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As dinâmicas do basquetebol moçambicano

O antigo jogador da selecção nacional de basquetebol, Helmano Nhatitima, analisa o estágio actual e as dinâmicas da modalidade da bola ao cesto no país. Campeão pelo Desportivo Maputo, Costa do Sol e extinta Conseng, Nhatitima desvenda a fórmula para o sucesso do Ferroviário da Beira, conjunto que este ano vai disputar pela segunda vez consecutiva a Liga Africana de Basquetebol. Mais: tem dominado as provas internas, relegando, desta forma, para o segundo plano os tradicionais candidatos ao título sedeados na capital do país. A viverem de glórias do passado. Nhatitima entende que as províncias carecem de atletas seniores, moldura humana para praticar a modalidade. Para Nhantitima, a cidade de Maputo está num sono profundo.  Diz ainda que, depois da  “morte” do Desportivo Maputo e Maxaquene, o Ferroviário, porque estava bem financeiramente ou porque tinha pessoas que se importavam, vinha puxando a modalidade. O que já não acontece hoje por hoje!

 

1.-O Ferroviário da Beira não evoluiu da noite para o dia. Primeiro, foi organizando campeonatos nacionais de formação durante anos e, depois, foi organizando “nacionais” de seniores. O Ferroviário da Beira foi vendo como as equipas de Maputo se organizam, porém, nunca conseguia dar o salto. Por quê? Porque acreditava que iria ganhar só com jogadores e treinadores da Beira e isso nunca aconteceu. Quando o Ferroviário da Beira começa a contratar atletas e treinadores de Maputo e, depois de fora, outro galo começa a cantar. Hoje já quase não encontras atletas beirenses no plantel porque tornou-se uma equipa com pretensões africanas e já não pensa “provincianismo”.

 

2- Zambézia é um caso especial. Dá o “boom” depois de 2003, quando o campeonato nacional escalou Quelimane. Foi a partir daí que os miúdos locais treinaram tanto para atingirem o estatuto de estrelas que haviam estado lá ( ndr: isto ouvi da boca de Pio “Lingras” Matos, Augusto “Gordo” Matos” e  Igor Matavele).

 

3- Nampula já anda há muito tempo neste vai vem de “nacionais” e não evoluiu. Já devia ter dado o salto há muito tempo. Nampula tem tudo para ser a terceira província basquetebolística do país, mas nada. Felizmente, tem o Albino Dimene lá – presidente da Associação Provincial de Basquetebol- grande impulsionador. Mas também já perceberam que tem que colher experiência de outro sítio. Questiono: se Octávio Magoliço e Fernando “Nandinho” Manjate não estivessem na equipa do Ferroviário de Nampula, acham que iriam para algum sítio? Não. A qualidade da equipa subiu em mais de 50%. Em condições normais, Nampula ganha mas transpira para vencer as equipas de Cabo Delgado. Na “poule” de apuramento da zona norte para a Liga Moçambicana de Basquetebol, com reforço de Octávio Magoliço, ganhou por mais de 70 pontos.

 

  1. As províncias carecem de atletas seniores, moldura humana para praticar a modalidade. São os mesmos atletas que jogam e saem daqui para ali. Mas para evoluir, primeiro, é preciso derrubar as barreiras mentais e perceber que nós temos ainda muito a aprender, caminhar e perceber quais são os pontos a evoluir e lutar com eles. É normal chegar a uma equipa, pedir um ataque e dizerem que não tem. Jogam com corte e passe. Sério? Nos seniores isso? Correr nos corredores, ninguém conhece isso de corredores. Temos que correr muito, mas o mais importante é correr bem e organizados. Gosto da dinâmica em Cabo Delgado, onde estão preocupados com essa evolução ao chamar treinadores de fora. Mas o maior desafio ainda está no atleta, na mente. Desconstruir a ideia de que o craque é aquele que está com a bola, imitar o lançamento de Kevin Durant ou Kobe Brynt (astro da NBA falecido a 26 de Janeiro de Janeiro de 2020) sem que pratiques treinos individuais de lançamento.

5- Nenhum jogador que chegou à selecção nacional de basquetebol de 2005 até 2019 por aí atingiu este patamar sem quatro horas de treinos diários. Treino individual, a evolução do atleta não ocorre no treino colectivo, mas sim em treinos individuais (lançamento, salto e evolução física).

6- A cidade de Maputo está num momento mau, sem dúvidas. Depois da “morte” do Desportivo Maputo e Maxaquene, o Ferroviário, porque estava bem financeiramente ou porque tinha pessoas que se importavam, vinha puxando a modalidade. Hoje já não tens este clube “pai” que diz “vamos lá ou mexam-se lá”. O Costa do Sol tem, hoje, a melhor estrutura, mas não assume esse papel e enquanto não fizer isso vai chorar sempre em segundo (enquanto o Ferroviário de Maputo ganhou, tinha todo o poder sobre Associação de Basquetebol da Cidade Maputo). A Associação Provincial de Basquetebol de Sofala é o Ferroviário da Beira. A associação, que não tem meios, também está no seu cantinho: inerte e prostrada. Isto para não falar dos árbitros que, sem dinheiro, não apitam. Isto é culpa do nível de organização e da forma de trabalhar que Maputo atingiu e a fórmula está lá e é só aplicá-la. Acredito que a estrutura de jogos nas províncias é, de longe, mais leve que a de Maputo onde temos todos os escalões a se movimentarem com equipas A, B, etc. Contudo, não creio que os árbitros tenham que apitar de borla, até porque não são pai natal mas são parte do problema e, claramente, serão parte da solução.

Resumindo: Manica, Tete e Cabo Delgado tem vontade mas o caminho ainda é longo, e só vão evoluir com muito trabalho.

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