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Pseudodilema: quanto custa manter a Mozal competitiva? 

Porque este debate importa: a controvérsia à volta do fornecimento de electricidade à Mozal deixou de ser uma negociação entre empresas para se tornar um teste de maturidade do Estado. O que está em causa não é apenas uma tarifa, é a forma como Moçambique decide usar um activo raro (energia limpa) para gerar valor público, emprego qualificado, divisas e capacidade industrial. 

Com base nos dados desagregados do Wood Mackenzie Smelter Report, com inflação ajustado e o custo de energia, a análise centra-se em dois cenários principais de preço da energia: USD 50/MWh, defendido pela Mozal, e USD 60/MWh, próximo à contraproposta apresentada pela HCB. Estes cenários são avaliados em função da curva global de custos de produção de alumínio, num universo que abrange cerca de 153 fundições mundiais, e considerando ainda a introdução obrigatória do Mecanismo Europeu de Ajustamento de Carbono na Fronteira (CBAM), principal destino das exportações da Mozal.

Os resultados mostram que, mesmo no cenário de USD 60/MWh, quando associado ao CBAM, a Mozal mantém-se entre os produtores mais competitivos a nível internacional, produzindo alumínio mais barato do que aproximadamente 111 empresas em todo o mundo. Esta constatação revela um falso dilema uma que embora o aumento tarifário represente um desafio, a combinação entre energia hídrica e a nova tributação do carbono reforça a posição relativa da empresa e continua a oferecer ao país uma base sólida de competitividade industrial.

 

O que nos trouxe até aqui?

É útil recordar por que razão a MOZAL se instalou em Moçambique a partir do ano 2000 e por que razão a energia está no centro da equação. A decisão de investimento da viragem do milénio combinou três elementos: 

  1. Energia abundante e barata: no início da década de 1990, a capacidade de geração da Eskom excedia a procura máxima da África do Sul (SA) em cerca de 30-40%, criando um grande excedente. Esse excedente resultou do forte investimento da empresa, nas décadas de 1970-80, em centrais a carvão, que antecipava um rápido crescimento da procura nas próximas décadas. Contudo, com o boicote internacional do regime racista sul-africano – pelas UN, Commonwealth, EUA, entre outros – a economia arrefeceu e consequentemente a procura real pela energia, contrariando projecções anteriores de crescimento. Esta situação gerou excedente energético.

 

Com o fim do Apartheid (na primeira metade dos anos 90), como forma de reaquecer a sua economia e “despachar” o excedente energético da ESKOM, a África do Sul apoiou investimentos intensivos em energia na região, e a Mozal, em Moçambique, foi o exemplo emblemático; e a energia foi negociada a tarifas especialmente descontadas para atrair o consumidor. Em 2013, a Mozal pagava cerca de 36 cêntimos por kWh ao abrigo de contratos especiais. Dados de 2012/13 mostram um custo operacional da ESKOM que era de aproximadamente R 54,2 cêntimos por kWh, o que significa que a tarifa aplicada à Mozal não cobria o custo.

 

Portanto, pode afirmar-se, com elevado grau de confiança e com base nos dados acima apresentados, que a instalação da MOZAL em Moçambique respondeu, antes de mais, aos interesses estratégicos da África do Sul e menos aos do próprio país. Em segundo plano, foi a disponibilidade de energia sul-africana, em quantidade e a preços reduzidos, o verdadeiro factor determinante que levou a Mozal a investir primeiramente na África Austral (assumindo a sensibilidade desta indústria ao preço da energia).

 

  1. Localização: presença de um porto dotado das condições adequadas para assegurar o manuseio eficiente de equipamentos, matérias-primas e produtos finais, tanto para importação como para exportação nos mercados internacionais. Com efeito, Beluluane oferece proximidade imediata ao Porto de Maputo e ao Corredor logístico EN4, reduzindo igualmente custos de escoamento de um produto denso em valor e em volume;

 

  1. Enquadramento institucional: compreende o quadro regulatório e os incentivos ao investimento, considerados altamente atractivos, oferecidos pelo então Governo de Moçambique, bem como a engenharia contratual de âmbito regional. Pagaria três a quatro vezes menos de impostos que uma empresa similar pagaria na Noruega.

 

  1. Disponibilidade de infra-estrutura: presença de uma infra-estrutura robusta e de elevada qualidade, capaz de garantir o transporte e o fornecimento da energia eléctrica disponibilizada pela Eskom, através MOTRACO. 

Como foi operacionalizado o potencial existente?

No seguimento dos princípios dos objectivos de integração regional emanados do SADC Treaty datado de Agosto de 1992, foi em Março de 1997 que o Governo de Moçambique e a Alusaf assinaram um Acordo de Princípios para o estabelecimento de uma fundição de alumínio em Moçambique.  Acto continuo, o Decreto n.º 45/97 criou a Zona Franca Industrial MOZAL (ZFIM), com regimes especiais aduaneiro, cambial e laboral que, goste-se ou não, eram comuns em megaprojectos do período. Tal decreto contribui para mitigar incertezas e funcionar como um relevante atrativo para o investimento da Mozal, num contexto em que Moçambique emergia de uma das mais devastadoras guerras civis do mundo e em que a confiança na segurança nacional permanecia fragilizada. Assim, a Mozal passaria a ser pioneiro e chamariz da industrialização no período pós-colonial. Seguiu-se a implantação da MOTRACO, joint venture em partes iguais (33,33% cada) das utilities EDM, ESKOM e Eswatini Electricity Company, a qual construiu e opera “auto-estrada” eléctrica de 400 kV que liga, com redundância técnica, o sistema sul-africano/ESKOM à carga electro-intensiva da fundição, bem como a restante carga elétrica da EDM no sul de Moçambique e da EEC em Eswatini, conferindo garantias de qualidade requeridas pela aluminaria ao mesmo. 

Na fundição moderna, a electricidade e a alumina respondem, cada uma, por cerca de 30% do custo “cash” total de fornecimento, totalizando assim cerca de 60% do custo; a logística e mão-de-obra têm, em regra, peso inferior (em média 10% cada). Em carga plena, a demanda elétrica da MOZAL é de 950 MW firmes – uma grandeza praticamente igual ao actual consumo total de energia de Moçambique, e cerca de 50% da capacidade total instalada na HCB.

Do lado societário, convém exatidão: actualmente, a operadora e accionista de referência é a australiana South32 (subsidiaria da multinacional BHP Billiton) com participação maioritária (cerca de 64%); o Industrial Development Corporation da África do Sul (cerca de 32%) mantém uma quota relevante; e o Estado moçambicano detém cerca de 3,9%. A cronologia também merece precisão: a construção arrancou no fim dos anos 1990, a produção iniciou-se em 2000 e a expansão foi concluída em 2003. Esta memória factual não é detalhe: é a base para aferir compromissos, avaliar benefícios e, sobretudo, renegociar com lucidez.

O problema de hoje: preço e quantidade 

O nó górdio, hoje, resulta da combinação de quatro vectores. A saber:

  • Load shedding: a África do Sul vive, desde 2007, ciclos de racionamento eléctrico (“load shedding”) que atingiram o seu pior registo em 2023, fruto da dependência do carvão, do envelhecimento das usinas de carvão responsáveis por aproximadamente 90% da energia no pais, de atrasos de manutenção e de problemas de gestão na ESKOM. O cenário anterior caracterizado por excesso de energia barata passa a dar lugar a profundas dificuldades de abastecimento de energia tanto a nível interno da Africa do Sul como a nível da capacidade de a Eskom continuar a servir e cumprir os níveis da SAPP, precipitando a recomposição tarifária que se seguiu e associada à necessidade da revisão de contratos, incluindo o fornecimento firme para grandes clientes. 

 

A este tsunami energético, apenas os termos e condições aplicáveis ao fornecimento à Mozal terão ficado blindados e quase intactos. Para justificar perante a opinião pública sul-africana a manutenção do fornecimento contínuo à Mozal, sem interrupções e alterações tarifárias a todos os outros aplicáveis, pesou o facto de a ESKOM ter acedido a incluir uma cláusula indicando que a energia a ser entregue à Mozal seria a mesma proveniente de Moçambique – a partir da HCB – recanalizada a Moçambique. Concomitantemente, ainda que sem vinculação contratual formal e direta da HCB, e para cumprir com os requisitos de entrega de um produto/alumínio verde aos mercados internacionais, terá sido estratégico emendar os termos contratuais no sentido de referir que a energia fornecida à Mozal a partir da África do Sul/ESKOM era de origem hídrica/limpa. De sublinhas que não há garantias de que tal energia consumida pela Mozal seja realmente limpa visto que o seu fornecedor recebe directamente da Eskom e não da HCB. 

 

  • Regime contratual e técnico: a arquitectura que alimenta a MOZAL separa, por desenho e configura duas relações jurídicas independentes no âmbito legal mas interdependentes no âmbito técnico e da cadeia de fornecimento, nomeadamente: (i) o PPA entre a HCB vs ESKOM, por um lado, e (ii) o PPA entre ESKOM – MOTRACO MOZAL, por outro lado, relações que relações exclusivas, ou seja, o que contracto entre A e B não influencia o contrato o contrato entre o B e o C, e assim sucessivamente. De referir que apesar da independência entre si, eles são economicamente interdependentes e politicamente sensíveis.

 

  • Sazonalidade e estratégia (económico/comercial): o principal contrato de exportação da HCB-ESKOM tem horizonte de 2030 e assenta em premissas tarifárias associadas ao comprador ESKOM, sendo que o contrato de fornecimento a ESKOM-MOZAL tem um horizonte de 2026 e assenta em premissas tarifarias associadas ao consumidor Mozal. Em algum momento observa-se um desalinhamento entre as duas relações jurídicas tanto do ponto de vista temporal como do ponto de vista económico, só resolvível mediante o recalibramento temporal e tarifário.    

 

  • O quatro tem a ver com o volume de energia requerido na capacidade de fornecimento dos 950 MW requeridos: tão ou mais do que o preço médio por megawatt-hora, o que define a viabilidade técnica e económica da fundição é a disponibilidade de potência firme e contínua. Decorrente da situação de seca no Zambzeze foram aventadas, no debate nacional, ofertas de volume na ordem de 350 MW a partir de 2026; com tal potência, a operação, tal como configurada, torna-se inviável, independentemente do preço. Discutir apenas tarifas, descurando o vector “quantidade”, é um falso conforto.

É neste quadro que se discutem valores e volumes. Notícia que circula na média indica que a Eskom terá informado ao seu cliente Motraco-Mozal, que a partir de Abril de 2026 a tarifa será revista em alta e poderá estar no tecto de cerca de USD 90 por MW. Uma subida exponencial, e que corresponde quase o dobro da tarifa anterior. A aluminaria admitiu uma subida até ao limite máximo de 50 dólares por MW – relevante face aos patamares anteriores – a qual a ESKOM ainda não aceitou. A mesma proposta da Mozal foi à Moçambique, mas a HCB objecta por considera-la abaixo do custo de fornecimento e que significaria passar a subsidiar uma multinacional com recurso a um activo público. Para esta uma tarifa de USD 64 por MW seria uma contraproposta a considerar. 

Entre esse vai e vem, o Estado fez bem em clarificar que não colocará a HCB a vender abaixo de um patamar que comprometa a sua solvência e a sua missão. A prudência financeira é, aqui, sinónimo de responsabilidade intergeracional: uma HCB fragilizada significaria menos capacidade de manutenção do activo, menor previsibilidade para a electrificação doméstica e menor margem de manobra para assegurar o reforço do seu balanço para catapultar e financiar investimentos de reabilitação e expansão. Também é sensato exigir que qualquer concessão de preço, se alguma vez ocorrer, não se traduza num subsídio a fundo perdido. Mas é igualmente verdadeiro que uma paragem abrupta da MOZAL teria custos macroeconómicos (e sociais não triviais: impacto na balança de pagamentos e nas entradas líquidas de divisas; desarticulação de um ecossistema de fornecedores, serviços e actividades a jusante). 

O interesse nacional não está nem em demonizar uma empresa que opera sob regras vigentes, nem em hipotecar um activo público que é, em linguagem simples, a nossa “galinha dos ovos de ouro” energética. O interesse nacional está em maximizar o valor social do nosso recurso escasso – energia limpa – num horizonte de longo prazo. Para o efeito, sem o prejuízo desta última, o governo deve tomar liderança e encontrar uma solução realmente interessa o país, que inclui a possibilidade de continuidade da Mozal.

Competitividade: o que dizem os números 

A controvérsia em torno da revisão da tarifa da eletricidade fornecida pela Hidroelétrica de Cahora Bassa (HCB) à Mozal pode ser analisada a partir de dois cenários alternativos de tarifa unitária: 50 USD MWh e 60 USD MWh. Em ambos os casos, importa compreender como a posição relativa de custos da Mozal muda na curva global de custos de produção de alumínio, em contextos “sem CBAM” e “com CBAM”. (Para mais detalhes sobre o CBAM veja: https://opais.co.mz/ou-tributamos-nos-ou-tributam-eles-como-mocambique-pode-sair-da-crise-fiscal-com-o-cbam-ue/).

Para a presente análise, recorremos à proposta e análise de Wolfram & Pereboom, investigadoras do MIT-EUA, desenvolvida no âmbito do seu trabalho com o International Growth Centre em Moçambique. O recurso a dados provenientes de terceiros confere à nossa abordagem maior solidez e credibilidade, permitindo-nos analisar a matéria com distanciamento crítico, livres de paixões e favoritismos, e reforçando de forma significativa a imparcialidade e a objetividade da interpretação apresentada.

Adicionalmente, antes de detalhar os cenários, convém esclarecer o conceito de percentil de forma prática. Quando se ordenam fundições de alumínio do custo mais baixo para o mais alto, a posição de uma empresa pode ser expressa pelo percentil. Dizer que uma fundição está no 15.º percentil significa que 15% dos concorrentes têm custos iguais ou inferiores e 85% têm custos superiores; estar no 39.º percentil significa que 39% são mais baratos e 61% mais caros (100%-39 = 61); no 69.º percentil, 69% são mais baratos e 31% mais caros. Percentis mais baixos traduzem vantagem relativa de custo; percentis mais altos refletem desvantagem. É um indicador de posição na fila de custos, não uma medida direta de lucro ou prejuízo. A leitura correta, portanto, é probabilística: quanto mais à esquerda na curva (percentil baixo), maior a folga potencial para competir em preços num mercado internacional.

Como estamos hoje?

Com base nos dados do Wood Mackenzie Smelter Report, que abrange aproximadamente 153 fundições de alumínio em 2023, a Mozal encontra-se posicionada no 18.º percentil. Em outras palavras, o seu custo de produção é inferior ao de aproximadamente 82% das empresas do setor (cerca de 125 empresas de fundições). Assim, a Mozal ocupa hoje o 28.º lugar, num universo de 153 empresas, como uma das unidades com menores custos de produção a nível mundial.

Fonte: MIT (Wolfram & Pereboom)

Como estaremos no futuro?

  • Primeiro Cenário USD 50 MWh

No cenário de USD 50 MWh, proposta feita pela Mozal, ela enfrentaria um custo unitário de energia superior ao observado em 2023 (32% mais cara). Quando se compara a sua posição relativa, sem considerar custos advindos do imposto de carbono nos concorrentes a ser introduzido a partir do próximo no da UE (isto é, assumindo apenas a atualização de eletricidade por inflação nos pares), a Mozal desloca-se para da posição 18. º para 39.º percentil com esta nova tarifa. Contudo, ficaria mais barato apenas do que 61% (cerca de 93 empresas) do mercado, passando a ocupar a 60 º posição. Em termos práticos, quase quatro em cada dez fundições ficariam com custos iguais ou inferiores, e seis em cada dez com custos superiores. 

A introdução do mecanismo europeu de tributação do carbono na fronteira (CBAM) altera substancialmente o cenário acima descrito. Com a aplicação deste instrumento, que obriga os concorrentes a suportar o imposto associado às suas emissões de carbono, a posição competitiva da empresa melhora para cerca do 15.º percentil. Esta evolução decorre do facto de a maioria das fundições recorrer a energia proveniente do carvão, sujeitando-se, portanto, a encargos fiscais elevados. Em contrapartida, a Mozal, cuja produção assenta maioritariamente em energia hídrica, enfrenta uma carga tributária bastante inferior, o que lhe permite reposicionar-se entre os produtores de alumínio com custos mais reduzidos a nível global. 

Fonte: MIT (Wolfram & Pereboom)

  • Segundo Cenário USD 60 MWh

No cenário de 60 USD/MWh (58% mais cara que 2023), a Mozal enfrenta um custo unitário de energia mais elevado. Sem CBAM, a sua posição relativa recua para a zona do 69.º percentil, ou seja, passa a estar entre o terço mais caro da distribuição, o que, num mercado internacional pressionado por preços de referência, pode exigir maior disciplina sobre eficiência operacional e contratos de fornecimento de matéria-prima. Mais continua mais eficiente que 31% (cerca de 47 empresas no mercado mundial).

Assim como no primeiro cenário, com CBAM, porém, observa-se recuperação exponencial para cerca de 26.º percentil (o custo passa a ser inferior a 74% de todas as empresas do sector): e a Mozal volta a situar-se no primeiro quartil de competitividade, ou seja, na elite das empresas de com custos mais baixo da industria. 

Fonte: MIT (Wolfram & Pereboom)

Em síntese, a indústria do alumínio revela-se extremamente sensível a variações no preço da energia, dada a sua relevância na estrutura de custos. A proposta da HCB implicaria um aumento de cerca de 58% no custo da eletricidade face a 2023, pressionando a competitividade da Mozal, ainda que com o mesmo ela possa permanecer dentro das fronteiras dos custos, tomando em consideração a dinâmica deste mercado. O aspeto mais relevante deste artigo, contudo, reside no facto de a Mozal beneficiar do uso de energia de origem hídrica (limpa), o que lhe confere uma vantagem comparativa em relação à maioria das fundições que recorrem a fontes não limpas que terão que pagar impostos mais altos sobre as emissões a partir de Janeiro de 2026. Assim, com implementação obrigatória e definitiva do CBAM, no mercado europeu, no próximo ano – principal destino de cerca de 90% da produção da Mozal- a Mozal continuar a ser uma das empresas com custos mais baixos do que 111 empresas, num total de 153 o nível mundial. Ou seja, considerando os cenários acima, a proposta da HCB não se revelou ainda um elemento critico per si que justifique a saída Mozal em Moçambique.  

Como decidir, então? 

No fim do dia, a pergunta certa não é “HCB ou Mozal?”. É: como transformamos a nossa energia limpa num pacto produtivo, justo e duradouro  que pague salários, forme jovens, fortaleça o Estado e dê ao país uma indústria que faça sentido num mundo que muda depressa? Longe de oferecer soluções acabadas, este artigo insta ao aprofundamento do debate, e uma análise mais ampla da situação com base em evidencias: Abaixo algumas sugestões se soluções:

  • Transparência entre as partes: tanto a Mozal como a HCB devem partilhar, de forma clara e aberta, os números e os desafios que atualmente enfrentam, sem isso não possível chegar-se a uma solução justas para as partes;
  • Arranque do mercado de carbono em Moçambique: com a implementação do CBAM europeu, uma parte do valor criado pela energia limpa pode “fugir” para fora se o país não tiver enquadramento legal e institucional que capture internamente a tributação de carbono. Em bom rigor: ou tributamos nós, ou tributam eles. A urgência está em criar as regras, a autoridade competente, o registro e os mecanismos de MRV (monitorização, reporte e verificação) que deem integridade ambiental e credibilidade comercial a esse mercado;
  • Fórum técnico-político sob liderança da Presidência: juntar os seguintes sec
  • 3T2 Ntores: Energia, Economia e Finanças, Indústria e Comércio, Trabalho, Ambiente, Banco de Moçambique, reguladores, universidades e centros de pesquisa. Um task force com prazo certo para produzir um parecer público: premissas auditáveis (trajetória de preços regionais e câmbio), OPEX/CAPEX da HCB (manutenção e amortização da reversão), compromissos Mozal (emprego, compras locais, formação), impacto fiscal em cada cenário, sensibilidade à cotação do alumínio e riscos de interrupção. A transparência técnica dá legitimidade política e estabiliza expectativas. Sem esta base comum, o país fica prisioneiro de narrativas interessadas, por vezes tecnicamente frágeis;
  • Preço (com partilha de risco): faz sentido procurar um valor médio que proteja a HCB e seja suportável para a Mozal, mas amarrado a uma indexação dupla: por um lado, ao custo de oportunidade da energia hidroelétrica exportável; por outro, a um índice internacional do alumínio (como as referências da LME). Assim, quando o alumínio cai e esmaga margens industriais, a tarifa ajusta-se em baixa dentro de uma banda; quando o alumínio sobe e gera rendas extraordinárias, a HCB captura parte desse ganho. Para o Estado, isto converte volatilidade em previsibilidade fiscal e financeira – e dá racionalidade ao debate público, hoje dominado por números soltos e pressões contrapostas.
  • Quantidade (com segurança de abastecimento): o acordo tem de assegurar potência firme suficiente (950 MW) combinando blocos da HCB com blocos regionais (ESKOM)por forma a perfazer o quantum requerido pela aluminaria, mas com regras claras de alocação de risco de interrupções e mecanismos automáticos de compensação. 

Contrapartidas do Estado: qualquer “desconto” relativo face ao preço ideal da HCB deve transformar-se em activo público verificável: por exemplo (i) articipação adicional do Estado (ou da HCB) no capital da Mozal: proporcional ao valor presente do benefício concedido-alinhando incentivos e criando upside para o país em ciclos de preços favoráveis; (ii) Compromissos vinculativos de investimento a jusante (indústria transformadora como laminação, janelas e portas de alumínio, entre outros) e conteúdo local (fornecedores, formação técnica, estágios), com metas e mecanismos de avaliação pública anual; (iii) Revisão do pacote fiscal: menos isenções horizontais e mais instrumentos calibrados a desempenho; (iv) Canalização de parte das receitas em divisas através do sistema financeiro nacional, reforçando reservas e profundidade do mercado cambial. e um calendário público de avaliação anual, com gatilhos de revisão automática se metas não forem cumpridas.

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