Passam 47 anos após a assinatura dos Acordos de Lusaka e, ainda assim, a data que marcava o início da independência de Moçambique está gravada na memória daqueles que, “às escondidas”, torciam pela vitória do país.
Foram 10 anos de luta armada contra o colonialismo português, tudo com um único objectivo: conquistar a independência de Moçambique. Finalmente, a sete de Setembro de 1974, o país alcançou a vitória há muito almejada.
Em 1974, Silva Nhancumbe tinha 24 anos de idade, na altura trabalhava para os portugueses no Cinema Machava como projeccionista, um bom emprego na altura, mas as lembranças que tem daquele período não são boas.
“Sofríamos muito, éramos tratados como escravos, na verdade, para eles (os colonos) éramos uma mão-de-obra barata, por isso não éramos valorizados, qualquer coisa chamavam-nos pretos ordinários, era triste aquilo, mas precisávamos de ser fortes”.
No cinema onde trabalhava, tanto os “pretos” como os brancos podiam frequentar, mas havia separação – os pretos ficavam num lugar e os brancos noutro (mais confortável).
Era tanto sofrimento e a esperança era livrar-se do colono. Através de pequenos rádios escondidos, aguardavam por boas notícias.
“Nós escutávamos rádio, às escondidas, à espera que dessem a informação de que já estávamos livres dos colonos, mas tinha que ser de noite, no quarto e num volume muito baixo, para a Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE) não ouvir, porque, se ouvisse, teríamos problemas sérios”, recordou, magoado.
Maria Marta, esposa de Silva Nhancumbe, concordando com a narração do marido, prosseguiu e contou que, mesmo entre os moçambicanos, havia traidores a favor dos colonos portugueses, que, se soubessem que havia alguém a favor da independência, iam denunciar e, por isso, tudo era feito em segredo.
A espera foi tanta que, finalmente, através do programa “A Voz da Frelimo”, transmitido a partir da Tanzânia, veio a boa nova: a assinatura dos Acordos de Lusaka.
“Ficámos muito felizes e celebrámos em casa com amigos. Recordo que o dia todo não paravam de chegar pessoas para darem a boa nova e ficámos todos aqui a conviver”, recordou Maria Marta.
Aos 90 anos, o idoso Augusto Machanguana, que na altura tinha 43 anos, diz que, no dia, mesmo com medo da PIDE, preferiu seguir a pé com outros amigos para o Estádio da Machava.
“Estávamos todos lá, porque enquanto os dirigentes da Frelimo estavam a assinar os acordos, nós estávamos no estádio a cantar, dançar para lhes dar força, mesmo à distância, porque sabíamos que aquele momento marcava o início de uma paz que há muito almejávamos”, narrou.
Entre os sentimentos maus dos colonos, os bons (de alegria e esperança) superavam qualquer outro, afinal, a certeza era única…
“A partir daquele dia, já éramos livres, já não haveria branco ou preto, todos poderíamos frequentar os mesmos lugares e já não seriámos oprimidos. Foi um dia de muita alegria, arrisco em dizer que foi dos dias mais felizes da minha vida”, vangloriou Machanguana.