O sociólogo Elísio Macamo considera insuficiente a expulsão dos agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM) envolvidos no tumulto registado nesta segunda-feira, em Bobole, Província de Maputo. Para ele, a medida não ataca a raiz do problema: a fragilidade dos instrumentos que regulam a formação e a actuação da polícia no país.
A reacção surge após o baleamento de um menor e o consequente linchamento de um agente da PRM naquela localidade. Macamo lamenta o sucedido e questiona o modelo de formação dos polícias moçambicanos.
“A questão mais importante, para mim, não é o comportamento individual do agente. O fundamental é como é que os nossos agentes são formados, que mecanismos existem na polícia e no Ministério do Interior para garantir que se comportem devidamente. Tenho certeza de que, quando saem em missão de serviço, ninguém lhes diz para se comportarem mal”, afirmou.
O académico sublinha que a expulsão dos envolvidos não resolve a “crise de valores” que mina a corporação, porque os mecanismos de regulação se têm mostrado ineficazes.
“Não foram os agentes que falharam, foram os instrumentos. É curioso que sejam responsabilizados, e é assim que deve ser, mas essa não é a medida política correcta. O que deve ser questionado são os mecanismos que o Ministério do Interior tem para garantir que a nossa polícia se comporte bem.”
Macamo acrescenta, contudo, que é igualmente necessária a responsabilização criminal das pessoas que participaram no linchamento do agente.
“É importante que sejam identificadas e responsabilizadas. Isso vai moralizar a nossa sociedade. Estou mais preocupado com essas pessoas. No ambiente de euforia e de multidão, podem não ter consciência da responsabilidade individual, mas quando já estão sozinhas em casa, como é que lidam com aquilo que fizeram?”, questionou.
O sociólogo falava à margem da oficina de ideias “Responsabilidade da Juventude em Tempos de Crise”, onde defendeu a necessidade de cultivar diálogo e responsabilidade numa sociedade marcada pela polarização.
“Todos sabem o que aconteceu depois das eleições, a violência que se seguiu e o ambiente polarizado em que vivemos. Quando há polarização, o diálogo é difícil, ninguém ouve o outro e cada um só defende as suas convicções. É preciso haver vozes de razão, sobretudo dos jovens, que têm a responsabilidade de continuar este país”, concluiu.
A iniciativa, promovida pelo Manifesto Cidadão, procura incentivar a cidadania activa, a reflexão crítica e a apresentação de soluções para o reforço da democracia em Moçambique.