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Standard Bank suspenso da actividade cambial por um ano

O Banco de Moçambique suspendeu o Standard Bank de toda a actividade cambial e de conversão de divisas, por um período de até um ano, e aplicou uma multa de pouco mais de 290 milhões de Meticais, como resultado do que classifica de “graves infracções de natureza prudencial e cambial”.

De acordo com um comunicado de imprensa emitido nesta tarde, o Banco Central detalha as infracções cometidas pelo Standard Bank e dois dos seus gestores, nomeadamente, Adimohanma Chukwuma Nwokocha (Administrador-delegado), e Carlos Domingos Francisco Madeira (Director da Banca Corporativa e de Investimentos).

“As infracções cometidas incluem, mas não se limitam a: i) manipulação fraudulenta da taxa de câmbio; ii) instalação e implementação de uma rede de pagamentos ilegal sediada fora do país, que, no geral, se assemelha à SIMOrede; iii) realização de operações irregulares de derivativos financeiros para a cobertura de risco associado à flutuação cambial, envolvendo o Director da Banca Corporativa e de Investimentos como cliente; iv) não regularização dos termos de compromisso das exportações; e v) não entrega ao Banco de Moçambique de gravações nos prazos estipulados, em clara acção de obstrução à actividade de inspecção”, descreve o comunicado.

Para além das medidas aplicadas ao banco em referência, a autoridade monetária decidiu suspender o Administrador-delegado do exercício de cargos sociais e de funções de gestão em instituições de crédito e sociedades financeiras no país, por um período de seis anos e aplicou-lhe uma multa no valor total de 6.380.090 (seis milhões, trezentos e oitenta mil e noventa meticais).

Para Carlos Domingos Francisco Madeira, o Banco Central aplicou uma multa no valor total de 14.036.198 (catorze milhões, trinta e seis mil e cento e noventa e oito meticais) e uma inibição do exercício de cargos e de funções de gestão em instituições de crédito e sociedades financeiras no país por um período de seis anos.

Na sequência das penalizações aplicadas, o Banco de Moçambique salienta que “com vista a salvaguardar os interesses dos clientes e de outros interessados, bem como assegurar a estabilidade do sistema financeiro, os accionistas do Standard Bank Moçambique, S.A. estão a colaborar com o Banco de Moçambique, por forma a sanar as irregularidades acima mencionadas”.

“Neste contexto, foram elaboradas medidas de acompanhamento contínuo que poderão ditar o levantamento da suspensão ao Standard Bank, S.A., antes do prazo estipulado, mediante avaliação positiva dos resultados”.

“A MAIOR SANÇÃO NÃO É A FINANCEIRA, É A INIBIÇÃO DO STANDARD BANK”

O Banco de Moçambique decidiu sancionar o Standard Bank, seu administrador-delegado e o director de banca corporativa e de investimentos por terem cometido diversas infracções, com destaque para a manipulação fraudulenta da taxa de câmbio, bem como, a instalação e implementação de uma rede de pagamentos ilegal sediada fora do país que se assemelha à SIMOrede.

Em entrevista ao “O País”, o economista Yasfir Ibraimo explica as sanções e diz que com a multa, o Standard Bank perde o equivalente a 5% do lucro líquido que obteve em 2020. Por isso, para si, a maior sanção que o banco teve é a sua suspensão, por até um ano, de exercer a actividade cambial de conversão de divisas.

De forma simples, peço que explique estas infrações cometidas pelo Standard Bank e os respectivos impactos na banca, em particular, e na sociedade como um todo?

Essas sanções derivam daquilo que é a inspecção da supervisão bancária junto do Standard Bank e coincidentemente, essas operações acontecem num período em que a taxa de câmbio teve um choque nunca antes visto no nosso panorama financeiro recente, o que significa que alguma actividade fora daquilo que são as normas financeiras e fora daquilo que é o regulamento do mercado cambial.

Foram exercidas pelo Standard Bank, o que levou o Banco Central a sancionar este banco. Isto, por um l ado, v em m ostrar a f ragilidade existente no nosso sistema financeiro, porque um dos maiores bancos da nossa praça está envolvido em uma fraude no sistema financeiro de grande dimensão e olhando também aos funcionários do banco envolvidos neste processo que são seniores, com posições relevantes naquilo que é a relação comercial entre o banco e os seus clientes e também com o próprio banco central.

Essas sanções trarão implicações, olhando, primeiro, à sanção que o próprio Standard Bank sofre como banco que vai pagar em termos percentuais, comparando com o seu último exercício económico, cerca de 5% do lucro líquido que obteve no período de 2020; do ponto de vista de imagem do próprio banco; e também para a economia como um todo. O Standard Bank vê-se privado por um ano de realizar qualquer transação de conversão em moeda estrangeira. Nós sabemos que este é um dos bancos que tem maior exposição em relação às transações em moeda estrangeira, dado à capacidade de mobilização de moeda estrangeira que este possui. Isso vai afectar, primeiro, os clientes; as empresas corporativas; vai afectar ainda as famílias e as Pequenas e Médias Empresas, tendo em conta aquilo que é a estrutura económica do país que é extremamente importador, um país em que os bancos comerciais são chamados a fazer a intermediação financeira com o resto do mundo e o Standard Bank sendo um dos bancos que está ligado aos grandes projectos de investimento estrangeiro no país, isso, de certa forma, vai impactar na relação com o resto do mundo e também com essas empresas.

E do ponto de vista das famílias, isso vai implicar a migração para outros bancos, vai obrigar as famílias a redefinirem a sua ligação com o próprio banco, porque, neste momento, a continuar as operações do próprio banco com o resto do mundo, será feito nos moldes que o Banco de Moçambique está a utilizar, isto é, as divisas são transferidas para outros bancos comerciais e estes poderão fazê-lo para o resto do mundo.

Isto é uma estrutura muito complexa e leva muito tempo de reacção e as famílias e empresas não irão manter esta plataforma de transações e vai levar as famílias e empresas a migrarem para outros bancos dentro do sistema financeiro nacional por forma a flexibilizar os processos de transações financeiras. Isso vai implicar uma queda do volume de depósitos, do volume de transações do banco, tendo em conta aquilo que é o interesse desses agentes económicos de transação de divisas e por outro lado vai impactar no próprio balanço económico do Standard Bank nos seus próximos exercícios económicos, tendo em conta que as comissões que os próprios bancos comerciais ganham com essas transações com o resto do mundo, tendo em conta a entrada de divisas que o banco recebe e com isso permite-lhes fazer acumulação de divisas e uma das margens de lucros desses bancos são as transações de divisas no mercado cambial interbancário.

O que significa que o Banco de Moçambique está atento ao que acontece no sistema financeiro e vai apertar a supervisão bancária. Uma das sanções é que o Standard Bank manipulou a taxa de câmbio e essa manipulação inviabiliza a condução da política cambial.

Em palavras mais simples, neste caso, o que seria a manipulação da taxa de câmbio?

Conforme vem no comunicado do banco central, os bancos comerciais criam mecanismos de protecção de riscos de flutuação cambial entre o sector empresarial que solicita ao banco uma cobertura cambial para minimizar preocupações de riscos e isso afecta as suas previsões de cash flow e as suas previsões de riscos e esses agentes económicos, as famílias e empresas, fazem acordos futuros de taxas de câmbio, onde uma determinada taxa de câmbio é acordada para ser paga em um determinado período de tempo. Portanto, quando há um choque da taxa de câmbio, como por exemplo, a que nós verificamos, isso impacta na rentabilidade dos próprios bancos e de certa forma podem ser utilizados mecanismos para forçar uma depreciação da nossa moeda, criando escassez aparente de divisas no mercado cambial.

Por exemplo, se o Standard Bank é um dos bancos com capacidade de maior acumulação de divisas, é um banco que tem maior possibilidade de intervir no mercado cambial para criar algum choque na taxa de câmbio, por exemplo, forçando uma aparente escassez de divisas, pode se presumir que foi o que de certa forma aconteceu no mercado, quando o metical começou a apreciar em relação ao dólar norte-americano e isso levou aos bancos a emitirem pagamentos, mas em algum momento, não encontravam divisas para fazer esses pagamentos. Então, isso pode ser visto como uma possível manipulação da taxa de câmbio para forçar uma taxa de câmbio que vai de acordo com aquilo que

é a projecção que o banco faz para os seus pagamentos futuros. Por outro lado, temos a influência dos gestores do banco que têm acesso à informação privilegiada que o grosso dos agentes económicos não têm e podem com base nesses instrumentos intervir à margem daquilo que é a regulamentação cambial para forçar uma taxa de câmbio que melhore a situação do banco e desses gestores, porque esses têm um bonos pela sua performance nos mercados.

Outra infracção apontada pelo Banco de Moçambique que foi cometida pelo Standard Bank é a instalação e implementação de uma rede de pagamentos ilegal sediada fora do país que no geral se assemelha à SIMO rede. O que o banco central quer dizer com essa colocação e caso as infrações continuassem, que riscos podiam ser esperados no sistema financeiro e na economia nacional no geral?

Primeiro, temos uma questão de pagamentos ilegais que são feitos para o exterior, o que significa saída de divisas no nosso país para o resto do mundo e isso contribui para o desgaste das reservas internacionais líquidas que o Banco de Moçambique procura acumular. E o Banco de Moçambique tem como um dos objectivos ter o controlo de divisas que estão em circulação na nossa economia e as divisas que saem e entram: também faz parte do regime de controlo de branqueamento de capitais, de financiamento ao terrorismo e da fuga ao fisco. Os bancos comerciais funcionam como intermediários financeiros e todas as saídas de divisas do país carecem de autorização junto do banco central, até mesmo em relação aos pagamentos antecipados, os bancos comerciais, à posterior, devem remeter ao banco comercial o comprovativo de que a mercadoria ou os serviços que foram pagos já estão concretizados e já estão em nosso país.

Uma das sanções que o banco coloca é que esses comprovativos não eram emitidos ao banco central, o que significa que, ordenou-se pagamentos de determinados bens e serviços ao resto do mundo e em contrapartida, o banco central não teve acesso a esses documentos, o que pode em parte significar pagamentos de bens ilícitos e fuga ao fisco e, por outro lado, temos um espaço em que o banco central acaba não tendo controlo de finalidade das divisas que estão a ser usadas e nós sabemos que há fugas de capitais no nosso país para o resto do mundo e os bancos comerciais também, em parte, colaboram com este mecanismo e a sansão do banco central em relação a este especto mostra que há um conjunto de pagamentos feitos ao exterior sem o devido comprovativo e em parte sem a devida autorização do próprio banco central, o que infringe as normas do próprio Banco de Moçambique relativa à regulamentação do mercado cambial.

No entanto, a continuidade dessas acções por parte do Standard Bank teriam implicações no próprio mercado cambial. Nós sabemos que a taxa de câmbio em Moçambique é uma variável extremamente importante para os objectivos de política monetária, isto pela relação que existe entre a taxa de câmbio e a inflação. Essas acções a continuarem, poderiam inviabilizar os esforços do Banco de Moçambique de estabilização da taxa de câmbio e por outro lado poderiam obrigar o banco central a um maior desgaste de divisas no mercado cambial, na tentativa de estabilizar a taxa de câmbio e isso pode afectar a capacidade do banco central de conter a inflação, pode afectar a capacidade de importação da economia de bens essenciais como combustíveis e equipamentos, assim como colocar Moçambique no mapa de financiamento de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo.

Como classifica essas sanções do Banco de Moçambique em termos de dimensão?

São sansões graves, tendo em conta a inibição do próprio banco de intervenção no mercado cambial. Do ponto de vista de sansões monetárias, penso que isso está ao alcance do próprio banco. Se o banco tivesse que pagar essas sansões e amanhã ter a entrada no mercado cambial aberta, isso seria benéfico para o próprio banco e este, rapidamente, transferiria esse montante para o banco central.

Mas, a maior sanção não é a financeira, é a inibição do Standard Bank por um período de um ano de qualquer intervenção de conversão de moeda estrangeira no mercado cambial e isso afecta a actividade do banco, que é um dos maiores em termos de exposição ao mercado externo. Essas investigações devem ser estendidas a outros bancos.

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