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Uma nota sobre o teatro na cidade de Maputo em 2010

Por: Venâncio Calisto

O ano de 2010, que foi o ano que marca a minha iniciação no mundo das artes e do teatro em particular, é para mim a época de maior efervescência cultural na cidade de Maputo. Se os anos noventa do século passado representam o auge da actividade teatral na capital do país, em termos de criações, públicos e internacionalização das companhias, 2010 pode ser considerado o ano do renascimento de uma nova geração de artistas e iniciativas teatrais.

Em 2010, eu andava na décima classe, na escola secundária Noroeste 2, havia perdido um ano por faltas excessivas na disciplina de Educação Física, é que desde pequeno eu não djimo o corpo, eu djimo a mente. Brincadeiras à parte. A segunda década do nosso milénio começou em grande. O recém-criado curso superior de teatro na ECA já começava a dar os primeiros frutos. Novos textos, novos autores e, sobretudo, novas técnicas de fazer teatro começaram a despontar por todo lado. As velhas companhias já se abriam para dialogar com os novos actores.

O festival amador de teatro de inverno estava na transição para o que é hoje, internacional e o mais regular. Foi justamente nesse período que eu, atraído pelas multidões de actores que desciam a cidade como um cortejo de carnaval, havia, no semblante de cada um deles, um convite expresso, uma conquista irrecusável. Quando dei por mim estava no palco do mapiko, a tremer de frio e adrenalina. Quem é o fantasma? Texto do meu mestre Nandjir foi o espectáculo mais marcante. Fazia de protagonista e morria no palco, como sempre sonhei. Dali em diante, já não havia volta a dar. Primeiro foram as oficinas de representação, encenação e produção teatral que o Girassol não se cansava de organizar. Depois, a necessidade de aprofundar a alegria de habitar um palco.

O velho Dabula foi peremptório: Vá já se inscrever ao curso de Teatro na ECA. Depois ajudou-me a pagar as matrículas e propinas. Acompanhou todo o meu percurso estudantil. No seu escritório, no Ntsindya, corrigia-me as provas e dava-me infinitos TPC. Mas tudo começou em 2010, o mítico ano do mundial nas terras africanas. Dançamos tanto Waka Waka.

Porque o teatro em Maputo era uma alegria… O Mutumbela parecia procurar se reinventar. Graça Silva e Jorge Vaz assumiram a responsabilidade. O inimigo do Povo, o Xapa 100 My Love, a Máquina Extraviada, Hamlet… Foram tantos espectáculos, tanto alimento… O Luarte, na vanguarda do teatro contemporâneo moçambicano chocava-nos com tanta beleza e criatividade, as encenações do Mambucho e do Eliot Alex, não esqueço-me do Niketche… Em 2010 nasceu a minha fome por arte, mas por nada nesse mundo tomaria a sopa de Lá na Morgue, Dadivo José que me perdoe.

Alcochete, 21 de Março de 2023

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