem tem, por si só, capacidade para suprir as necessidades das atletas olímpicas.

Nós, como federação, acabamos por criar um protocolo junto ao Clube Marítimo no qual esta colectividade adianta aquilo que são os valores para cobrir as necessidades das atletas. E, depois, levamos o valor da bolsa para reembolsar o clube. Achamos que, para as atletas treinarem, devemos sanar estes problemas”, ressalvou.

Mas a questão do transporte continua a dar volta à cabeça das atletas:  “O facto dos atletas serem transportados em chapas representa um grande perigo e risco para nós, tendo em conta que o transporte público pode fazer com que, durante a viagem, a atleta seja contaminada pelo coronavírus.

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