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Teodato Hunguana diz que sistema de governação é de “centralismo presidencialista absoluto”

Teodato Hunguana diz que o sistema de governação em Moçambique é de centralismo presidencialista absoluto, em que o Presidente da República tem “ultra-poderes”. O antigo juiz do Conselho Constitucional avança que este excesso de poderes propicia a corrupção, porque não há mecanismos de controlo.

O antigo juiz do Conselho Constitucional, Teodato Hunguana, falava, ontem, como orador numa palestra organizada pelo Centro de Integridade Pública (CIP), onde estiveram como oradores Ivo Garrido, Paulina Chiziane e Severino Ngoenha.

“De um sistema de centralismo democrático ‘ultra-presidencialista’, desembocamos hoje num sistema que podemos designar de ‘centralismo presidencialista absoluto’. Num tal sistema que tudo gira à volta deste presidencialismo absoluto, sendo que a autonomia das instituições é relativizada e, por conseguinte, não há efectivamente a independência; não há controlo nem responsabilização. Não há checks and balances e tudo fica, directa ou indirectamente, dependente da vontade de quem detém o poder”, disse Teodato Hunguana.

O jurista disse ainda que, num sistema de ‘checks and balancs’, o Executivo deve responder ao Parlamento e que, neste momento, tanto o Governo, através do Primeiro-Ministro e outros ministros, só passam informações à Assembleia da República, sem que sejam, de facto, fiscalizados pelos deputados.

“No actual funcionamento do nosso sistema político, onde o Presidente (da República) eleito tem sido invariavelmente o presidente do partido vencedor das legislativas, significa que a independência da própria Assembleia da República fica comprometida ou relativizada”, avançou Hunguana, dizendo ainda que o poder judicial está também comprometido, pois há pErerrogativas atribuídas ao Presidente da República, designadamente na nomeação dos membros destes órgãos.

O jurista disse que é por isso que a corrupção floresce; na medida em que detém o poder pode decidir sobre tudo sem ser responsabilizado. “Eis porque todos os partidos e todos aqueles que se fazem às eleições, o seu objectivo último é ganhá-las a todo custo. Isto nem que seja necessário arrancar o poder. Isto como condição para a conquista ou captura deste eixo do qual gira todo o sistema: o centralismo presidencialista absoluto, como motor o Presidente (da República)”, explicou.

Segundo Hunguana, os que participam das eleições “lutam para conquistar a sua vez nesse giratório processo de insaciável acumulação”, acrescentando que não se trata apenas de uma situação psicológica, mas que o centralismo servia para a acumulação da riqueza.

Reconheceu ainda que o poder corrompe e que ele próprio na posição de Presidente da República poderia deixar-se corromper pelo sistema que lhe dá poderes privilegiados: “o poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente”, concluiu.

Por seu, Ivo Garrido diz que os altos níveis de corrupção revelam que o país está “doente” e em crise. O antigo ministro da Saúde considera que os problemas de corrupção vão para além do Governo, estendendo-se em todos os extractos da sociedade.

“Oiço de dizer em linguagem corrente que ‘a corrupção é um cancro, corrói a sociedade, impede o desenvolvimento e aumenta as desigualdades’. A mim parece-me que a corrupção é um sintoma de uma doença mais séria que afecta a sociedade”, defendeu Garrido,  tendo avançado que é preciso que todos combatam o mal e não se concentrar apenas no Governo, pois seria reducionismo.

Recorrendo às confusões retratadas na imprensa envolvendo a Comunidade Maometana de Moçambique, a Igreja Velha Apostólica e a impugnação dos resultados eleitorais na Ordem dos Advogados de Moçambique, o antigo ministro disse que a corrupção está em todos os sectores e não se pode culpar o Governo por toda a corrupção existente no país.

Por seu, turno a escritora Paulina Chiziane e o académico Severino Ngoenha aconselharam as organizações da sociedade civil a terem sempre uma postura de pessoas próximas ao povo, e não o contrário; a não viverem ostentando, por um lado, e por outro, criticarem o Governo por má gestão da coisa pública.

A palestra organizada pelo CIP era alusiva aos 18 anos da criação da organização, tendo contado com depoimentos dos anteriores directores da instituição, nomeadamente Marcelo Mosse e Adriano Nuvunga, para além do actual director, Edson Cortez.

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