Imaginemos…. Uma jovem dos seus 18, 20 ou 22 anos de idade. Enfermeira, que sai de Maputo, em plena guerra, para ir exercer a profissão em Cuamba, Niassa. Bonita, com voz suave e atributos inigualáveis. Agora, imaginemos essa jovem deslumbrante, entre a força e os assédios dos soldados, a escolher apenas um para entregar o seu coraçãozinho cor-de-rosa. A jovem aprende a amar em plena guerra, no meio de tiros, ódio, rancor e traição. E, quando o amor parece triunfar, mesmo perto de Cuamba, seu destino, Taiar, o homem que a jovem escolheu, morre, depois de ser baleado. Esta é a estória da Rosa, personagem de “Comboio de sal e açúcar”, filme de Licínio Azevedo, que, finalmente, estreou ontem, nas duas salas da Lusomundo, em Maputo, em simultâneo.
Adaptado pelo poeta Luís Carlos Patraquim, do livro com o mesmo título de Licínio Azevedo, “Comboio de sal e açúcar” juntou um elenco de grandes actores, que, de facto, fazem do filme uma obra-prima do cinema moçambicano, que, pelo argumento, tem capacidade de, na viagem ferroviária, conduzir os espectadores a tantas outras: pelo tempo, pela história, pela dor escondida nas cicatrizes dos que viveram a guerra dos 16 anos e, fundamentalmente, pela memória.
A propósito de memória, momentos antes da estreia, depois de se referir ao empenho que Samora Machel teve na criação e do Instituo Nacional de Áudio Visual e Cinema (INAC), Azevedo disse que é importante preservar o cinema, porque “um país sem cinema é um país sem memória”. E, nesse aspecto, o filme é um livro aberto que concilia arte e conhecimento, sem deixar o drama, o suspense longe da expectativa de quem com os olhos abertos vê com quantos litros de sangue derramado foi feito o país que, agora, “está de volta”. Por onde andou?
Na Lusomundo, além do filme com cerca de duas horas, o auditório contou com a presença dos actores. Os ministros dos Combatentes e do Interior não quiseram perder a oportunidade, e fizeram à sala para ver na tela o que traduz a alma de um povo, preto no branco, com a mestria que compõem grandes produções. “Comboio de sal e açúcar” é um desses filmes, por isso Djlama Lourenço, do INAC, fez questão de lembrar que o foi premiado em festivais internacionais, como o do Cairo, Egipto (Melhor Realizador), e de Joanesburgo, África do Sul, (Melhor Longa Metragem)
A tropa de elite do filme que é de Moçambique para os moçambicanos
O sucesso deste “Comboio” não se fez ao acaso. Uma equipa vasta juntou-se para o efeito. Além dos actores: Matama Joaquim, Melanie Rafael, Abdil Juma, Thiago Justino e Sabina Fonseca, a obra contou com serviços de Ukbar Filmes (que aposta em jovens realizadores portugueses em Portugal), Ébano Multimédia (uma das mais antigas produtoras moçambicanas de cinema e vídeo), A Les Films de l’Étranger (que co-produz, na Europa e in-ternacionalmente obras premiadas), Urucu Média (pequena equipa dedicada a alimentar vozes autênticas no cinema africano) e Panda Filmes (que deixou sua marca na cena audiovisual brasileira). “Comboio de sal e açúcar” foi produzido por Pandora da Cunha Telles e Pablo Iraola, e co-produzido por Licínio Azevedo, Philippe Avril, Beto Rodrigues, Tatiana Sager, Elias Ribeiro e John Trengove.