O País – A verdade como notícia

Ensino superior oscila entre expansão e baixa qualidade

Foto: O País

O ensino superior existe em Moçambique há 60 anos e somam-se 64 instituições, entre públicas e privadas. Entretanto, a fraca qualidade dos serviços públicos pode ser o reflexo da baixa qualidade dos graduados, apontam académicos.

A primeira instituição de ensino superior em Moçambique foi criada em 1962 e chamava-se Estudos Gerais e Universitários de Moçambique, mas tinha interesses predominantemente coloniais. Em 1968, passou a ser Universidade de Lourenço Marques e, em 1975, foi transformada em Universidade Eduardo Mondlane.

Seis décadas depois, Moçambique conta com 64 instituições de ensino superior, sendo 22 públicas e 44 privadas e, depois de um longo período de uma certa elitização do ensino superior, em que só se podia ter acesso na capital do país, começou, na segunda metade da década de 2000, o movimento de expansão das universidades públicas pelo país, tendo-se criado a Universidade Lúrio, que cobre o Norte do país, com cursos mais virados à saúde, e, mais recentemente, outras universidades, como a UniSave e UniRovuma, como corolário da fragmentação da extinta Universidade Pedagógica.

Para celebrar os 60 anos do ensino superior, a Universidade Rovuma juntou, na cidade de Nampula, académicos, sociedade civil e políticos, para reflectirem sobre os desafios e perspectivas. “Apesar do surgimento dessas instituições do ensino superior, como resposta à crescente procura de serviços educacionais, reconhecemos que, a nível universitário, ainda hoje, existem muitos desafios para responder às preocupações da população residente nesta região”, reconheceu Mário Jorge Brito dos Santos, reitor da UniRovuma, num discurso que procurava enquadrar o papel das universidades regionais, como a que dirige, face aos desafios de massificação de acesso ao ensino superior em Moçambique.

A presidente do Conselho Nacional de Avaliação da Qualidade do Ensino Superior, Maria Luísa Chicote Agibo, apresentou as questões que viriam a merecer reflexão: “o que são e como as instituições do ensino superior ensinam? O que elas pesquisam e para quê? Como elas usam os seus recursos? Quais são os seus alcances e parcerias com a indústria?”

O Professor Doutor Adérito Barbosa, da Universidade Católica de Moçambique, disse, sem rodeios, que a fraca qualidade dos serviços públicos no país pode ser o reflexo do tipo de graduados que sai das universidades.

“O serviço aos cidadãos em Educação, Saúde, Transportes Públicos, Segurança, Comunicação, fornecidos pelo Estado e sector privado, são também de baixa qualidade. Parece haver também escassos recursos para a inovação. Existe a percepção de fraca preparação técnica dos formandos, o que significa insuficiência do saber, dificuldades do saber fazer, lacunas na cultura do saber estar com dignidade. As universidades públicas e privadas multiplicam-se com vários polos, sem infra-estruturas suficientes, sem formação pedagógica dos professores, professores sem massa crítica e científica para o debate, os alunos não encontram rigor e exigência e não vêem uma grande diferença com o ensino secundário”, criticou Professor Doutor Adérito Barbosa.

O fraco investimento público na investigação científica é apontado como uma das causas dos problemas levantados, segundo Pedro Guiliche, assessor do ministro da Ciência e Tecnologia para a Área do Desenvolvimento Institucional e Ensino Superior.

“O momento mais alto de financiamento do Orçamento do Estado foi dado entre 2008/9 e, depois, baixou e nunca mais passou de 10/15%, como se pode verificar até ao ano de 2019. Isso significa que o Estado está a investir pouco na área de investigação e toda a narrativa que se pode construir sobre investigação. Enquanto não definirmos como prioridade o investimento para a investigação, os resultados serão uma miragem”, alertou Pedro Guiliche.

Lembre-se que o Governo tinha definido para até 2020 atingir 40% da população estudantil (olhando para os alunos que terminam o ensino secundário), mas ficou nos 16%, tal como lembrou Guiliche. Contudo, os oradores e participantes do debate desta quarta-feira convergiram na ideia de que a qualidade nunca é uma obra que se alcança definitivamente, sendo importante discutir-se de forma permanente, para que as instituições do ensino superior sintam o desafio de melhorar cada vez mais as três vertentes: formação, investigação e extensão.

Partilhe

RELACIONADAS

+ LIDAS

Siga nos