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CDHOAM diz que medidas de prevenção e combate aos acidentes de viação são ilegais

Foto: O País

É mais uma voz da sociedade a condenar as medidas anunciadas de reforço para prevenção e combate a acidentes de viação, anunciadas, no passado dia 26 de Julho, pelo Ministério dos Transportes e Comunicações (MTC).

A Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados (CDHOAM) diz, em comunicado, que tais medidas (num total de 14 anunciadas pelo MTC) são ilegais.

A CDHOAM chama atenção para a necessidade de se respeitarem os princípios de legalidade, assim como do Estado de Direito Democrático, tal como prevê a Constituição da República de Moçambique (CRM).

“Com efeito, as situações constantes do comunicado de imprensa publicado pelo Ministério dos Transportes e Comunicações constituem contravenções médias ou graves, não estando, nos termos da previsão normativa do Código de Estrada, sancionadas com prisão imediata dos infractores, nem com a cessação do título de condução dos transgressores, muito menos com a apreensão de documentos da viatura. Pelo que, a efectivação de sanções previstas no referido comunicado é sustentável de violar os direitos e garantias fundamentais dos cidadãos”, lê-se na nota da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados.

A CDHOAM lembra que, neste sentido, embora o artigo 153 do Código de Estrada estabeleça que é “punida com a pena de um a três anos e multa correspondente, o condutor que, com culpa grave cause a morte de alguém, como nos casos de ultrapassagem irregular, condução sob efeito de álcool, excesso de velocidade, cruzamento irregular de veículos, entre outros, a matéria prisão não é imediata, mas ordenada em sentença condenatória proferida pelo Tribunal competente”, argumenta a CDHOAM, recordando ainda que, “aliás, a condução sob efeito de álcool, influência de estupefacientes, substância psicotrópica ou produtos com efeito análogo é sancionada nos termos do artigo 230 do Código Penal”.

Sustenta que, “portanto, a prisão imediata das contravenções médias e graves ao Código de Estrada não só encontra enquadramento legal na previsão normativa do referido Decreto n.° 1/2011, de 23 de Março, o qual não pode ser alterado por mero comunicado, também constitui uma violação ao princípio de presunção de inocência”.

Para além disso, diz a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados, “nos termos do disposto no artigo 243 do Código de Processo Penal, só pode ser sujeito à prisão preventiva os arguidos que tenham cometido crimes puníveis com penas não inferiores a dois anos de prisão. Pelo que, o agente que, em cumprimento do comunicado de imprensa publicado pelo Ministério dos Transportes e Comunicações, ordenar e impuser a prisão imediata de algum condutor, comete o crime de prisão ilegal, previsto e punido nos termos do disposto no artigo no artigo 415 do Código Penal, punido com pena de prisão até dois anos”.

Na mesma nota, a CDHOAM refere que, os artigos 146 e 147 do Código de Estrada, aprovado pelo Decreto n.° 1/2011, de 23 de Março, estabelecem, “respectivamente, as contravenções médias e graves, sancionando-as, nos termos do disposto no artigo 148, com inibição de conduzir”.

A Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados reconhece, no entanto, que, nos últimos tempos, “tem estado a ocorrer acidentes de viação cada vez mais graves e frequentes, provocando luto nas famílias e causando prejuízos sociais e económicos avultados”.

Mais ainda: diz que o Ministério dos Transporte e Comunicações e os agentes da Polícia de Trânsito estão a envidar esforços no sentido de melhorar a segurança rodoviária.” Seja através de acções de sensibilização, dos condutores e peões, como de prevenção e combate aos acidentes de viação, impondo a aplicação e respeito das normas previstas no Código de Estrada, aprovado pelo Decreto n.° 1/2011 de 23 de Março”.

Contudo, considera a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados que “a implementação desses esforços institucionais, visando a prevenção e combate aos acidentes de viação em Moçambique, as entidades competentes devem respeitar escrupulosamente os princípios da legalidade e do Estado de Direito Democrático, conforme previsto na Constituição da República de Moçambique, evitando, deste modo, promover medidas que possam afectar os direitos e garantias fundamentais dos cidadãos”.

 

QUAIS SÃO, AFINAL, AS MEDIDAS ANUNCIADAS PELO MTC?

O Ministério dos Transportes e Comunicações anunciou, no passado dia 28 de Julho, medidas extraordinários para reverter o quadro negro de sinistralidade nas estradas moçambicanas.

As medidas visam travar o elevado índice de sinistralidade no país, que ceifa vidas humanas e destrói património público e privado.

A título de exemplo, durante o primeiro semestre deste ano, ocorreram 494 acidentes de viação que resultaram em 434 óbitos e 973 feridos, entre graves e ligeiros, segundo dados do MTC.

Em comparação com igual período do ano passado, referiu o Ministério dos Transportes e Comunicações, a tendência é crescente e o número de acidentes de viação evoluiu em 9%, os óbitos em 4% e os feridos graves em 36%, impondo-se medidas arrojadas e contundentes para reverter este quadro negro.

Para evitar mais sangue nas estradas, o Ministério dos Transportes e Comunicações anunciou quatro medidas, entre as quais a prisão imediata dos infractores envolvidos em acidentes de viação com culpa grave que resulte em óbito, como os casos de ultrapassagem irregular, condução sob efeito de álcool, velocidade acima de 20 km do limite máximo estabelecido para a via em que circula, cruzamento irregular de veículos entre outros, à luz do disposto no Código da Estrada, aprovado pelo Decreto n.° 1/2011, de 23 de Março.

A segunda determina a apreensão do documento de identificação do veículo suspeito de contrafacção ou viciação fraudulenta, bem como apreensão de todos os outros documentos que digam respeito à circulação da viatura, à luz do disposto no Código da Estrada, aprovado pelo Decreto n.° 1/2011, de 23 de Março.

A terceira determina a cassação do título de condução aos transgressores que cometerem contravenções médias e graves, nos termos previstos na lei; a quarta apreensão do documento de identificação do veículo encontrado a circular sem oferecer as condições de segurança exigíveis nos termos da lei; a quinta a reeintrodução imediata da realização do teste de álcool na condução e tolerância zero à condução sob efeito de álcool e drogas; a sexta a responsabilização civil do condutor envolvido em acidentes de viação, ficando obrigado a indemnizar o lesado, incluindo o Estado, pelos danos resultantes desta violação e sujeito a reparação dos danos causados no património e infraestruturas públicas (edifícios, postes de iluminação, pontes e outras).

A sétima medida diz respeito à implementação da obrigatoriedade da frequência do curso de Segurança Rodoviária aos condutores sancionados com pena acessória da inibição de condução devido a infracções médias ou graves, como condição para a restituição da carta apreendida. O curso deve privilegiar conteúdos sobre a condução defensiva e outras boas práticas de segurança e partilha da via pública.

A oitava prescreve a revisão dos limites de velocidade e melhorar a sinalização das estradas, com prioridade para os pontos críticos (pontos negros) já mapeados e remover obstáculos fixos nas bermas da via pública; a nona a interdição do novo licenciamento do transporte interdistrital para veículos de 15 lugares em distâncias superiores a 100 Km e limitar a duas renovações aos veículos já licenciados.

A décima obriga a intensificação da fiscalização do trânsito rodoviário nos pontos de maior ocorrência de acidentes de viação; a décima primeira quer a articulação permanente dos agentes investigadores da anti-corrupção com as brigadas de fiscalização rodoviária; a décima terceira a operacionalização da emissão de auto de denúncia pelas autoridades com competência para fiscalizar o trânsito rodoviário; conceber e implementar uma campanha integrada de Segurança Rodoviária, privilegiando a comunicação e educação de todos os intervenientes na via pública; e a última a implementação de uma plataforma de comunicação e gestão de denúncias sobre o comportamento da tripulação e infracções de trânsito rodoviário.

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