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Angoche: o distrito onde a pobreza e a tradição fazem raparigas casarem antes dos 15 anos

Angoche é um dos oito distritos da província de Nampula com os maiores índices de casamentos: uma relevação do Centro de Pesquisa em População e Saúde em resultado de um estudo publicado em 2011. Sete anos passaram mas as uniões e gravidezes precoces ainda são uma realidade neste distrito do sul da província de Nampula.

É aqui onde “O País” encontrou Milena Maurício uma criança de 15 anos de idade, órfã e que quase faria parte das estatísticas das raparigas que são obrigadas a casar com adultos em troca de melhores condições de vida. “Fugi de casa porque minha irmã queria me obrigar a casar com um homem de mais de 50 anos e dizia que ele tinha carros e dinheiro suficiente para dar-me tudo que eu quisesse”, conta.

Porém, vivendo na rua, fugindo do casamento, a menina acabou por ser violada por três homens, de um dos quais engravidou e agora tem um filho. Milena fugia de um casamento prematuro e mas acabou tento uma gravidez precoce. “Assim tenho o meu filho e sempre a criança pergunta-me onde está o meu pai. Quando isso acontece fico sem saber o que responder, porque nem eu o conheço”.

A história de Milena foi partilhada esta quinta-feira na Conferência Distrital sobre Casamentos Prematuro, uma iniciativa do Fórum Nacional das Rádios Comunitárias (FORCOM) e outras organizações da sociedade civil cujo objectivo era criar um espaço de debate, onde raparigas, pais e encarregados de educação, líderes religiosos e comunitários, bem como Governo local pudessem debater soluções.

As raparigas denunciam que muitas vezes são obrigadas pelos próprios pais a casarem-se, alegando que caso não o façam correm risco de contraírem gravidezes cujos pais se recusariam a assumir as crianças. “Os nossos pais e encarregados de educação não podem negar isso, obrigam sim as meninas a casarem-se e quando ela nega dizem que você nunca mais será nossa filha ou nosso filho”, revelou a menina Amina Abamugy, reivindicando o direito as raparigas de Angoche poderem escolher quando e com que casar.

A Directora dos Serviços de Registo Civil de Angoche, Tereza Jamal afirmou que o sector tem recebido casos de menores que pretendem registar suas crianças porém sem os respectivos pais, que muitas vezes são adultos que têm conhecimento das irregularidades que cometem. “Nós temos visto nos nossos serviços, meninas de 15 anos a virem registar os seus filhos com um pai de 60 anos”, afirmou.

Já os pais e líderes religiosos dizem o acesso a informação através das redes sociais está a desviar o comportamentos das crianças, justificando antigamente as raparigas não casavam muito cedo. A sociedade civil e autoridades do distrito de Angoche em Nampula dizem que os ritos de iniciação são uma das principais causas dos casamentos prematuros, por muito cedo ensinarem as crianças sobre a vida sexual. Exortam, assim as comunidades a atrasarem esses ensinamentos como forma de prevenir o fenómeno.

Conferências similares aconteceram ainda ontem nos distritos de Macanga, na província de Tete e Dondo, na província de Sofala.   

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