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Moçambique precisa de reduzir despesa e renegociar dívida pública

Foto: O País

Pensamento foi defendido por estudiosos e fazedores na economia, numa reflexão feita hoje sobre caminhos para a sustentabilidade da dívida pública, enquadrada nas celebrações dos 18 anos do jornal O País.

A dívida pública moçambicana continua insustentável, apesar da redução de 109% para 82% do Produto Interno Bruto (PIB), registada entre 2021 e 2022, de acordo com o mais recente Relatório da Dívida Pública, publicado pelo Governo, através do Ministério da Economia e Finanças.

E o cenário de insustentabilidade tem sido característico dos últimos anos, devido ao crescimento exponencial desde 2006, altura em que o rácio correspondia a 49% do PIB, em resultado de iniciativas de perdão da dívida, que o país conseguiu depois de negociações com os então principais credores.

Para que a dívida seja considerada sustentável, deve corresponder a 30% do PIB, de acordo com os indicadores do Fundo Monetário Internacional (FMI), mas o nosso endividamento público variou de 73% do PIB em 2015 a 109% do PIB em 2021.

No que diz respeito à sua composição, a dívida externa cresceu em cerca de 71%, de 2014 a 2021, influenciada por empréstimos do Banco Mundial, FMI, Fundo para o Desenvolvimento de África, a dívida com a China e a dívida da EMATUM, tornada soberana.

Já a dívida pública interna disparou cerca de 220%. Entre as causas do crescimento da dívida interna estão factores como a necessidade de financiar o défice de tesouraria para as despesas correntes, a redução das receitas fiscais, a pressão resultante do aumento do número e intensidade das calamidades naturais, o impacto económico da pandemia da COVID-19, as operações de combate ao terrorismo e as restrições no acesso a recursos externos.

 

PRECISAMOS DE IMPULSIONAR O CRESCIMENTO

Perante o quadro não favorável à sustentabilidade, o economista Mukthar Abdul Carimo sugere que Moçambique tome medidas urgentes para impulsionar a economia a ser mais produtiva. O economista justifica que, neste momento, cerca de 95% do que o Estado capta em receitas fiscais serve para pagar salários e remunerações e fazer face ao serviço da dívida.

“Impulsionar a economia pode ser feito imediatamente e isso não depende apenas do Governo. Tornar a economia mais produtiva passa por criar condições para a reanimação da actividade económica do sector privado e, para isso, vai ser necessário baixar a taxa de juro”, afirma.

O docente universitário da Faculdade de Economia da Universidade Eduardo Mondlane, Manuel Sibia, é um pouco mais optimista referindo que, pelos dados que apontam para uma redução do rácio da dívida pública de 109% para 82% do PIB entre 2021 e 2022, ainda há muito que deve ser feito. Entende que era possível fazer mais através de uma renegociação dos títulos da dívida pública, contudo lembra que o país não vive os melhores momentos em termos de credibilidade para com os parceiros internacionais.

“Isso não ajuda muito a termos margem de renegociação da dívida pública. Se tivéssemos essa margem, de certeza, teríamos capacidade de reduzir o serviço da dívida e permitir que existam mais recursos para investir no crescimento da economia”, afirmou o professor universitário, que também aponta a melhoria do ambiente de negócios como outro caminho que pode levar o país à sustentabilidade.

 

TEMOS QUE REDUZIR A DESPESA DE FUNCIONAMENTO

A necessidade de redução da despesa pública de funcionamento, maioritariamente dominado por salários e remunerações, também marcou a reflexão sobre a sustentabilidade da dívida pública. Economista e assessor da Câmara de Comércio de Moçambique, Hipólito Hamela, defendeu que há uma relação intrínseca entre a dívida pública e a elevada despesa do Estado.

“Este país está com um problema gravíssimo. A despesa pública está direccionada ao consumo, não está direccionada ao investimento. Todo o dinheiro que é arrecadado dos bolsos dos empresários e todos os impostos que os empresários pagam são destinados ao consumo”, vincou o economista, alertando para a necessidade de mudança desse cenário.

Mas Hipólito Hamela tem pouca fé de que grandes mudanças possam acontecer a curto prazo, considerando que tal oportunidade pode ser encontrada na transição de ciclo governativo. “As grandes mudanças são tomadas no início dos mandatos. Então, eu acredito que, no próximo mandato, o novo líder possa fazer mudanças profundas.”

Por seu turno, o economista António Souto defende que, mais do que reduzir a despesa, é preciso alterar a estrutura da despesa pública. E a despesa deve estar maioritariamente virada para investimento na melhoria das condições de vida da população e em projectos que possam gerar retorno, através da criação de capacidade de pagamento dos financiamentos.

De resto, os diversos participantes na reflexão sobre a sustentabilidade da dívida advogaram que é preciso “limpar” das contas públicas as chamadas dívidas ocultas que aumentaram o stock da dívida pública e levaram o nome do país ao descrédito perante os seus parceiros de cooperação.

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