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Para um tempo de falência de pensamento por miséria metafísica!

Por: Dom Midó das Dores
Escritor de Xitende e do Absurdo, exilado em Mandimba

Segundo Manifesto Metamiserista!

Nós somos miséria em todas as dimensões, para trás, para frente, para os lados, para o lado dos lados, somos a miséria, uma miséria do passado, na qual a história, a memória, a escravatura se ensombram, quais rochedos em mostrengos erguidos como cabeças de velhos, de velhos sarilhos da história! Somos a miséria do futuro, a miséria da falsa esperança dos pântanos do deserto, da morte de ideias da visão do vazio, poeira de estrelas cosmogónicas movida por energia de buracos negros. Nós somos, metade miséria comunista, outra metade miséria capitalista. Entre rios e savanas naufragados no sol acorrentado dos trópicos, nós somos a escória universal africana de todos os demónios expulsos do paraíso e das savanas com almas sagradas de bosquimanos.

Nada espanta, nada arrepia, ser o que somos, a nossa própria miséria. O que pensamos ontem produziu a miséria que somos hoje, o que pensamos hoje e amanhã, é a reprodução da mesma miséria que se eleva ao nível dos deuses! Oh Cisnes do negrismo, doutos e doutores diplomados de todas as ciências da vida, onde está o nosso futuro? Seremos sempre a vendedeira dos passeios da amargura? As mãos tísicas de enxada de cabo curto, como a esplêndida síntese duma evolução? Hoje para o africano a pobreza existencial é o absurdo que dá sentido à própria vida negra. Nós vivemos para lamentar da vida, enquanto o Rover faz selfies no Marte. A nossa arte é de decalcar o juízo final da nossa existência errante, cantando belas elegias de velhos tambores, façanhas e odisseias de novos colonos.

De qualquer forma, neste nosso devir do nada para o nada, a miséria humana há-de ser a alma de cada verso, o início e desfecho de toda criação, porque a pobreza impera truculenta e jocosa, cruel ao sorver a dignidade e o sentido das coisas, oh pobreza, tu vais ser, para sempre, um filho da puta sem tamanho, do erro ontológico em que tornamos.
Esta é a era da bagunça literária, a bagunça do absurdo, da arte das casas de lixo, casas de luxo em rios desurbanizados dos bairros que flutuam à mesma época de cada ano, de repartições onde se trata documentos que para tratar precisam tratar outros documentos, do sangue espargido pelos terroristas que voltam à casa para aterrorizar o saco de amendoim da machamba da avó, arte de sacuderes de lixo que escrevem no mijo de muros, acácias e jacarandás das cidades cosmopolitas do capitalismo Leninista da nossa pobreza. Se nada significa nada, com toda esta insipiência humana, porquê que a arte teria que ter algum significado!

Esta é a era duma nova ordem, em que cessam todas as ordens e se anuncia novos tempos, da proclamação do homem pobre de si mesmo, homem oco por fora e oco por dentro, homem de terno e gravata encobrindo sutiãs cor-de-rosa com bojo e alças rendadas, esta é a era de usar o próprio sangue para escrever de qualquer maneira, deixar erguer-se a voz da morte e do absurdo ontológico em que nos transformamos!

Toda a lógica até agora, produziu a escória que somos, na lógica duns que empobrecem os outros, peregrinos duma história com complexos de vira-lata.
Mas ei-nos que nos erguemos aqui! Ei-nos…

Toda arte é uma voz. Mas, nós queremos é o ruído! Ruído com energia cósmica, que dá energia à nova arte. A nossa condição humana parece uma demência prolongada e não compreendida. Dá a impressão de que em algum momento da nossa desevoluҫão bantu, um xituculumucumba qualquer convidou-nos para um banquete de alienação colectiva, a nossa ciência, a nossa arte, são um processo criativo permanente de reprodução da miséria, da corrupção e da degradação, o nosso desenhismo literário, ainda não conseguiu reconstruir a vergonha que perdemos no percurso histórico da nossa estagnação. Precisamos de tudo para o nosso take-off moral, mas ao menos que os deuses nos devolvessem a nossa vergonha!

Ei-nos aqui! Ermos por uma arte engajada na vida da contracultura que ilumina o nosso entardecer, da vida ébria, vida corrupta e acientífica concumbinada ao sexismo e suas adrenalinas de almas caídas, arte dos párias da canónica homossexualizaҫão africana, do terrorismo abençoado pelo petróleo menstrual dos nossos mares franceses, uma arte de sugger daddies intelectuais, politólogos de políticas sem calcinhas, numa elegia da vida em que os al-shabaab’s da costa, rimam com favas panafricanistas de M23, quando tomam uma coca-cola halal em Mocímboa da fire. Se fossemos filósofos como o Severino, diríamos que a nossa pobreza e a qualidade dos nossos homens, são gêmeos siameses com cabeças diferentes mas partilham o mesmo cú.

Nesta escangalhada condição humana, nós teremos sido o big bang duma nova intuição espiritual, seremos a arte de arremesso, uma arte-slogan duma marcha metafísica por uma revolução ontológica, errupção cósmica de revoltas por nova vibração vital, nova energia existencial duma negritude fundada por um novo futuro, rebeldes de uma rebeldia que está para além do ser, uma rebeldia de refundação de nós mesmo. Nós seremos o tempo que se alimenta da revolução, revolta e rebeldia, numa Escola de 3R`s espirituais. Uma força electromagnética de escrever de qualquer maneira, numa literatura de língua revoltada, para fecundar o novo berço da humanidade!

Nós somos a arte da revolução, revolta e rebeldia…

Arte da revolta e rebeldia

Arte da rebeldia!

O Nós Somos, é o nosso Deus!

Nota: Texto apresentado durante a cerimónia de lançamento do livro.

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