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MAMBAS: Um café com leite para Chiquinho e os seus bons rapazes

Fotos: FMF/O País

Os Mambas terminaram a sua participação na sétima edição do CHAN com um registo inédito. Pela primeira vez, Moçambique alcançou os quartos-de-final de uma prova organizada pela Confederação Africana de Futebol (CAF).

 

Texto: Ibraimo Assamo

 

Heróis improváveis. Uma nação dividida entre o mundo ideal e o real. Sonhos repartidos entre o desejo e a necessidade. Seria, no mínimo, contraproducente se os sentimentos fossem tão lineares.

A prova de que, afinal, tudo é possível veio de uma elite de jogadores que, por sinal, já havia dado indicações. O percurso sorrateiro na fase de qualificação, porém evidente no que diz respeito à necessidade de fazer a diferença, era o prenúncio de que ainda havia mais. De autênticos “outsiders”, os Mambas chegaram à Argélia sem que fossem tidos nem achados no contexto do futebol africano.

A sentença já estava, por isso, lida. Ou seja, a participação do combinado nacional na prova destinada aos jogadores que militam nos campeonatos internos era uma morte anunciada.

Não havia quem acreditasse que os Mambas pudessem passar da primeira fase, por força de uma história, que, escrita num quadro invertido, não nos era favorável. Nem os mais crentes dos humanos colocavam Moçambique numa posição digna dos grandes. Contudo, a história tratou de desmentir os factos.

OS INIMAGINÁVEIS “QUARTOS”

Primeira selecção a chegar à Argélia. Chiquinho Conde, exímio conhecedor do futebol, e os seus labirintos, cedo fez a leitura do quão fundamental era chegar ao local da competição com antecedência. Era preciso adaptar-se ao clima, sobretudo por ser diferente do de Moçambique.

Entretanto, não só o clima interessava ao seleccionador nacional, mas também a necessidade de concentrar o grupo de trabalho longe do “barulho” dos moçambicanos, uma vez que se tratava de uma fase crucial. Nisso o ex-capitão do Mambas se saiu bem.

E chegou o momento da competição. Ditou o sorteio que a Etiópia apadrinhasse o combinado nacional naquela que era a sua segunda participação no CHAN. Numa partida em que se antevia um desfecho favorável tanto para uma, como para a outra selecção, os Mambas tiveram uma entrada à altura do jogo.

Com uma equipa com processos do jogo bem definidos, os rapazes de Chiquinho Conde abordaram a partida de uma forma adulta. Apesar de terem criado muitas oportunidades de golo, não conseguiram concretizar.

A partida acabou por terminar empatada. Um arranque promissor para a selecção nacional, quando comparado com a sua estreia nesta prova, em 2014, na África do Sul. O país exultou com o empate, como que a antever que os próximos dias seriam ainda mais promissores.

O jogo contra a Etiópia tornou-se numa página virada para Chiquinho Conde e os seus jogadores. Pela frente nos esperava a Líbia, país que, não sendo necessariamente uma potência no futebol africano, tem as suas valências e uma bandeira por defender.

Para esta esta partida, o seleccionador nacional montou uma equipa com uma postura marcadamente virada ao ataque. Susto no início! Chico marca na sua própria baliza. Quão mestre da táctica, Chiquinho Conde conseguiu virar a história do jogo na segunda parte, mormente pelas mexidas que fez. E foi o que se viu.

Os Mambas conseguiram virar o resultado, vencendo a partida por 3-1. Diga-se, pela primeira vez, a selecção nacional “ousou” alcançar a sua primeira vitória numa competição sob égide da CAF. O povo moçambicano gritou o nome dos Mambas a plenos pulmões. O “Pátria Amada” elevou-se no concerto das nações.

A primeira vez é sempre primeira vez. A vitória contra os líbios colocava Moçambique com um pé nos quartos-de-final. Se antes não passava de um pensamento utópico, o sonho ganhou consistência.

Ora, ainda tínhamos a Argélia, por sinal, a única selecção que, à entrada da última jornada do Grupo A, havia feito o pleno, vencendo os primeiros dois jogos. Chiquinho Conde tinha noção das valências do seu adversário. Ainda assim, nunca se deixou intimidar, incutindo uma disciplina de respeito e irreverência nos seus jogadores.

Os Mambas encerram a primeira fase com uma derrota, por 0-1, diante da anfitriã Argélia. Mas a notícia é outra. Não obstante a derrota, a selecção nacional garantiu, pela primeira vez, qualificar-se para os quartos-de-final do CHAN.

Inédito! O feito foi exuberantemente festejado pelos moçambicanos. Chiquinho Conde e seus jogadores escreveram mais um pedaço de história no “livro sagrado” do futebol moçambicano.

“MEIAS” FALHADAS

Fechou-se uma etapa, mas abriu-se outra. Uma vez garantido o acesso aos quartos-finais, a música cantada com as notas de Maria Callas era outra. O sonho de Chiquinho Conde, seus jogadores e os moçambicanos ganhou outra dimensão. Porque o sonho comanda a vida, a qualificação para as meias-finais passou a ser a meta, até porque não era algo doutro planeta.

Calhou-nos o Madagáscar, conjunto que venceu todos os jogos na fase de grupos, conservando ainda o estatuto de melhor selecção. A Confederação Africana de Futebol não hesitou em dar as faixas e os respectivos galardões aos malgaxes.

Na antevisão da partida, Chiquinho Conde atribuiu o favoritismo à selecção do Madagáscar, quiçá na tentativa de sacudir a pressão. Mexidas no “onze”. O seleccionador nacional lançou duas novas unidades, no caso Yude e Macaime.

A intenção até foi boa, mas a história do jogo escreveu-se de uma outra maneira. O Madagáscar impôs-se no jogo, com uma vitória por 3-1. Terminava assim o sonho dos Mambas de chegarem às meias-finais pela primeira vez. O quadro geral da participação moçambicana no CHAN aponta para um gráfico surpreendente. Ainda há mais mares que marinheiros.

NOTAS E ILAÇÕES

Os jogadores dos Mambas não só travaram batalhas dentro do campo com os seus adversários, assim como fora dele. A qualificação da selecção nacional para os quartos-de-final gerou um burburinho. O prémio do jogo foi o pomo da discórdia.

Os jogadores exigiram à Federação Moçambicana de Futebol (FMF) o incremento do prémio, dos 40 mil previamente acordados para 150 mil Meticais. Entendiam, os jogadores, que mereciam mais. Depois de rondas negociais aturadas, a FMF fixou o prémio em 75 mil Meticais, facto que não agradou aos jogadores.

Como forma de mostrarem o seu descontentamento, os atletas chegaram a ameaçar não viajar à Cidade de Constantine onde deveriam defrontar o Madagáscar. Entre avanços, incertezas e recuos, sobretudo pela honra às cores nacionais, os jogadores reconsideraram a sua decisão.

Nas vésperas da partida contra a selecção malgaxe, os Mambas foram bafejados pela sorte, com o Governo a prometer um aumento no valor do prémio, totalizando já os 150 mil exigidos pelos jogadores.

Muito se disse e se escreveu em relação ao “dossier” prémios de jogo, a verdade é que a FMF veio a terreiro dizer que a exigência dores jogadores devia-se à suposta disponibilização de 400 mil dólares (cerca de 25 milhões de Meticais) pela CAF, facto que segundo esse organismo não constituía a verdade.

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