Morreu hoje, em Maputo, aos 90 anos, o político, poeta, membro fundador e veterano da Frelimo, Marcelino dos Santos, vítima de doença. O Presidente da República confirmou a notícia a partir da cidade de Pemba, em Cabo Delgado, onde orientava um comício.
Filipe Nyusi disse que o país perdeu um herói no qual os moçambicanos devem se inspirar
“Não tenho boa notícia… Acaba de me dizer, o ministro da Saúde, que perdemos o nosso ícone da Frelimo, o camarada Marcelino dos Santos”, afirmou o Chefe de Estado, adiantando que o Governo está a organizar-se para dar um funeral à altura da dimensão do aclamado combatente pela libertação de Moçambique do jugo colonial.
Calou-se para sempre um dos políticos fiéis aos seus princípios enquanto membro da Frelimo que viu nascer e crescer. Partidário ferrenho do marxismo-leninismo, Marcelino dos Santos defendia que em tempo para “fazer a revolução”, não havia “tempo para morrer”. E alguma vez alertou que “não construiremos o nosso progresso, se não estivermos organizados”.
Kalungano, nome literário de Marcelino dos Santos, nasceu em 1929, no Lumbo, província de Nampula. É herói nacional, declarado ainda vivo.
Ele “já tinha sido proclamado herói nacional. Merecia. Nós não esperamos acontecer o que hoje aconteceu [morte]”, lembrou Filipe Nyusi.
“Temos orgulho” por Marcelinos dos Santos ter perdido a vida “a saber que era herói deste país”, disse Nyusi, para quem os moçambicanos inspiram-se na “bravura” de Marcelino dos Santos. “A sua alma que descanse em paz”.
Aliás, em 2006, Marcelino dos Santos, concedeu uma entrevista à Rádio Nacional de Angola, durante a qual afirmou, citando uma frase do dramaturgo alemão Bertolt Brecht, que “felizes são os povos que não têm necessidade de heróis”.
De algum tempo à data da sua morte, o veterano da Frelimo [movimento criado em 1962] já não fazia aparições públicas porque, em parte, a idade já pesava e, como tem sido regra em todos os Homens, o seu estado de saúde vergava-se ao tempo.
Sobre a debilidade da sua saúde, o ex-vice-ministro da Saúde, Leopoldo da Costa, disse que a vítima sofreu uma paragem cardíaca.
O médico explicou que foi um dos que acompanharam de perto os “momentos bons e difíceis” de Kalungano. Os internamentos eram frequentes. Nos últimos anos, a sua saúde era “mais estável mas desta vez não suportou, perdeu a vida” por “uma paragem cardíaca”.
Segundo Leopoldo da Costa, “aquilo que somos hoje devemos muito a Marcelino dos santos”.
O desaparecimento físico de Marcelino dos Santos foi também anunciado pela Comissão Política e o pelo Secretariado do Comité Central da Frelimo.
“Como membro fundador da Frente de Libertação de Moçambique, o camarada Marcelino dos Santos destacou-se durante a luta armada de libertação nacional como vice-presidente da Frelimo e Secretário de Relações Exteriores” da organização, lê-se no comunicado enviado ao “O País”.
Segundo o documento, com a proclamação da independência nacional, Marcelino dos Santos assumiu importantes funções de Estado e do Governo, a destacar a de Presidente da Assembleia Popular e de ministro da Planificação Económica.
“Intelectual afirmado, o camarada Marcelino dos Santos foi um dos grandes percursores da poesia de combate, através da qual levou para o mundo inteiro o grito pela liberdade do povo moçambicano”, diz a Frelimo, endereçando condolências, “em nome de todos os militantes do partido, à família enlutada”.
Dos Santos foi também o primeiro ministro da Planificação e Desenvolvimento, cargo que deixou em 1977, quando se constituiu o primeiro Parlamento no país, que na altura era designado “Assembleia Popular”. Ele foi presidente do órgão até à realização das primeiras eleições multipartidárias, em 1994, e também governador de Sofala, na década de 80.
Imprensa internacional fala da morte de Marcelino dos Santos
A notícia sobre a morte do combatente da lura de libertação nacional também fez-se sentir no mundo, repercutida por várias agências de informação.
“Marcelino dos Santos (…) viveu tão intensamente a sua ligação à causa nacionalista e à Frente de Libertação de Moçambique”, tendo afirmado, nas suas aparições públicas ou em entrevistas aos órgãos de comunicação social, que: “não sou da Frelimo, sou a Frelimo”, escreveu a Agência Lusa.
O órgão destacou ainda a passagem do malogrado por Lisboa (1948-1951), na Casa dos Estudantes do Império e no Centro de Estudos Africanos, como militante anticolonialista.
A DW disse que Marcelino dos Santos foi “líder histórico e também um dos símbolos do nacionalismo africano. (…) Tinha uma grande característica: era o líder anti-líder, era aquele que conseguia dirigir sem ser chefe formal”. E sempre sublinhou que na Frelimo havia “uma maneira de ser que hoje ainda impera: a gente nunca decide o que quer”.
O Observador, Notícias ao Minuto, Correio da Manhã, África 21 Digital, A Bola e outros órgãos também não passaram ao lado da morte de Kalungano.