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“O regresso do morto” foi um dos momentos do ano

Em 1989 o escritor moçambicano Suleiman Cassamo publicou O Regresso do Morto, uma coletânea de dez Contos “em que apresenta o quadro das contradições sociais e culturais vividas pelos excluídos e explorados trabalhadores das minas, crianças, idosos e, em especial às mulheres moçambicanas. Cassamo presta uma homenagem comovente aos marginalizados sociais representados por personagens sofridas, porém resistentes”.

O Regresso do Morto correu o mundo, transformou-se numa das radionovelas mais célebres em Moçambique, confunde-se com adágios populares e apegou-se em vários discursos motivacionais, e já agora, no dia-a-dia, há muito morto que retorna à vida.

Regressamos, e qualquer lúcido seria capaz de jurar, que renascemos das cinzas.

Foi como: “ O regresso do Morto”.

Temos mais uma vida, como nos videogames e queremos honrá-la. Quer dizer, até aí depende, mas pelo menos disfrutemos da mesma.

Aquilo equivale aproximar coreanos do Sul aos do Norte, atravessar o Mar Vermelho andando por cima da água como fez Moisés, ultrapassar os limites da lógica humana, enfim, extraordinariamente esquisito. 

Cépticos e optimistas abanaram e abanam ao mesmo som. Agora somos nós e o Mundo. Não há Rei que tussa ao nosso lado. Grande final do ano!

No processo de compreensão do passado, interpretação do presente e perspectivação do futuro, o nosso futebol nunca enganou. É, de longe, antipático e se fosse o contrário talvez não haveria euforia.

Como um “chute” pode fazer a diferença e enterrar sofrimento que foi, durante muito tempo, a nossa melhor companhia?

Os mimados estão pasmos, os masoquistas reclamam a devolução do seu sofrimento e os narcisistas dizem que já sabiam. Sabe-se lá. Já era confortável viver da boa vontade alheia.

Foi assim em 2009 quando, diante da Tunísia no famoso “velhinho”, mas sortudo, Estádio da Machava, Dário Monteiro, com pé esquerdo, deu aval ao Kampango para que, no ano seguinte em Angola, mostrasse a sua outra face.

Vai daí as cambalhotas que deu! Pura felicidade do “Keeper” moçambicano, o melhor que havia na vitrina e o mais recomendado daquela época.

Já no CAN, até deu-se ao luxo de correr o mundo à velocidade do Jamaicano Usain Bolt, com a resistência e determinação do fundista britânico Moh Farah, valeu-lhe a internet que não tinha a velocidade dos dias que correm.

Aquelas cambalhotas davam-lhe outra dimensão.

Mas para nós, estar lá era o essencial, e lá estivemos. Não interessa o resto.

É como quem festeja por ter sido insultado por Cristiano Ronaldo. Não é sempre que tal acontece, ou festejas ou festejas. CR7 dirigiu-se a ti, é directo para o Guiness Book. Valha-me Deus!

Ainda que tenha sido o pior momento da sua vida, há que ver o lado positivo da coisa. Sim, muitos querem. Até porque, quem desdenha quer comprar!

Não precisa ser bruxo para adivinhar muita coisa cá do burgo. Não há mistério que permaneça indesvendável. Com todo o respeito e sem nenhum preconceito, é mais fácil ser cortês de casamento entre um gigante e uma anã do que assistir a uma vitória dos Mambas. 

Nos campos não é excepção

Os mais de 40 mil espectadores para o Moçambique x Guine Bissau sabiam que aquilo seria uma tortura, antes mesmo do apito inicial.

Até com a asneira do Guirrugo contra a Namíbia, muitos sonharam. Mas, afinal, ainda havia “espaço na mesa para um morto”.

Já viram a história de Michael Phelps? O norte-americano? Hoje, o nadador mais medalhado dos jogos olímpicos?

Pois então, a sua ascensão começa com a desistência das piscinas, do agora jogador da NBA Kris “Topher” Humphries. Jogador de pouco destaque na National Basktball Association.

Humphries foi carrasco de Phelps, ganhou-lhe em todas e foi considerado uma das grandes promessas da natação dos Estados Unidos da América.

Em 1995 venceu seis provas numa competição nacional, deixando para trás…Michael Phelps!

Aos 10 anos, Humphries era melhor nadador do que o, hoje, maior medalhista olímpico da história.

“Eu era tão bom quando criança que acabei-me ‘queimando’ um pouco. É difícil manter o foco num objectivo quando você tem sucesso ainda pequeno. Precisava de um verdadeiro desafio. Ninguém comparava-se a mim. Ninguém desafiava-me naquela altura”, disse em entrevista televisiva, o homem que até se deu ao luxo de casar e separar-se da Kim Kardashin.

Quanta sorte, muitos dariam sua masculinidade para estar na pele do fulano.

Desistiu Humphries mas “nasceu” um campeão. Quantos conhecem este Poste? O Kris Humphries?

Repare, passou pelos Jazz, Raptors, Mavericks, Nets, Celtics, Wizards ou mesmo Phoenix Suns e…enfim! História para outro Rosário!

…e o regresso do morto?

Pois então! Foi a 18 do mês passado…pouca fé, pouca confiança e pouco público. Não houve ladainha que convencesse. Para Abel Xavier, era matar ou morrer.

Até que se prove o contrário, por baixo das vestes, o luso-moçambicano cobriu-se de adesivo para interditar acções involuntárias de qualquer orifício de que dispõe, caso o rumo dos acontecimentos fosse comprometedor.

Era… amassar o pão par a o diabo comer ou o inverso

Era mais fácil prever um acto racional vindo dum réptil do que aquele chute atrapalhado de Reginaldo que ressuscitou-nos e colocou nos ali, ali pertinho. Em Março vai ser… matar ou morrer. Enquanto não chega 2019, vamos festejar o “Regresso do Morto”.

Momento mágico, aquele do Reginaldo! Meus manos, estamos em pé, em cima duma agulha e a dançar melhor que Zaida Chongo nos seus momentos mais inspirados. Deus a tenha!

Aos 63 minutos do jogo, os moçambicanos lembraram-se de tudo, dos irmãos que estão distante, dos tempos ilusoriamente áureos do nosso futebol, dos momentos menos bons, da visita do Mr. Bow aos Mambas, dos animais de estimação, da força desta Selecção e da Nação, de tudo o resto! Naquele momento, era justo cantar: Moçambique é nosso filho, do Dj Ardiles.

Ao pobre dá-lhe uma migalha para arrancar o seu sorriso. Xavier salvou-se e salvou-nos o ano!

Celebrou-se a segunda vitória diante da Zâmbia mas, mais do que isso, os sete pontos no grupo K, o gosto pela vida, a segunda chance que a vida nos deu. A África que pode ser “nossa”, o Mundo que pode nos conhecer… que se lixem os Camarões que permitiram que a CAF retirasse-lhes o CAN.

Seja onde for, queremos lá estar. Março que nos aguarde.

Dependemos de nós, exclusivamente de nós. Isto equivale ao REGRESSO DO MORTO. Equivale a um dos momentos mais altos do ano, no desporto nacional.

 

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