Há cada vez mais meninas a terem a primeira menstruação antes dos 8 anos, o que aumenta o risco de gravidez na infância e na adolescência. A qualidade da alimentação e o ambiente em que a criança cresce é determinante para esta situação.
Não traz estatísticas, mas a sua experiência profissional permite-lhe falar à vontade. “As crianças com uma massa corporal ideal, as crianças bem nutridas, as crianças de raça negra alcançam a menarca muito mais cedo. As crianças mais obesas, em princípio, têm dificuldade em alcançar a menarca muito mais cedo, em princípio a menarca pode chegar aos 14 anos. Menarca é o surgimento da primeira menstruação. O surgimento da primeira menstruação indica que há uma sequência lógica da comunicação entre o cérebro e o ovário da menor e determina que ela vai ovular. Portanto, o surgimento da menstruação é sinal de que ela está a ovular. Ou seja, está a produzir óvulos e se ela produz óvulos é lógico que se tiver uma cópula terá a possibilidade de engravidar”, explica Dinis Viegas, médico gineco-obstetra.
É o que terá acontecido com a menina que engravidou aos 10 anos e deu à luz no domingo na cidade de Nampula. O caso dela não é isolado. Resulta dessa cada vez maior frequência de casos de primeira menstruação na infância.
“Nós vemos aqui, com o tipo de alimentação, a melhoria das condições de vida, vemos cada vez mais menarca precoce. Ou seja, surge a primeira menstruação antes dos 8 anos. É [uma tendência] global, com as condições ambientais como disse, questões relacionadas com a alimentação, genéticas, mas de uma forma muito particular nós vemos cada vez mais menarcas precoces em África e concretamente em Nampula é mais frequente ainda”, alerta Dinis Viegas.
Dinis Viegas é médico há 22 anos e nos últimos cinco actua como especialista em ginecologia e obstetrícia. Perante o caso da pequena mãe de 10 anos, aconselha aos país e encarregados de educação para que em caso de verificação da primeira menstruação se converse abertamente com a menina para que saiba se proteger e se abster das relações sexuais porque o risco de engravidar passa a ser iminente.
É mãe aos 10 anos quando ainda faltam 8 para terminar o processo biológico normal de crescimento. O caso inspira muitos cuidados e os psicólogos falam da necessidade de uma assistência psicológica prolongada.
“A própria psiquê dela também ainda está em crescimento e ela ainda não percebe o que é isto de ter um parto. Então, pode-se dar situações dela rejeitar o próprio bebé porque ainda não percebe o que é isto de ter e amamentar um bebé. Ela precisa de muito acompanhamento psicológico. Se não tiver, pode ter sequelas. Mesmo no futuro, quando for a crescer, as relações dela não vão ser seguras porque não vai confiar porque já tem trauma dos homens”, alerta Abia Alfredo, psicóloga clínica.
O homem que a abusou sexualmente até engravidar foi detido graças à intervenção da Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade, FDC, no distrito de Mecuburi, onde ela vivia.
“O tio da vítima, na comunidade que dista 104 km da vila-sede de Mecuburi, comunidade de Malute, ligou para o paralegal a denunciar este caso. Prontamente, o paralegal, juntamente com a Procuradoria ao nível do distrito e também o chefe da localidade dirigiram-se à localidade de Malute para neutralizar o infractor e neste momento encontra-se detido aqui na cidade de Nampula e a FDC tem uma advogada que está a dar acompanhamento deste caso”, assegura Clara Ferrão, oficial de Programas na FDC.
Porque a menor e a família estão numa situação de carência material que aumenta a vulnerabilidade, a FDC diz que está a preparar-se para dar um apoio em função do que se mostrar mais adequado para a produção de renda.

