O MOZEFO vai realizar a sua segunda conferência internacional no próximo dia 30 de Maio em Joanesburgo para debater o tema: ‘’Moçambique-África do Sul, Pontes para o Desenvolvimento Económico’’. Acompanhe a entrevista da antevisão com Rui Barros, CEO do Barclays Moçambique.
O Barclays Moçambique tem uma relação umbilical com África do Sul, explique-nos sobre a estrutura do Barclays Moçambique.
O Barclays Moçambique é detido maioritariamente pelo Barclays África, entidade com sede em Joanesburgo, na África do Sul, listada na bolsa de Joanesburgo. Para além da participação do Barclays em Moçambique, está presente em mais 11 países no continente, para além da própria actividade na RSA que segue a marca ABSA e não necessariamente o Barclays. Essa ligação umbilical é traduzida no dia-a-dia, já que trabalhamos constantemente juntos para apoiar clientes moçambicanos que operam em Moçambique e vice-versa, para além daqueles que operam no resto do continente, havendo relações tripartidas ou mais. Enquanto entidade moçambicana com uma longa história neste país, temos também um elemento de ligação entre os dois países e certamente esperamos contribuir para as relações económicas em particular.
Parece haver um certo pessimismo do CEO do Barclays PLC em relação à África.
O Barclays em Moçambique é composto maioritariamente pelo Barclays África (acima de 98%), contudo o Barclays África é também detido por uma entidade terceira que é o Barclays PLC, com sede no Reino Unido. Este banco está listado em Londres e normalmente utilizamo-lo como uma referência global, pois está no topo dessa hierarquia de várias empresas. Até ano passado, a detenção accionista por parte do Barclays na Inglaterra, no Barclays África, era de 62.3% e nessa altura houve um anúncio explicando que por questões regulamentares de exigência do regulador inglês, relativamente de capital que era exigido de ter em Inglaterra por via da actividade desenvolvida do credor África, foi reduzida essa a participação para que a percentagem accionista passasse a ter o mesmo tipo de exigências em termos de posicionamento de capital. Nessa medida, a decisão foi tomada de uma forma estruturada e planeada. Foi anunciado em Março de 2016 que, durante um período aproximado de três anos, haverá uma transformação da estrutura accionista. Por um lado, a atingir os objectivos regulamentados no Reino Unido de posicionamento de capital, mas por outro, manter o posicionamento e planeamento estratégico que temos no Barclays África como entidade que congrega todas as actividades do continente e do Barclays em Moçambique. Neste momento, a redução de capital passou de 62.3% para 50.1%, sendo que o pedido original foi no sentido de reduzir para uma opção minoritária, porque só assim haveria libertação do capital a nível da casa mãe. Aguarda-se ainda a conclusão desse processo e as aprovações necessárias, contudo temos estado a trabalhar para garantir uma transição sem impactos significativos seja para os clientes, assim como para os colaboradores.
O banco PLC não vai sair da África, vai se manter em África e manter a posição de accionista de referência e muito provavelmente o maior accionista do grupo em África. Somos ainda o único banco global com uma presença vincada dessa forma no continente africano. O Barclays em África emprega cerca de 45.000 pessoas, com um total de activos de cerca de 100 biliões de dólares. A nossa presença no continente é e sempre será positiva. A leitura que deve ser feita é a de emancipação do continente.
Resumindo, não é previsível que isso tenha um impacto negativo sobre a operação em Moçambique?
Não é, mas gostava de lutar para que tenha um impacto positivo. Queremos ser um banco africano também virado para aquilo que África precisa, e sabemos que há diferenças entre o que Europa faz hoje e algumas das prioridades que os nossos accionistas no Reino Unido face àquilo que são as necessidades do nosso continente tanto em Moçambique, como em outros países que estão inseridos. Portanto, vemos com grande optimismo esta oportunidade, pois continuamos a ter um dos principais bancos do mundo a apoiar-nos e a abrir janelas para algumas das coisas que se passam lá fora, e que nos ajudam a desenvolver o mercado interno, mas acima de tudo, temos essa autonomia e espaço para desenvolvermos.
Qual é que é a visão e estratégia do Barclays para Moçambique, onde é que gostaria de ver o banco em Moçambique daqui a cinco anos?
Nós alteramos aspectos fundamentais da nossa estratégia em 2014. Nessa altura, fizemo-lo exactamente para alinhar a estratégia do banco com aquilo que é a estratégia do país e os principais elementos de desenvolvimento económico e social que se estavam a transformar. Daquilo que era a estratégia mais direccionada ao retalho, tendo em conta a história do Barclays antes com Austral e BPD, claramente continuamos a ter o orgulho dessa herança, mas faltava-nos uma componente mais virada para grandes empresas, em que sendo efectivamente parte dessa família global do Barclays podíamos também contribuir para o crescimento das PME e grandes empresas de Moçambique. Portanto, nos últimos anos, temos já traçado esse caminho, felizmente com sucesso. A nossa visão para os próximos anos é continuar a crescer nesta lógica de um banco focado nos seus clientes, em apoiar o desenvolvimento económico e social de Moçambique, sempre centrado neste equilíbrio entre as necessidades do empresariado moçambicano e internacional a investir em Moçambique e do desenvolvimento demográfico e social do país.
O tema da Conferência a acontecer em Joanesburgo é: Moçambique- África do Sul, pontes do desenvolvimento económico. O que é que gostaria de ver discutido no dia 30 de Maio?
Julgo que o tema fala por si só. Temos vindo a observar, no nosso negócio também, muita procura de investidores sul-africanos no mercado moçambicano e a transformação é um dos elementos que o MOZEFO deve abordar. Esta transformação da procura por Moçambique como mero país e importador de produtos sul-africanos para passar a ser uma oportunidade de negócios em toda a cadeia de valor, cada vez mais com a criação de negócios em Moçambique e de empregos com a produção e a transformação de matérias-primas em produtos acabados, portanto, a criação de valor para o território moçambicano. A ligação histórica que existe entre os dois países, obviamente também seguiu limitações reais que existiam principalmente em Moçambique e que criou aqui alguma dependência de um país perante outro, dado a sua proximidade e as suas resoluções. Hoje em dia, temos que pensar como reequilibrar essa situação e felizmente vemos, principalmente do lado dos nossos clientes sul-africanos, essa percepção da oportunidade e da possibilidade de trazer mais-valia para Moçambique.
Qual é a maior preocupação dos investidores sul-africanos em relação à Moçambique?
A situação económica e política do país tem vindo a preocupar. Não só os investidores sul-africanos, assim como qualquer investidor internacional. É natural que assim seja por tudo que temos vindo a assistir nos últimos tempos, mas eu diria que felizmente nesta questão os sul-africanos estejam mais preparados. Têm um contexto histórico, têm uma proximidade diferente, e portanto, tendem a obter maior detalhe da situação que julgo que acaba por ser benéfico para ter algum conforto para entrar no nosso mercado. As grandes preocupações são políticas e económicas, pela história recente, são talvez mais prolongado no tempo, a questão das infra-estruturas, da capacidade de desenvolver o modelo de negócio que exigem eficiência são muito importantes.
É também relevante notar que África do Sul é um país muito mais industrializado ao nível do desenvolvimento, em todo o continente. Existe uma preparação e um status da África do Sul que não existe em Moçambique e noutros países da região. Portanto, esta entrada de investidores sul-africanos vem sempre com estas expectativas de qual o nível de infra-estrutura por exemplo em termos do nível de educação, recursos humanos disponíveis para o desenvolvimento de determinados tipos de negócios e estas são preocupações de longo prazo que existem há mais tempo. Julgo que Moçambique quer endereça-las de uma forma evidente nos últimos tempos, mas há um longo caminho por percorrer.
Há desafios particulares que são mencionados nesta relação de grande confiança que existe, por exemplo, de um cliente e seu banco?
Aí é preciso ponderar também os constrangimentos que podem surgir em Moçambique, nomeadamente, em termos de tarifa aduaneira e outras medidas que possam incentivar a entrada de produtos no país ou a transformação de produtos no país para a exportação subsequente. Sabemos da mesma forma, que para as relações bilaterais crescerem mais rapidamente, reduzir estas barreiras é importante, mas também sabemos que ao fazê-lo provavelmente poderá beneficiar mais uma situação de compra e venda de produtos acabados e menos de transformação no mercado interno. Há aqui um equilíbrio que preciso encontrar e julgo que os dois governos têm vindo a trabalhar em conjunto para atingir. Existe uma outra dimensão da SADC, onde os dois países e outros países da região têm vindo a trabalhar no sentido de reduzir o nível de fricção nas trocas comerciais entre os vários países da SADC. Provavelmente, terão um caminho longo por trilhar e atingir uma próxima relação entre os dois mercados.
E o banco aparece como um mediador dessas relações comerciais e empresariais?
Felizmente temos tido o papel, muitas vezes secundário. Por um lado, temos tido muitos clientes sul-africanos que directamente com a ABSA ou em contacto com o Barclays em Moçambique procuram-nos no sentido de encontrar parceiros na medida que os conhecemos e estabelecemos essas pontes. Por outro lado, empresários moçambicanos com vontade de estabelecer uma ponte com o mercado sul-africano nos têm contactado e temos tentado ajudar. A partir do momento em que as partes sabem o que sabem e o que querem fazer, vamos ter também uma plataforma que os ajude a fazê-lo da melhor forma possível.
Até Dezembro de 2017, quais são as tuas expectativas para a economia, quais são os factores que podem influenciar mais o rumo vier que possa tomar?
Julgo que é importante retomar a história recente. Ano passado foi extremamente difícil, em que a detioração do ambiente macroeconómico foi evidente. Terminamos o ano muito pior do que tínhamos começado, mas é importante notar que entramos em 2017 já com um movimento de melhoria na maior parte destes indicadores. O final do ano passado foi marcado por uma política monetária muito agressiva e direccionada em que o Banco Central interveio numa primeira instância para limitar a escalada da inflação para controlar a massa monetária em circulação para no fundo criar aquela ‘’ almofada’’. Era necessária na altura, dada a pressão que estávamos a ter e que também contribuiu para a redução do câmbio do metical contra as principais moedas internacionais. Estamos agora a viver o resultado dessas medidas, encontrando uma situação menos preocupante em termos de tendência, mas igualmente preocupante em termos da inflação ou as condições macroeconómicas em geral. Esperamos que até final do ano esta tendência se mantenha e se registe melhoria de inflação, dada alguma apreciação do metical e da redução das taxas de juro.
Se puder identificar dois ou três acontecimentos do foro económico ou político que criam alguma expectativa ou antecipação por acusa do seu impacto sobre a economia, quais é que seriam?
Existe uma expectativa muito grande relativamente ao entendimento dos mercados financeiros internacionais sobre o futuro da economia moçambicana e essa leitura internacional decorre de dois elementos. Primeiro, um relatório que sabemos que foi terminado há pouco tempo e está sob análise e que portanto será divulgado. Esperamos nas próximas semanas aumentar a transparência e o conhecimento dos mercados internacionais nestes últimos anos económicos e relativamente as dívidas que foram contraídas. De igual modo, a situação das emissões obrigacionais dos accionistas e dos empréstimos que existem ou com garantias do Estado a capacidade de pagamentos dessas emissões.