O mais recente filme de Sol de Carvalho foi rodado na Ilha de Moçambique, durante 40 dias. Intitulado O ancoradouro do tempo, a longa-metragem foi adaptada do livro A varanda do Frangipani, de Mia Couto.
Durante mais ou menos 20 anos, Sol de Carvalho “evitou” a possibilidade de adaptar um filme de Mia Couto para o cinema. O receio de falhar contribuiu para que o realizador adiasse levar a obra do escritor à grande tela – Sol entendia que apenas um grande realizador de nível mundial poderia fazer um filme sobre a obra de Mia que o escritor merecesse. No entanto, a coragem venceu o medo e Sol de Carvalho realizou Mabata bata, há alguns anos, e tudo correu maravilhosamente bem, o que até se pode medir pelo número de prémios: 17.
Ora, partindo mesmo dessa boa experiência, Sol de Carvalho propôs-se, então, a realizar o seu mais recente filme, O ancoradouro do tempo, adaptado do livro A varanda do Frangipani, da autoria de Mia Couto. Para o efeito, reuniu vários actores moçambicanos consagrados, na Ilha de Moçambique, Nampula, onde, durante 40 dias de rodagem, todos fizeram a magia da sétima arte acontecer.
Desde o princípio, Sol de Carvalho soube que não seria nada fácil levar a maior parte da equipa a Ilha de Moçambique. No entanto, porque na história original há uma fortaleza, o realizador calculou que a melhor fortaleza para a longa-metragem que terá 90 minutos de duração seria aquela, localizada na Ilha. Em termos visuais, todo o elenco do filme concorda que foi a melhor opção, todavia, por um motivo qualquer, boa parte da equipa ficou doente. Malárias e diarreias para todos. De graça. Mas nada parou, pois, segundo disse Mia Couto, esta segunda-feira, todos, principalmente os actores, foram soberbos, com muita entrega ao trabalho intenso. “Eles estiveram sempre disponíveis, tentando fazer o melhor que podiam. Foi uma experiência que não vou esquecer, trabalhar com os actores e fazer com que o texto não seja algo definitivo”.
O ancoradouro do tempo, com efeito, é uma história, de alguma maneira, improvável. No enredo há um polícia bom, que quer ser justo, honesto e que se entrega a essa grande caminhada contra tudo e contra todos. Essa personagem acredita que, sendo um bom polícia, pode contribuir para construir um mundo melhor. Para Mia Couto, esse polícia existe e precisa ser encontrado. “Foi bom trabalhar com o Sol, com o Mário Mabjaia e com toda a equipa. Foi um grande estímulo para fazermos um segundo filme. Acho que este filme será um marco para o cinema moçambicano, sem dúvida nenhuma”, confessou o escritor.
Em O ancoradouro do tempo, Mia Couto escreveu o guião com Sol de Carvalho, que, inclusive, ficou impressionado com o desempenho dos actores. “A disciplina artística que consegui encontrar nos actores, tenho 40 anos de profissão, nunca tinha tido em toda a minha vida. Isso é uma coisa que vou levar comigo à cova. Eu fiquei muito satisfeito pelo desempenho dos actores”.
O ancoradouro do tempo foi orçado em cerca 600 mil euros, cerca de 40 milhões de meticais, dos quais 70 mil euros, quase 5 milhões de meticais, foram usados para logística. Na Ilha, as rodagens iniciaram uma semana depois do Ciclone Gombe, o que complicou e muito o trabalho da produção, afinal, todo o cenário anteriormente montado, ficou destruído. A equipa começou as rodagens sem luz e teve de usar um gerador. Ainda assim, apensar das complicações de ordem natural e logística, Sol de Carvalho adianta que uma das coisas mais certeiras que fez na vida profissional foi levar as rodagens a Ilha de Moçambique.
No Scala, esta segunda-feira à tarde, estiveram alguns actores. Entre eles Josefina Massango, Mário Mabjaia, Horácio Guiamba, Maria Atália, Tomás Bié, Vítor Gonçalves e Stewart Sukuma, que deixou a música de lado para poder representar. Em geral, todos destacaram a entrega ao trabalho duro e minucioso, divertindo-se enquanto trabalhavam. A colaboração e a sintonia, reforçaram, foi extremamente essencial.
Agora, a fase que se segue é o da pós-produção e dos efeitos especiais. O filme deverá ficar pronto em oito meses. No entanto, em Moçambique, poderá ser exibido depois da apresentação no circuito de festivais internacionais.
SINOPSE O ANCORADOURO DO TEMPO
IZIDINE, um recém-graduado inspector da polícia, é chamado a investigar um crime ocorrido numa antiga fortaleza colonial, que é actualmente um asilo de velhos – mataram Vasto Excelêncio, o director. A ordem chega quando o inspector está prestes a concluir uma investigação que levará uma gang à prisão.
A fortaleza está situada numa ilha e os dois únicos veículos de comunicação são um velho barco e o helicóptero que o transporta ao local. Ele tem 8 dias para resolver o crime até que o helicóptero o vá buscar.