CARL SAGAN (EUA, 1934 —1996) foi um escritor, cientista, astrónomo, astrofísico, cosmólogo, entre outros oficios. Ele é autor de mais de 20 livros, entre ficção científica e diversas publicações científicas.
Sagan tornou-se conhecido não só pelos seus livros como também pela famosa série televisiva de 1980 “Cosmos: Uma Viagem Pessoal”, que ele mesmo narrou e co-escreveu. É considerado um dos divulgadores científicos mais carismáticos e influentes da história, graças à sua capacidade de transmitir ideias científicas de forma simples e compreensível para o público comum. Foi também um dos promotores da busca por inteligência extraterrestre através de vários projectos, entre os quais o SETI.
Foi ele igualmente quem instituiu o envio de mensagens a bordo de naves espaciais concebidas para viajar para além do sistema solar, destinadas a possíveis civilizações extraterrestres, informando sobre a nossa existência aqui na Terra. E uma dessas mensagens, talvez mesmo a mais refinada, é a que foi acoplada às naves Voyager. Trata-se de um Disco de Ouro, com indicações sobre a nossa localização na galáxia (Via Láctea), e inclui imagens e vários sons naturais, tais como trovões, vento, ondas do mar, cantos de pássaros, entre outros. Foi incluída também uma coletânea musical com obras de diferentes épocas e culturas. Foram igualmente registadas saudações em 55 línguas, das quais algumas africanas, como é o caso de Nyanja e de Nguni, entre outras. As sondas que levam esta mensagem foram enviadas em 1977 e, neste momento, encontram-se no espaço profundo, fora do sistema solar.
Foi a partir de livros e outras publicações científicas de Carl Sagan que comecei a desanuviar algumas áreas da minha cosmovisão, na verdadeira acepção da palavra, em relação às questões fundamentais como, por exemplo: “quem somos nós, de onde viemos, para onde vamos, onde começa e termina o universo?”. Tenho dito que desde que me conheço como pessoa, fui sempre um agnóstico em matéria de religião e filosofia. E Sagan não só abriu como também alargou o meu campo de visão e compreensão, impactando desde modo, e de forma profunda, a minha relação com as coisas, com o mundo e com a própria vida.
A oitava edição do relatório Riscos Globais, do Fórum Económico Mundial, de 2013, listou uma série de factores como, por exemplo, a descoberta de vida alienígena, o uso de “anabolizantes” para aumentar a capacidade cognitiva, a mudança radical das condições climáticas na Terra, que podem implicar em grandes dilemas éticos e provocar alterações na maneira como a civilização humana se organiza e em como ela se vê a si mesma. Com efeito, qualquer descoberta científica de fundo pode impactar, sobremaneira, tanto a nível individual quanto colectivo a nossa maneia de ser e estar no mundo.
A ciência leva sempre a melhor por ser uma forma de conhecimento que advém da observação e experimentação e, por isso, quanto a mim, é o único conhecimento credível. Mas então o que é realmente a ciência? No livro “Deus não Joga aos Dados”, escreveu Laborit: “Quando o homem do paleolítico encontrou um mamute, percebeu imediatamente que não podia enfrentá-lo. Fugiu correndo e, na incoerência aterrorizada da corrida, caiu e feriu o joelho num sílex. Compreendeu que o sílex era mais duro que o joelho. Ora, o homem é o único animal que reuniu essas diversas experiências para formular uma hipótese de trabalho (…) ‘após construir uma arma para enfrentar o mamute, o homem’ concebera uma hipótese de trabalho e verificara experimentalmente o seu valor. Era sem dúvida uma atividade científica."
Carl Sagan, na introdução ao seu livro “Cosmos”, escreve que “Em nossos dias, descobrimos um modo poderoso e elegante de compreender o universo, um me?todo chamado cie?ncia; ele nos revelou um universo ta?o antigo e ta?o vasto que as questo?es humanas parecem, a? primeira vista, ter pouca importa?ncia. Crescemos distantes do universo. Ele parecia remoto e irrelevante para nossas questo?es do dia a dia. Mas a cie?ncia descobriu na?o so? que o universo tem uma grandeza vertiginosa e exta?tica, na?o so? que ele e? acessi?vel a? compreensa?o humana, mas tambe?m que somos, num sentido muito real e de grande alcance, parte desse cosmos, nascidos dele, nosso destino profundamente conectado ao dele. Os mais ba?sicos e triviais eventos que dizem respeito ao homem levam ao universo e a suas origens”.
E noutro livro “Bilhões e Bilhões” Carl Sagan diz que “Vivemos num Universo em expansão, cuja vastidão e antiguidade estão além do entendimento humano. As galáxias que ele contém estão se afastando velozmente umas das outras, restos de uma imensa explosão, o Big Bang. Alguns cientistas acham que o universo pode ser um dentre um imenso número – talvez um número infinito – de outros universos fechados. Uns podem crescer e sofrer um colapso, viver e morrer num instante. Outros podem se expandir para sempre. Outros ainda podem ser delicadamente equilibrados e passar por um grande número – talvez um número infinito – de expansões e contrações. O nosso próprio universo tem cerca de 15 bilhões de anos desde a sua origem ou, pelo menos, desde a sua presente encarnação, o Big Bang”.
Perante esta realidade, se os humanos compreendessem e interiorizassem a sua insignificância quer no panorama espacial quer temporal neste universo em constante movimento, certamente que muitos dos conflitos existentes no mundo não teriam lugar nos tempos em que vivemos. Mas como os “capitalismos”, os “neoliberalismos”, os “individualismos“, característicos dos tempos actuais, falam mais alto do que a nossa própria ignorância, estes configuram uma das pandemias da humanidade, a par daquele espanto e daquela embriaguês ante a nossa própria existência. Escutemos um conselho de Carl Sagan: “Cada um de nós é, sob uma perspectiva cósmica, precioso. Se um humano discorda de você, deixe-o viver. Em cem bilhões de galáxias, você não vai achar outro.”
É nesta vastidão da nossa galáxia, para não falar deste universo sem limites, é neste “pálido ponto azul” visto de longe, onde habita a humanidade. Com a teoria do “Big Bang” agora entendemos um pouco mais sobre donde viemos e podemos, por assim dizer, lançar algumas hipóteses sobre quem somos e para onde vamos. Podemos, naturalmente, não saber tudo sobre nós mesmos, mas temos pistas que nos podem levar, ainda que timidamente, a conjecturar sobre o nosso desígnio aqui no mundo. Carl Sagan, em “Pálido Ponto Azul” diria assim, referindo-se justamente ao nosso Lar comum, ao nosso planeta Terra: “(…) Olhem de novo para o ponto. E? ali. E? a nossa casa. Somos no?s. Nesse ponto, todos aqueles que amamos, que conhecemos, de quem ja? ouvimos falar, todos os seres humanos que ja? existiram, vivem ou viveram as suas vidas. Toda a nossa mistura de alegria e sofrimento, todas as inu?meras religio?es, ideologias e doutrinas econo?micas, todos os cac?adores e saqueadores, hero?is e covardes, criadores e destruidores de civilizac?o?es, reis e camponeses, jovens casais apaixonados, pais e ma?es, todas as crianc?as, todos os inventores e exploradores, professores de moral, poli?ticos corruptos, “superastros”, “lideres supremos”, todos os santos e pecadores da história da nossa espe?cie, ali – num gra?o de poeira suspenso num raio de sol.”
Note-se que até à morte de Sagan ainda não se tinha descoberto o “Bóson de Higgs”, não tinham sido detectadas as “Ondas Gravitacionais”, não tinham sido registadas as primeiras imagens de um “Buraco Negro”, mas Carl Sagan, ainda assim, foi capaz de compreender muito bem como o universo funciona. Mesmo o LHC – Grande Colisor de Hadrões – o maior acelerador de partículas do mundo, também nem sequer existia ainda. Hoje sabe-se com alguma precisão que a idade do universo é de cerca de 13,7 mil milhões ou, como se queira, 13,7 bilhões de anos.
À semelhança de autores/cientistas como Albert Einstein, Stephen Hawking, Marcelo Gleiser, entre outros, Carl Sagan realmente atordou-me muito e de forma positiva ao ponto de despreconceituar a minha mente e a visão que eu então tinha em relação às coisas e ao mundo em que vivemos.