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Residentes de Mocímboa da Praia voltam a viver terror devido a recentes ataques

Foto: O País

Cerca de três anos depois de relativa segurança e tranquilidade, Mocímboa da Praia voltou, desde Dezembro último, a ser alvo de ataques terroristas e, até ao momento, há registo de dezenas de mortos, centenas de casas incendiadas e várias aldeias parcialmente abandonadas.

Além de medo e terror, essa nova onda de ataques provocou um novo drama humanitário e, actualmente, as poucas famílias que regressaram às suas aldeias, logo após a retirada do grupo armado, vivem numa situação desumana, com falta de quase tudo, desde abrigo, comida, até vestuário.

“Eles queimaram a minha casa com todos os bens lá dentro. Perdi cama, motorizada e toda comida que tínhamos. Agora, a família vive numa barraca que construímos no quintal, e sobrevivemos graças à boa vontade dos familiares, amigos e pessoas de boa vontade que, às vezes, quando têm, partilham connosco”, contou Sebastião Ntimauke, um dos habitantes de Chibanga, uma aldeia que fica a cerca de 10 quilómetros da vila de Mocímboa da Praia.

Durante o ataque a Chibanga, segundo revelaram as autoridades comunitárias da aldeia, o grupo armado queimou vários bens da população e roubou produtos alimentares nos estabelecimentos comerciais.

“Quando chegaram aqui, mataram três pessoas e queimaram 26 casas, em seis delas só queimaram camas e roupas. E depois passaram das barracas e levaram todos os bens de que precisavam, e o que ficou queimaram junto às barracas”, confirmou José Saide, líder comunitário da aldeia Chibanga.
Além de Chibanga, o grupo armado assaltou a aldeia Ntotwe, que fica a 18 quilómetros da vila-sede do distrito de Mocímboa da Praia. Segundo relatam alguns sobreviventes, o ataque ocorreu em plena luz do dia.

Em Ntotwe, outra aldeia de Mocímboa da Praia, que fica a cerca de 10 quilómetros de Chibanga, também foi alvo de ataques terroristas e, segundo relatam alguns sobreviventes, o grupo armado roubou vários bens e deixou rastros de destruição.

Aqui, atacaram no dia 03 (de Janeiro de 2024). Os disparos começaram por volta das dezasseis horas sem parar e prolongaram-se até à noite. Foi aí que vimos que a situação era mesmo grave e não tínhamos alternativa senão pernoitar nas matas. De manhã, quando eles se foram embora, nós voltamos para a aldeia e encontrei a minha casa e a barraca destruídas e vazias. Levaram arroz, óleo sabão e outros produtos básicos que eu vendia e, quando saíram, atearam fogo com tudo o que havia restado”, descreveu Lucas Damásio, um dos habitantes da aldeia Ntotwe que sobreviveu pela terceira vez a um ataque terrorista.

No ataque terrorista a Ntotwe, segundo as autoridades locais, perderam a vida três pessoas e foram incendiadas quarenta e cinco casas, além de pilhagem de outros bens da população.

“Dos cerca de mil habitantes até ao momento, regressaram apenas cerca de seiscentos. Algumas famílias que perderam tudo que tinham foram acolhidas em casa de familiares ou de amigos, mas outros, cansados de fugir e de viver dependente da boa vontade das pessoas, optaram por improvisar barracas nos quintais, e sobrevivem graças à solidariedade da comunidade”, disse Amur Chilindo, chefe da aldeia Ntotwe.

Os poucos sobreviventes dos ataques terroristas que tiveram a coragem de regressar às suas aldeias estão a tentar voltar à normalidade, mas algumas pessoas, especialmente as que perderam quase tudo que tinham, estão a passar por uma situação humanitária considerada dramática.

“Nós já solicitamos a nível da província para ver se se consegue com parceiros um apoio humanitário, sobretudo numa primeira fase, comida e sementes de produção e kits de abrigo, sobretudo lonas e tendas, já que estamos numa época chuvosa, para ver se as famílias conseguem passar por esta fase até à altura que vão conseguir reconstruir as suas casas queimadas”, alertou Sérgio Cipriano, Administrador de Mocímboa da Praia.

Enquanto se aguarda pela resposta do Governo a nível provincial, o distrito lançou um movimento de solidariedade a nível local e tem recebido apoio de alguns parceiros, mas, devido à gravidade da situação, tudo que tem conseguido é insuficiente.

De acordo com o administrador de Mocímboa da Praia, “dos apelos que fizemos, recebemos quase 30 kits da Médicos Sem Fronteiras, composto por lonas, mantas, utensílios domésticos e produtos de higiene, mas, devido ao elevado número de necessitados, tivemos de priorizar as famílias que perderam casa, comida e roupa”.

O regresso do grupo armado a Mocímboa da Praia está a preocupar a população, uma vez que, desde 2021, quando Moçambique recebeu as Forças Armadas da República do Ruanda, o distrito estava livre de ataques terroristas, que recomeçaram em Dezembro de 2023.

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