Por Nataniel Ngomane
Aquando da atribuição do título de Doutora Honoris Causa à escritora Paulina Chiziane, pela Universidade Pedagógica de Maputo, fui indicado para seu padrinho. Dessa posição, coube-me proferir palavras de louvor à doutorada, naquilo que as academias – entre outras designações – chamam discurso panegírico. Este texto resulta dessa participação no acto de outorga do título honorífico à Paulina Chiziane, na qualidade de padrinho da laureada. Nessa solenidade, desafiei-me a apresentar parte do meu testemunho sobre as realizações dessa agora minha afilhada, Paulina Chiziane. Obviamente, parte significativa desse testemunho já fora apresentado por outras pessoas, nesse evento. Ainda assim, não me coibi de incluir algo mais que, agora, por ocasião da entrega, hoje, do Prémio Camões à nossa Paulina, aqui partilho.
Iniciei a minha intervenção agradecendo a escolha que recaíra sobre mim para ser padrinho da Prémio Camões 2021. Uma escolha marcada, primeiro, pela unanimidade dos organizadores do acto e, logo depois, entre estes e a própria Paulina, quando esta tomou conhecimento do programa que estava a ser proposto. Considerada essa unanimidade, a minha escolha revela – ainda que de forma discreta –, o quão fortes são os laços de proximidade que me unem à Paulina, situação que, em si, constitui um grande privilégio.
São laços de amizade e de irmandade que vêm acompanhando os nossos percursos de vida há bastantes anos. E tudo indica nunca terem passado despercebidos ao grande público, nem sequer à Academia, em particular à Universidade Pedagógica de Maputo, entidade outorgante do título. Por sua vez, ao tomar conhecimento de quem estava a ser proposto para padrinho – segundo me confidenciaram –, Paulina Chiziane não só concordou de imediato como reiterou, com convicção, que a escolha não poderia ter sido outra, porque essa era, de facto, a escolha. A sua escolha. E não poderia ter sido outra.
Se, por um lado, vinda de onde e como veio – da unanimidade da Universidade Pedagógica com a escritora –, essa escolha enche-me de orgulho, por outro, também me honra sobremaneira ser indicado padrinho da pessoa especial que é Paulina Chiziane, a primeira mulher preta, africana e moçambicana a vencer o Prémio Camões, num universo de trinta e três (33) atribuições nas quais apenas sete são mulheres. Ela inclusa. Prémio Camões, considerado o mais prestigiado prémio das literaturas de língua portuguesa. Ser indicado padrinho dessa pessoa especial, conforme dizia, na cerimónia que a conferiu o título de Doutora Honoris Causa em Estudos Artístico-Culturais e Literatura, constitui para mim, sem margem para dúvidas, também uma elevada distinção. Por isso, agradeço profundamente a unanimidade da minha escolha ao Magnífico Reitor da Universidade Pedagógica, Prof. Doutor Jorge Ferrão, aos organizadores desse elevado acto e, em especial, à minha amiga, colega, irmã e companheira de longos e, não poucas vezes, duros percursos, Paulina Chiziane, a quem digo, na nossa língua: na bonga nguto, ndiyango! Agradeço muito, minha irmã!
Não se trata, esta breve descrição – como pode parecer –, de uma mera verborragia. Ela procura situar e explicar, de certa maneira, as razões que podem estar por detrás da convergência de opiniões e posturas sobre a escolha que em mim recaiu: os laços que unem padrinho e afilhada. Tal é o aspecto que abriu portas para a minha intervenção – agora, aqui partilhada.
Quando e como conheço Paulina Chiziane?
Conheci a Paulina Chiziane, se não me falha a memória, na sala de aulas e nos corredores da então Faculdade de Letras (FL) da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), hoje Faculdade de Letras e Ciências Sociais (FLCS). Em 1989. Frequentávamos, então, o primeiro ano do curso de Linguística. Entre outros colegas, hoje figuras públicas de reconhecido mérito, faziam parte da nossa turma a Doutora Aíssa Mithá Issak, presente na cerimónia; os jornalistas Alfredo Dacala e Moisés Mabunda; as professoras Albertina Moreno (já falecida), que foi Directora do INDE – o Instituto Nacional de Desenvolvimento da Educação -, Benilde de Sousa Vieira, Rosa Enosse, Samaria Tovela, Samima Patel, o actual Director do Centro de Línguas da UEM, Doutor Carlos Manuel, os então destacados jogadores de basquete e nossas bases de apoio para as disciplinas de Matemática, Estatística e Lógica Matemática – que se esmeravam para sempre nos esclarecerem as imensas dúvidas nessas áreas –, Bruno Carvalho e Stélio Mavimbe, entre outros colegas dessa turma. Mas, como a Paulina e eu estávamos entre os mais velhos da turma, e os temas das nossas conversas nos aproximavam, andávamos sempre juntos. Em particular nos intervalos. Além disso, nos momentos de lazer, fora da Faculdade, juntávamo-nos ao nosso saudoso amigo Eduardo White, o poeta, e nos deliciávamos dos diversos espaços culturais da cidade de Maputo, não poucas vezes, até altas horas da noite, quando já não havia machimbombo para Matola, onde a Paulina residia. Nessas ocasiões, ela passava a noite na minha casa, num sétimo andar do bairro do Alto Maé, onde dormia com as minhas filhas no quarto destas, ganhando sempre no dia seguinte – e eu também –, um cuidadoso mata-bicho preparado e servido pela minha mulher, depois do qual minha mulher e eu a levávamos para Matola onde, invariavelmente, encontrávamos o Dudú e a Marisa, seus filhos, esperando-a no portão da casa. Foi por essas alturas que esses seus filhos se tornaram meus sobrinhos e, a Paulina, tia das minhas filhas. Já éramos irmãos. E somos, desde então. Mas, voltemos à Faculdade.
Num belo dia, sentados no banco de um dos corredores, ela disse-me, de repente: sabes, não sei o que é que eu ando a fazer por aqui. Eu, espantado, indaguei: como assim!? E ela, com muita seriedade, olhando bem para dentro dos meus olhos, respondeu tranquilamente: devia ficar em casa a escrever as minhas histórias. E manteve fixo aquele olhar sério dentro dos meus olhos. Então, eu disse-lhe: faz isso. Fica em casa e escreve as tuas histórias. E ela fez isso. Fez isso! E esse foi o último dia em que Paulina Chiziane esteve na Faculdade como estudante de Linguística. Nunca mais lá voltou. Estávamos, então, no segundo ano do nosso curso. Pouco depois, publicou Balada de Amor ao Vento, em 1990. Que se saiba, o primeiro romance escrito por uma mulher em Moçambique e por cá publicado.
Passado mais algum tempo, e numa daquelas vezes que a levávamos para Matola, entregou-me uma daquelas enormes e antigas pastas de arquivo que conhecemos há muito tempo, totalmente cheia de papel A4 dactilografado. Pediu-me que lesse aquilo tudo e dissesse algo. Olhei para ela; não tinha como recusar. Era o original, sem cópia absolutamente nenhuma, do que veio a ser a sua segunda publicação em livro, em 1995: Ventos do Apocalipse. E deu-me, nesse então, o privilégio de apresentar esse romance ao público, na Matola. Fi-lo prazerosamente. O Mia Couto esteve.
Edição da autora, Ventos do Apocalipse abriria as portas para a Paulina percorrer o mundo. De facto, uma senhora austríaca que lera e apreciara positivamente o primeiro romance da autora, Balada de Amor ao Vento, fez de tudo e conseguiu que esse segundo livro, Ventos do Apocalipse, ganhasse uma tradução em alemão e fosse, junto com a autora, ser exposto na Feira do Livro de Frankfurt, na Alemanha. A maior Feira do Livro do mundo que se conhece. Estando lá, expondo o seu livro numa barraca de livros em alemão, Paulina Chiziane é descoberta por Zeferino Coelho, o bem conhecido editor da Editora Caminho – agora da Leya – que, espantado por vê-la no meio de obras em alemão, sendo ela uma escritora de língua portuguesa, convida-a a conhecer o pavilhão onde estavam expostos os livros escritos em português. E ainda a convida a ir com ele a Portugal. Literalmente, a rota de viagem de Paulina, que deveria ser Maputo-Frankfurt-Maputo, foi desviada por Zeferino Coelho, tendo seguido viagem, logo após o encerramento da Feira em Frankfurt, para Portugal. Pouco depois, em 1999, saía a segunda edição de Ventos do Apocalipse, sob chancela da Caminho. Caminho, onde já haviam passado escritores como José Saramago, José Craveirinha e outros de grande peso nas literaturas de língua portuguesa. Talvez fosse o indício do peso que ela viria a ter entre nós. E assim se abriram, de uma vez por todas, os caminhos internacionais da nossa Prémio Camões 2021.
Depois seguiram-se O Sétimo Juramento, em 2000, bastante procurado e lido, inclusive, pelos vendedores informais de Maputo. Pouco depois, o romance que está a fazer furor: Niketche: uma história de poligamia (2002). Niketche foi escolhido há pouco, no Brasil, para ser uma obra de leitura obrigatória para quem queria ingressar na Unicamp, a Universidade de Campinas, do Estado de São Paulo. Essas últimas duas obras saíram também pela Ndjira, sediada em Maputo. Uma espécie, nesse então, de uma extensão da Caminho. Mas, quem é, de facto, Paulina Chiziane?
Quem é, de facto, Paulina Chiziane?
Paulina Ricardo Chiziane, de nome completo, nasce a 04 de Junho de 1955, em Moçambique, no distrito de Manjacaze, província de Gaza. Filha de pai alfaiate, Ricardo Chamusse Chiziane, e de mãe camponesa, Adelina Khau, é a sétima filha de um total de oito irmãos. O primeiro contacto dessa família com a literatura, no sentido mais amplo, ficou-se a dever à milenar prática tradicional dos contos à volta da fogueira. Ainda hoje, em várias regiões de Moçambique, essa prática continua viva e a iluminar as mentes e a imaginação de uma vasta massa de crianças. E não só. Tudo indica, por conseguinte, que a prática das narrativas orais à volta da fogueira, em Manjacaze, no seio da família, pode ter sido a primeira escola literária da nossa Doutora Honoris Causa em Estudos Artístico-Culturais e Literatura, e Prémio Camões 2021, enquanto ponto de partida para o seu gosto particular em contar histórias. E hoje recebe o prestigiado Prémio Camões.
É sobejamente sabido que Chiziane sempre recusou os consolidados rótulos de romancista e feminista. Categórica e reiteradamente, tem afirmado que o que escreve tem mais a ver com as suas vivências ao longo dos seus anos de vida e não com movimentos de ideias. Desse ângulo, parece não restarem dúvidas de que os contos à volta da fogueira, ora referidos, constituíram, de facto, o marco inicial da sua paixão pelas narrativas, paixão que se vincula, indubitavelmente, às práticas tradicionais da sua comunidade de origem – e de Moçambique, de uma forma geral -, aspecto sempre presente na sua escrita. Seja ela ficcional ou ensaística.
Com 5 anos de idade, Paulina muda-se com os pais, de Manjacaze para Lourenço Marques, hoje a capital Maputo. Começa a estudar, frequentando a escola indígena da igreja católica, embora a sua família fosse protestante. Aí, ainda na escola primária, descobre que gosta de pintar e sonha um dia vir a ser pintora. Mas as condições de vida e o sistema patriarcal da família não permitiram a realização desse sonho. Pintar, para o raciocínio de então – e mesmo com a elevada abertura cultural dos dias de hoje –, pintar, para alguns, ainda é, às vezes, coisa de rico; coisa de homens, não de mulheres. A mulher devia preparar-se para casar e ser dona de casa. Talvez, por aí, a sua atenção em relação à temática da mulher. Mergulhada nesse raciocínio, Paulina decide substituir a pintura pela escrita. Pelo que fiquei a saber, o seu primeiro acto de escrita deu-se através de um diário que ela havia atribuído o nome “O Diário dos Sonhos”. Um manuscrito que acabou não saindo dos sonhos, acabando, mesmo, por se perder com e no tempo.
Ao despertar, Paulina divertia-se, tentando representar, já não com a pintura, mas com a palavra, tudo o que sonhara e de que se lembrasse. Desse modo, foi desenvolvendo habilidades na escrita, o que fazia sigilosamente: os pais não podiam saber que gastava papel na escrita de coisas infantis. E “coisas infantis”, no caso, poderia significar coisas insignificantes, sem importância. A família era pobre e, por isso mesmo, devia-se poupar o caderno escolar. Os pais não podiam saber que ela gastava papel na escrita de coisas “sem valor”, infantis. Contudo, deve ter sido nessa fase da escola que emergiram as primeiras influências literárias para esta autora, tendo como fontes a Literatura Portuguesa.
A Literatura de Cordel que, de certo modo, nos reenvia a relatos orais e formas populares, era uma das suas preferidas. Também teve contacto com livros que representavam o guardador de gado bovino norte-americano, o vaqueiro, mais conhecido em Moçambique, nas famosas revistas de banda desenhada, por “cowboy”. Mais tarde, ela teve contacto com a Literatura Brasileira e com os grandes autores africanos. Essa é a Paulina que, tendo percorrido vários e longos caminhos, foi candidata e recebeu o título de Doutora Honoris Causa em Estudos Artístico-Culturais e Literatura, pela Universidade Pedagógica de Maputo, e recebe hoje, 05 de Maio de 2023, o Prémio Camões.
O quotidiano moçambicano, enquanto fonte de inspiração para a escrita, chega-lhe já na idade adulta, dominando-a, obrigando-a a tomar aquela posição que tomou no banco do corredor da Faculdade: ficar em casa a escrever os seus livros. É quando começa a descrever os anseios, as contradições e dificuldades de uma sociedade que luta por ser ela, luta por sobreviver e reconstrói-se. O terror da guerra civil em Moçambique, presenciado na primeira pessoa, quando trabalhava como assistente de emergência na Cruz Vermelha de Moçambique, foi um estopim para os seus temas. Trabalhar na Cruz Vermelha de Moçambique constituiu, para Paulina, uma forte motivação para a publicação dos seus escritos. As práticas tradicionais no Norte, além das do Sul, ganham espaço nas suas obras. Tais são os casos das já referidas obras O Sétimo Juramento, que aborda o Sul; Niketche: uma história de poligamia, que aborda o Norte; às quais veio a juntar-se O Alegre Canto da Perdiz (2008), que aborda o Centro-Norte. As duas últimas, em particular, Niketche e O Alegre Canto da Perdiz, versando sagazmente sobre o universo feminino, levam a que Chiziane seja considerada, por muitos, uma feminista. Porém, a opressão da mulher no dia-a-dia, também dentro da família patriarcal, de onde ela é originária, em conexão com as ideias libertárias que ocorrem no país e no mundo, creio terem ajudado a criar na Paulina uma literatura própria, ímpar, de causas humanas incomensuráveis e com discurso humanista.
Da ficção literária ao ciclo ensaístico
A seguir a O Alegre Canto Da Perdiz, é como se o ciclo do romance se tivesse fechado, substituído pelo do conto. E aí surgiram As Andorinhas, também em 2008, uma colectânea que narra a história de 3 personalidades moçambicanas, com destaque para Eduardo Chivambo Mondlane, o arquitecto da unidade nacional. Essa narrativa, em particular, veio a merecer uma adaptação para o teatro, no mesmo ano, apresentada num recital alusivo, exactamente, ao Ano Eduardo Mondlane. Ainda em 2008, Paulina organiza em Angola, em parceria com Dya Kassembe, As Heroínas Sem Nome: memórias de guerra e paz das mulheres em Angola, com o financiamento da ajuda popular da Noruega. Depois disso, faz uma pausa e, ao retomar a escrita, entra num novo ciclo: ensaístico.
Primeiro, escreve Na Mão de Deus (2012), em parceria com Maria do Carmo da Silva. Essa obra devia ter sido a primeira a sair. Mas saiu primeiro Por Quem Vibram os Tambores do Além (2013), em co-autoria com Rasta Pita. Costumo dizer que se trata de uma trilogia, juntando-se a essas duas Ngoma Yethu: o curandeiro e o novo testamento (2015), escrito em parceria com Maria Ana Martins. Depois da publicação de Na Mão de Deus, em co-autoria com Maria do Carmo Silva – livro em que Paulina, a pretexto de discorrer sobre uma dramática experiência de vida, levanta o véu a toda uma série de questões fortemente marcadas pela discriminação, exclusão e, consequentemente, marginalização dos doentes mentais, quer pelas famílias quer pelos hospitais e pelo Estado –, a longínqua autora de Balada de Amor Ao Vento, Ventos do Apocalipse, O Sétimo Juramento, Niketche, As Andorinhas e O Alegre Canto da Perdiz, parece ter, de facto, a partir de então, optado por um novo paradigma de escrita, não propriamente ficcional, mas contemplativo-reflexivo, ao nos apresentar Por Quem Vibram os Tambores do Além, Na Mão de Deus e Ngoma Yethu. Nestas obras, ela volta o seu olhar para África, para as suas práticas ancestrais, suas crenças; para as suas religiões e diz qualquer coisa como “África, Surge et Ambula”. Algo como, “África, seja você mesma e aposte na identidade africana, na sua africanidade”!
A seguir, estreia-se na poesia com O Canto dos Escravos (2017), como se aprofundasse a busca da sua própria ancestralidade, percorrendo os caminhos da história. E depois deu espaço a uma laboriosa pesquisa, traduzindo a palavra por meio da música. E aí nos surpreende, compondo, editando e publicando música num disco compacto (CD), em 2019: Mensagem de Esperança em Tempo de Corona Vírus. Trata-se de um trabalho feito com um grupo de amigos. Em 2021 escreve e publica, também em co-autoria – desta vez, com Dionísio Bahule –, A Voz do Cárcere, colectânea de depoimentos de presidiários. De 2011 para cá, trabalhou na composição orquestral de uma ópera de natureza histórica, recentemente estreada (2023), na pretensão genuína de apresentar a história de África por meio da música. Paulina Chiziane subiu aos palcos não apenas como autora de textos dramáticos, mas também como actriz. E Msaho é a denominação da ópera africana de sua autoria, que juntou vários pesquisadores – entre dramaturgos, historiadores, filósofos, e não só.
Deve-se referir que de 1988 a 2002, Paulina publicou vários contos na Revista Tempo, nos jornais Notícias e Domingo; participou em conferências de arte e literatura em Moçambique e em diferentes universidades da Europa, Ásia, América e África, actividade à qual continua ligada; publicou várias comunicações e entrevistas em revistas culturais e científicas de diferentes línguas, também na Europa, Ásia, América e África, e está presente em diversas antologias na Alemanha, Estados Unidos, Noruega, Polónia, Suécia, Suíça, entre outros países. E todos os seus livros são matéria de diferentes estudos e, em particular, ao lado de Mia Couto, Paulina encabeça os autores moçambicanos alvo de estudos em dissertações de licenciatura, mestrado e teses de doutoramento no Brasil e em Portugal. Candidata nomeada ao Prémio Nobel da Paz de 2005, pelo movimento One Thousand Peace Women for Nobel Price – em reconhecimento ao seu trabalho de escrita militante pela causa da igualdade e justiça, igualdade nas relações humanas do seu país, e reconhecimento do trabalho social na promoção da mulher e dos grupos desfavorecidos – Chiziane foi também nomeada uma das mil mulheres pacíficas do mundo, pelo movimento internacional de paz One Thousand Peace Women. Ganhou, em parceria com Mia Couto, o prestigiado Prémio José Craveirinha de Literatura, em Moçambique, pelo livro Niketche. E é interessante fazer referência a esta parceira com Mia Couto, porque Paulina, afinal, e com base, precisamente, nesse seu livro Niketche, foi anunciada recentemente por uma universidade indiana, ao lado de Pepetela, escritor angolano, no sentido de que esse seu livro, Niketche, seria traduzido para a língua bengali, da Índia, junto com uma obra do escritor angolano. Portanto, não é só com Mia Couto que se notam parcerias desta autora, que hoje recebe o Prémio Camões, mas também com Pepetela. E mais: no dia da cerimónia de outorga do título de Doutora Honoris Causa à nossa Paulina, Pepetela recebera no dia anterior o seu título de Doutor Honoris Causa.
Paulina Chiziane é Prémio Camões 2021, prémio que recebe hoje. Quem ganhou o Prémio Camões em Moçambique foi José Craveirinha e Mia Couto. Ou seja, e no final das contas, a nossa Paulina não está somente ao lado de Pepetela; não está apenas ao lado de Craveirinha, Mia Couto, José Saramago e outros, pela Caminho – onde todos esses publicaram livros –; ela está também ao lado de todos aqueles escritores que, como ela, ganharam o Prémio José Craveirinha e ganharam o Prémio Camões. Ela é, de facto, uma grande escritora. Não por acaso, vence em 2021 o Prémio Camões, sendo, digo uma vez mais, a primeira mulher preta e africana a receber esse prestigiado Prémio.
Também recebeu várias condecorações: a de Grande Oficial da Ordem de Infante Dom Henrique, em Portugal; a Ordem do Cruzeiro do Sul, no Brasil; a de Medalha de Artes e Letras, em Moçambique. Os seus livros estão traduzidos e publicados em vários países, desde o Brasil e Portugal, passando pela Alemanha, China, Croácia, Espanha, Estados Unidos da América – só para citar alguns exemplos. E, mais recentemente, Índia, como referido. É essa mulher, pois, Paulina Ricardo Chiziane que, pela profundidade da sua obra literária e ensaística, pelo seu trabalho musical e teatral, pela sua dignidade e verticalidade, pelo seu nacionalismo, seu humanismo e sua profunda visão, defesa e valorização da cultura ancestral moçambicana e africana, hoje Doutora Honoris Causa em Estudos Artístico-Culturais e Literatura, pela Universidade Pedagógica de Maputo, que eu, com muita honra, na qualidade de padrinho, apadrinho – também hoje, dia em que ela recebe, meritoriamente, o Prémio Camões, ganho em 2021.
Parabéns à nossa Paulina Chiziane!
Maputo, 05 de Maio de 2023.