Estávamos justamente em frente ao tribunal na avenida Vlademir Lenine na Cidade de Maputo em direção a baixa da cidade, quando ele olhou ligeiramente para baixo do seu ombro direito e disse “Gerson, pensar é um exercício muito complicado”. Suficiente para que eu ficasse sem dizer nem mais uma palavra e continuasse a andar até a feira popular onde íamos jogar bilhares. “Para piorar” fiquei sem saber se era eu que não sabia pensar ou as pessoas que criticava. Este diálogo aconteceu quando criticava por mais de uma hora os nossos dirigentes, governo isto e mais aquilo.
Pensar é um processo de combinação de ideias utilizando um espírito crítico, fazendo uso da razão para despertar, julgar de forma lógica para se chegar a uma conclusão próxima da realidade.
Passam mais de 17 anos que este episódio teve lugar, embora tenhamos ambos aprendido a dizer bonjour* com sotaque Francês e good morning* com sotaque de Mississippi, viajado um pouco pelo mundo e acumulado alguns títulos profissionais e acadêmicos, eu e o meu amigo de infância, Leo, nos apercebemos até que ponto somos dois seres ignorantes. Chegados a essa conclusão, nos últimos anos decidimos passar a desenvolver conversas de maneiras a minimizá-la. Hoje, as nossas longas e regulares conversas pela madrugada via WhatsApp, vídeo chamadas no Skype ou Zoom, não mais são de conclusões, acusações e muito menos de crítica, mas sim de questionamento. Porquê achas? Não achas que poderia ser diferente? Como? Achas mesmo que eles possam pensar assim? O que os leva a pensar desta ou daquela forma? Será que não somos nós os culpados?
Há poucos meses atrás os representantes do povo (“RP”) da Assembleia da República de Moçambique (“AR”) pensaram e chegaram à conclusão que as suas regalias não eram suficientes e aprovaram uma nova lei que aumentava consideravelmente os subsídios, regalias e outras benesses para os funcionários da AR. Jovens estudantes decidiram que “desta vez é de vez” e organizaram manifestações na nossa capital. Nas redes sociais pude ler “agora o pessoal abriu o olho”; “já não somos mais matrecos”; “estes gajos pensam que o povo é o que?”. Finalmente depois de alguma pressão os RP tiveram de recuar.
Estive a analisar e disse para mim mesmo, nós povo somos na verdade muito invejosos. Sim, escrevi invejosos. Vou repetir, somos muito invejosos. Afinal qual é o problema que os representantes do povo tenham regalias que possam aumentar seu poder de compra? Poder de compra é bom para a economia do país, não? Então porque fomos manifestar? Só fomos confirmar o que temos dito de nós mesmos “Preto quando vê outro preto evoluir procura distruir”. Por estas alturas, já devo ter “despertado” alguma animosidade…sou corajoso e vou continuar…continue a ler, por favor. Risos…
Nós fomos à rua reclamar que os RP não deviam ter regalias, mas eu acredito que o nosso problema não são as regalias dos RP, o nosso verdadeiro problema é outro.
Jim Rhon coloca a seguinte pergunta em um dos seus podcasts. Como obter o que precisas? E a resposta que ele dá é simples, peça. Acrescenta dizendo, peça com inteligência. Mas antes de pedir, pense bem para saber exatamente quais as suas necessidades.
Acredito que é aqui onde reside um dos nossos maiores problemas, não sabemos o que queremos ao certo, como obter e/ou demandar. Imaginem que tivéssemos uma taxa de desemprego de 10% e que os nossos salários fossem suficientes para fazermos poupanças. Teríamos saído às ruas reclamar das regalias dos RP? Não creio!!!. Nestas alturas já devem estar a dizer, claro Gerson, eles só devem resolver os problemas do povo e o resto não nos importamos. Aí está, eles nunca vão fazer isso se nós não soubermos pedir ou exigir. Contudo, não será em bloquear estradas, fazer greves ou esperar que eles aumentem seus subsídios para sairmos as ruas que nós vamos melhorar nossa situação. Reparem por exemplo que assim que as regalias foram canceladas, a única coisa que fizemos foi voltar às redes sociais e dizer, “o pessoal é F***dido”; “não conseguiram nada os gajos”. Mas no entanto nada melhorou.
PODER DO PENSAMENTO POSITIVO
Minha mãe dizia “samito utxikhó dhitsiku nidhitsiku uku txikwembu nilava ti ni ti. txikwembu txinaku xamula, mwanangu”². Ao mesmo tempo que batia o seu dedo indicador contra o média da sua mão direita.
Eu defino pensamento positivo como desenvolvimento de ideias que nos ajudem a melhorar em todos os domínios, olhando para o lado bom das coisas do passado, ignorando as que não deram certo, olhar para o presente ao mesmo tempo que para o futuro com esperança e confiança cega que as coisas vão ser melhores “SE” fizermos o melhor de nós. Nós, seres humanos, fomos programados para pensar mais vezes negativo que positivo “por defeito de fábrica”. Por isso que é mais fácil criticar do que aconselhar, se lamentar que tomar responsabilidade sobre a nossa situação, destruir que construir. É por esta razão que um exercício constante pessoal para manter em todas as circunstâncias um estado de espírito positivo é importante.
Seria na minha opinião pensar positivo se exigissemos leis que nos punem quando não enviamos um email profissional na hora combinada. Esta atitude custa milhões à nossa economia. As regalias dos RP representam apenas uma gota no oceano ao lado desses milhões que perdemos. Seria pensar positivo se exigissemos aos RP casas de cultura em cada bairro que não só iriam criar empregos como também educar os nossos filhos. Sei que alguns devem estar a dizer, mas olha Gerson, isso eles deviam fazer sem exigência alguma. Claro, mas contrariamente ao que muitos de nós sabemos, a maior parte dos nossos dirigentes agem “na mais pura ignorância”, de certa forma (exagerada) poderia argumentar que não sabem o que fazer e nem como fazer certas coisas. Por isso que sou da opinião que devemos discutir e trocar ideias e não criticar e nem partir para ignorância. Para lhes dar alguns exemplos, estive outra vez numa praça em Bruxelas com um ex-alto dirigente cá da terra quando ele/a vira-se para mim e diz “repare, ninguém deita nada na rua aqui”. O que ele/a não sabe é que não é porque ninguém não deita nada que as ruas são limpas, é porque para além das latas de lixo espalhadas, existe a polícia municipal que passa regularmente para limpar, guardas à paisana em campanhas constantes de consciencialização e, em conclusão, manter a cidade limpa é matéria de estudo nas escolas. Já estive também na preparação de uma viagem empresarial a Moçambique em que um representante da Embaixada pegou num papel para ler que Moçambique tem mar, tem tanto de comprimento e largura, têm aquela ou esta riqueza, toda a informação que qualquer pessoa encontra na internet e que teria de princípio consultado antes do encontro. O representante não disse nada relevante que seja incentivo a investimento e, ainda pior, partiu assim que terminou de ler, sem deixar tempo para perguntas e respostas. Este representante não sabe que empresários têm pouco tempo para blablabla e não sabe o que necessariamente estes empresários procuram neste tipo de encontro. Isto apenas para citar alguns exemplos.
Estas experiências me fizeram chegar a conclusão que não é por mal que muitas vezes as coisas não avançam. Tenho dificuldades em aceitar a ideia de que os nossos dirigentes não se importam com o povo. Claro que se importam. Eu e o leitor não podemos amar nossa nação mais do que qualquer outro moçambicano no mundo. Não acha?
Vamos lá analisar um pouco os nossos objectivos como nação: “luta contra pobreza”; “combate a corrupção”. Se homo sapiens já foi programado para pensar negativo, como é que podemos nós mesmo usarmos slogans com conotação negativa e esperarmos resultados positivos? E por outro lado, nós homo sapiens temos aquilo que chamamos de inteligência superior e essa inteligência superior não se deixa facilmente enganar. Essa inteligência superior sabe que nós não somos pobres e nem corruptos. Podemos até estar nessa situação, mas nós não somos isso. A nossa inteligência superior sabe que temos rios, terras, ela sabe também que os nossos ancestrais foram agricultores e não corruptos. Neste caso dificilmente vamos agir pois o nosso ego está sendo atacado quando nos chamamos de corruptos e pobres. Nenhum chefe de família se sentirá motivado a dizer ao seu filho antes de sair de casa “filho, hoje vou lutar contra corrupção” mas tenho a certeza que o mesmo chefe de família diria antes de sair de casa “filho, hoje vou construir um país melhor para si”. Lutar contra a pobreza/ corrupção significa reagir a uma ameaça e é uma atitude passiva e negativa, enquanto sair para construir significa agir e é uma atitude activa e positiva. Nós estamos mais dispostos e motivados a agir em situações positivas. Deixa dar mais um exemplo para elucidar melhor o poder do pensamento e das palavras. Imagine que o caro leitor chegue à casa de um amigo/a e ele/a diga “não te vou tratar mal em minha casa” e na casa do outro/a ele/a diga “sinta-se em sua casa”. Em qual das casas passaria uma refeição agradável? Os nossos pensamentos e a verbalização dos mesmos resultam nas nossas atitudes. Acho que devíamos passar tempo de qualidade a debater assuntos deste, que são para mim a base antes de qualquer acção. Temos nossa parte de responsabilidade. Não?
Por volta do meio-dia, de 20 de janeiro de 1961, em Washington, D.C. por ocasião da sua tomada de posse John F. Kennedy disse, “meus companheiros americanos, não pergunte o que seu país pode fazer por você, pergunte o que você pode fazer por seu país”.
É o que tem feito o jovem Moçambicano Bruno Pinto, jovem que sem nenhum recurso inicial, soube utilizar o poder do pensamento para ultrapassar obstáculos e conseguir tornar-se um grande empresário e hoje tenta com sua história inspirar outros moçambicanos a partir da sua obra “Construí meu futuro” e das conferências que tem dado na Europa para que sejamos a melhor versão de nós mesmos. No final temos o mesmo objectivo, independentemente da etnia, localização, partido político, religião. Vamos trocar nossas experiências e ideias de forma a despertar nossa inteligência colectiva e fazer com que esta trabalhe a nosso favor e não contra nós, pois se Bruno Pinto sozinho e em terra desconhecida conseguiu, então nós juntos também podemos. EU ACREDITO EM NÓS.
*Bonjour Bom dia (língua francesa)
*Good morning – Bom dia (Língua inglesa)
² Samito, se todos os dias rogares a Deus que quero isto e aquilo, Deus vai te responder meu filho.
Recomendação de livro para o mês de Agosto 2021: Sea Loves Me – “Mia Couto”