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O papel da cultura e turismo na diversificação da economia nacional

Já é conhecido o novo Governo de Moçambique que nos próximos cinco anos deverá viabilizar as promessas eleitorais do Presidente da República, Filipe Nyusi. Tive a felicidade de cobrir a sua campanha eleitoral, durante a qual prometeu diversificar a economia nacional para que ela não dependa exclusivamente dos hidrocarbonetos e outros recursos minerais. Até porque basta olhar os países da Península Arábica para ver que estão a usar o dinheiro que ganham nos hidrocarbonetos para desenvolver uma indústria do turismo pujante que em alguns casos, em termos de receitas, já ultrapassa a indústria petrolífera.

No seu manifesto não elaborou muito sobre como a cultura e o turismo podem contribuir para essa diversificação e como temos uma nova ministra nesta área, nas próximas linhas tento contribuir com algumas ideias que se calhar podem ser úteis, cumprindo assim o meu dever de cidadania.

Em África e no Mundo há vários países que servem de inspiração e tiram muito proveito do casamento entre a cultura e o turismo e buscam recursos para financiar as suas economias, é o caso de Cuba que considero o melhor exemplo, mas há o Quênia, a Tanzania, o Ruanda, a África do Sul, o Brasil, a Suíça, entre outros.

A começar pelo turismo, penso que a nova ministra pode, antes de mais, reflectir em como garantir o fluxo de turistas no país nas duas estações do ano, nomeadamente o Verão e o Inverno. Para mim, no Verão a aposta da promoção do nosso turismo deve incidir mais sobre todas as actividades ligadas ao turismo de sol e prais, e durante o inverno temos a natureza onde a base podem ser os vários parques e reservas que são acessíveis neste periodo do ano, ou seja, ecoturismo e turismo cinegético.

A segunda medida seria identificar junto dos operadores turísticos nacionais e olhando a tendência global que tipo de turistas gostam das opções que o nosso país oferece, quem são, onde se localizam, quanto normalmente gastam no turismo e o que querem encontrar nos locais que visitam? E a partir dai formatar a nossa oferta tendo em conta estas informações que caracterizam o nosso potencial turista.

Por exemplo, os chineses tendem a fazer o turismo mundo fora. Do que já vi em vários países da Europa, EUA, Rússia é que eles gostam de andar em grupos só deles, se hospedam no mesmo hotel, certamente que o hotel deve oferecer refeições da culinária chinesa e tem de haver pessoas que falam mandarim para os acompanhar onde eles vão para lhes auxiliar. Para atrair turistas chineses esses aspectos devem ser acautelados quer através de reformas legislativas assim como de adaptação de operadores turísticos a estas necessidades ou exigências dos turistas chineses.

Uma vez a casa arrumada e clareza de que tipo de turista queremos que venha a Moçambique e quando, há que abordar o mercado. É preciso informar aos turistas que em Moçambique podem encontrar o que desejam para passar as suas férias ou momentos de laser. Nesse aspecto temos a ajuda dos grandes midias internacionais que anualmente, nas rúbricas sobre viagens aconselham seus leitores a vir a Moçambique. Este ano foi a Bloomberg a faze-lo, mas no passado a CNN, a BBC entre outros o fizeram. Mas podemos faze-lo de forma sistemática tal como o faz o Ruanda.

Por exemplo fazer publicidade nas televisões portuguesas sobre o turismo no Parque de Gorongosa, Ilha de Moçambique e do Ibo, bem como convidar jornalistas portugueses a visitar esses locais para fazerem reportagens positivas pode aumentar fluxo de turistas portugueses a visitar esses locais turísticos. O mesmo pode ser feito noutros potenciais mercados.

Estas questões bem calibradas e uma sintonia com as autoridades de migração, a polícia, o sector de saúde podemos começar a ter grande sucesso neste sector. Mas é fundamental que à sua chegada no território nacional o turista não fique horas a fio para ter autorização de entrada, que o polícia sirva para o ajudar e proteger, e não para extorqui-lo e em caso de necessidade possa ter acesso a serviços de saúde e ou evacuação com qualidade. Como é igualmente de extrema importância resolver o problema de confrontações militares no centro e no norte.

Considero importante ao nível diplomático avançar para negociação da isenção de vistos com aqueles países que se comprovar que têm de facto grande potencial de angariarmos turistas para que estes possam ser encorrajados a vir a Moçambique.

É preciso negociar com outros sectores do Governo para se reduzir o imposto sobre combustíveis e a taxa aeroportuária cobrada pelas companhias aéreas. Estas taxas encarecem o transporte aéreo. Se o preço do transporte aéreo for reduzido não tenho dúvidas de que vamos ter muitos mais moçambicanos a fazer o turismo doméstico. Há muita gente que gostaria de conhecer o Parque de Gorongosa, a Ilha de Moçambique, Ibo, a praia de Wimbe, as Quirimbas, o Lago Niassa, o Bazaruto, Vilanculos, Chocas Mar, etc. Mas é muito mais caro ir a estes locais do que ir a Lisboa, Dubai, Cape Town, Miami, etc. Não temos como ter o turismo como indústria se não reduzirmos para o custo do acesso. Temos que definitivamente ganhar no volume.

É preciso capacitar os agentes de viagens nacionais a saber criar pacotes turísticos agregadores. Por exemplo, quem sai de Maputo a Ponta do Ouro não pode só ser para ir à praia e ficar numa instância turística. Os agentes de viagem podem aprender a organizar pacotes em que o turista pode pagar um valor a partir do qual tem transporte de Maputo a Ponta do Ouro, ida à praia e passeio a barco, mergulho, ida à Reserva de Maputo, visita a outras praias para além de Ponta do Ouro, entre outras actividades.

Uma clarificação dos aspectos acima será igualmente fácil atrair investimento para diversificar a oferta de instâncias e actividades turísticas em Moçambique.

Em relação à cultura da nova ministra espero que possa dar dignidade aos fazedores das artes. Isso se consegue tornando a cultura de facto uma indústria. Uma das coisas que pode ser feito e que vi que funciona muito bem em Cuba é legislar, obrigando que as instâncias turísticas tenham artistas a animar as suas actividades uma, duas ou três vezes por semana. E na hora de pagar cachet aos mesmos a casa faz retenção na fonte do valor que deve ser entregue ao Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) para a protecção social do próprio músico, bem como do Imposto sobre Rendimento de Pessoa Singular (IRPS) de modo a contribuir para os cofres do Estado.

Pode se usar a FUNDAC e as embaixadas moçambicanas no exterior para garantir que os nossos músicos, por exemplo, tenham acesso aos diversos festivais de música feitos mundo fora, principal destaque para a Europa que está a consumir e com muita sede a música Africana.

Cuba faz muito bem isso não só para a música, como para o cinema, artes plásticas e artesanato. Por isso em quase todos os festivais de música na Europa há sempre músicos cubanos a actuar. Nas principais galerias de arte do mundo há lá quadros e esculturas de artistas cubanos, o que significa que nós podemos fazer isso.

Por conta da sua estratégia arrojada, Cuba arrecada cerca de 2 mil milhões de dólares por ano só com a cultura. Um músico ou artista que é colocado a actuar fora do país atrai turismo e divisas. Com esse dinheiro ele pode pagar o IRPS e o INSS. E pagando o INSS quando fica doente ou inválido e não pode cantar, pintar ou actuar terá renda para sobreviver. Em caso de morte os seus dependentes menores e cônjuge vão poder ter uma pensão de sobrevivência. E isso dará dignidade aos fazedores da arte.

A obrigação de pagar o IRPS e o INSS dos músicos deve se estender aos organizadores de espectáculos ao nível nacional.

Ainda ao nível de exportação das nossas artes e cultura gostaria de ver os nossos artistas a participar nas feiras, por exemplo, de música que acontecem pelo mundo que é uma forma de expô-los aos produtores e organizadores dos espectáculos. Em Moçambique até agora só tenho conhecimento de Jimmy Dludlu que há três anos tem sua participação na maior feira de Jazz do mundo, o JazzAhead, que se organiza em Bremen na Alemanha em Abril, mas enquadrado no pavilhão do Brasil Music Export por conta de assistência que ele tem com um manager brasileiro. Mas tal pode se extender a muitos outros através de entidades que visam exportar as nossas artes.

É fundamental e essencial convencer os players internacionais da indústria musical ou um investidor a criar uma editora de música em Moçambique. Faz muita falta. Temos muito talento mas perde-se por ai. Durante a campanha eleitoral reconheci talento em músicos como o Confiado de Mecanhelas, o Anaconda de Nacala Porto, entre tantos outros. Mas é preciso haver uma editora para que as criações daqueles jovens cheguem ao público nacional e internacional e eles tenham rendimento com o seu talento.

Essas são coisas aparentemente simples que podem ser feitas, havendo vontade, e que podem dar um outro rumo e visibilidade ao sector de Cultura e Turismo a par do que acontece actualmente como os Festivais Nacionais de Cultura e os Festivais de Música realizados anualmente um pouco por todas as praias nacionais que bem organizados podem ser um excelente atractivo turístico, a par dos locais históricos e algumas práticas tradicionais como os ritos de iniciação entre outros. Mas tem que haver ousadia senhora Ministra Eldevina Materula. É preciso pôr as embaixadas, os operadores turísticos e os diferentes organismos do sector a fazer a sua parte.

Que Deus abençoe Moçambique!

 

 

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