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Tricampeões mundiais de salto à corda retiram-se de provas internacionais

“É o fim. Parece mentira mas é verdade. Terminar é tão ruim. Porque tem que ser assim?”, diz o talentoso Matias Damásio, numa das suas composições. A despedida, inacreditável, parece ser inevitável com os tricampeões mundiais de salto à corda -na especialidade de “rope skipping”-, eles que elevaram bem alto a bandeira de Moçambique e fizeram o “Pátria Amada” ecoar em majestosos palcos do Mundo. E mereceram todas as honras, tendo sido recebidos no seu bojo e pelo Chefe de Estado. Mas…a realidade no terreno, onde começa todo o processo de treinamento e preparação dos campeões mundiais, é dolorosa. A Federação Moçambicana de Ginástica, a título de exemplo, é obrigada realizar todas as provas a custo próprio.

Para além da corrida à busca de fundos, os atletas da selecção nacional de salto à corda foram várias vezes os últimos a chegar aos palcos dos Mundiais devido as desgastantes viagens a que foram sujeitos.

Em 2015, na França, mesmo depois de se sagrarem bicampeões mundiais num universo de 23 selecções, os ginastas sentiram-se marginalizados e foram mesmo ao extremo de decidir abandonar as provas internacionais.

Aliás, partiram para o território francês sem pocket money e nenhum dirigente acompanhante.

Sensibilizados a defender o título e a pátria, num mar de promessas de apoio financeiro, reconsideraram a sua posição e, em 2017, conquistaram o “tri” nos EUA.

Um feito inédito que esconde, na verdade, as contrariedades que passaram durante o processo de preparação bem como durante a competição.

De resto, a sua participação na prova somente foi possível mediante uma promessa de se fazer o pagamento de 4 mil USD à “World Jump Rope Federation”.

Chegou-se, pasme-se, ao ponto de a federação internacional ter ameaçado retirar os três títulos conquistados por Moçambique e banir dos Mundiais caso a dívida não fosse paga.

’Depois de tudo que sofremos para participar em provas internacionais a custo próprio, o que nos resta é focarmo-nos na massificação. Não vamos mais participar de nenhum Mundial. Agora, vamos trabalhar ao nível interno com crianças de escolas privadas e públicas porque o salto à corda existe e é um desporto a ser respeitado’’, sentenciou Elves Tembe, director-técnico da Federação Moçambicana de Ginástica.

A participação no Campeonato do Mundo, na França, foi possível porque os organizadores assumiram parte das despesas da selecção nacional de salto à corda porquanto pretendiam mostrar o trabalho que se está a desenvolver em África.

“A Franca predispôs-se a pagar uma parte do valor porque queria todo custo mostrar que o projecto dos países africanos tinha valido a pena. Restava a Moçambique pagar o restante valor obrigando desta forma a Federado a usar o valor que o Fundo de Promoção Desportiva aloca para o sustento das Associações, e tivemos que bater muitas portas que recusaram-se a abrir foi uma ginástica muito difícil mas que graças aos Ceus conseguimos”, explicou Tembe.

Quatro anos antes, ou seja, em 2011, a selecção nacional de ginástica deu aulas ao mundo da modalidade, despertando a atenção de potências como os EUA.

Veio, em reconhecimento das qualidades dos ginastas moçambicanos, o convite para a primeira aparição no Mundial, na França. “Para nós, aquela vitória significava mudança. Pensamos que nunca mais voltaríamos a sofrer para realizar provas porque, depois deste resultado, não só Moçambique mas também o mundo passou a saber que somos capazes. O que fez crescer as nossas espectativas foi a recepção triunfal que tivemos pelo Presidente da República e o ex-ministro Juventude e Desportos. Perguntaram quais eram as nossas dificuldades e fizeram promessas que nunca foram cumpridas”, desabafou Elves Tembe.

Seduzidos e abandonados?

“Quando fomos convidados a participar do mundial em 2017, ficamos muito receosos e não queríamos mais passar pelo mesmo sofrimento mas o Ministério da Juventude prometeu pagar as passagens e as inscrições. Mais uma vez passámos pelo mesmo problema mas tomámos a decisão de participar e tornamo-nos campeões mundiais sem mesmo ter pago as inscrições’’, afirma Tembe.

Tembe diz, igualmente, que para que o Ministério da Juventude e Desportos pagasse a dívida de 4 mil dólares contraída em 2017 foi preciso muita pressão.

Tembe salienta que “o mínimo que esperamos é que sejamos tratados com o devido respeito, porque damos a vida pelo país, menos na gala nacional de Desporto não ouvimos pelo menos alguém dizer parabéns mesmo que não fosse para dar o prémio’’.

Os atletas da seleção nacional de salto à corda sempre viajaram para as provas sem dirigentes e, segundo a fonte, era ele quem desempenhava este papel situação que é “ desgastante”.

Sustenta a sua afirmação na pesada experiência de “participar das reuniões e ouvir as regras de disciplina e ganhar tempo para realizar o treino e quase passava as noites em claro”.

Tembe relata que o seu grupo sempre foi o último a se apresentar nos palcos onde eram realizadas as provas, chegaram mesmo a ser os únicos na pista sem a presença das outras selecções.

Em 2017, nos EUA, os ginastas moçambicanos somente apresentaram-se na pista no mesmo dia que chegaram aos EUA. Lembra que até dormiram sem jantar. O único factor que contribuiu para que conseguissem realizar a prova, diz, foi a ordem de jogos porque começavam com iniciados.

A fonte lembra que, quando subiram ao pódio pela terceira vez em 2017, pela falta de dirigentes, foi entoado o “Viva a Frelimo” e não “Pátria Amada” porque ninguém fez a actualização.

 

 

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