O turismo é hoje reconhecido como uma das maiores forças económicas globais. Em torno dele, ocorrem fenómenos de consumo, formam-se mercados, originam-se rendas, criam-se empregos, movimentam-se cadeias de valor e consolida-se a confiança dos investidores. É um sector que vai muito além do lazer: constitui uma poderosa engrenagem de desenvolvimento económico e social. Países como Portugal, Cabo Verde, Maurícias ou Seychelles demonstraram que apostar no turismo pode transformar realidades, tornar-se a maior fonte de receitas nacionais e abrir horizontes internacionais para economias que, de outra forma, permaneceriam frágeis e limitadas.
Em Moçambique, a discussão sobre a diversificação da economia ganha cada vez mais força, e é neste contexto que surge a visão estratégica de projectar Inhambane como a Capital do Turismo de Moçambique. Não se trata apenas de um slogan político ou promocional: é um plano que pode redefinir a dinâmica da província e do país, tornando-a um verdadeiro pólo económico de referência regional e continental.
Inhambane reúne condições únicas que a diferenciam no mapa turístico africano. Ao longo do seu litoral, os Big Five Marinhos — tubarão-baleia, dugongo, raia manta, tartaruga e golfinho — atraem mergulhadores, cientistas e curiosos de todo o mundo, colocando a província entre os destinos mais procurados para o turismo subaquático. Já no interior, os Big Five Terrestres — leão, elefante, rinoceronte, leopardo e búfalo — oferecem experiências de safári autênticas, transformando Inhambane num dos raros locais onde natureza marinha e terrestre se cruzam de forma tão completa e espectacular.
Porém, Inhambane não é apenas biodiversidade. O seu património cultural é igualmente deslumbrante. A timbila, classificada pela UNESCO como Património Oral e Imaterial da Humanidade, ecoa em cerimónias e celebrações locais, acompanhando danças como o Zore e o Dzumba. Os sítios arqueológicos de Manyikeni e Chibuene testemunham uma história milenar de contactos e comércio, enquanto a arquitetura colonial da cidade confere-lhe um charme particular, resultado da fusão entre culturas e tempos. Quem visita Inhambane não encontra apenas paisagens idílicas, encontra também autenticidade cultural, hospitalidade ímpar e uma identidade que permanece viva.
Contudo, a estratégia de afirmação de Inhambane não pode restringir-se ao turismo internacional de luxo. É imperativo construir também um turismo de massa, acessível aos próprios moçambicanos, garantindo que cidadãos de diferentes rendimentos possam visitar e usufruir da província ao longo de todo o ano. Para isso, deve ser incentivado o investimento de nacionais em estâncias turísticas adaptadas às classes média e de menor rendimento, de modo a ampliar a circulação de rendimentos internos e consolidar um mercado interno dinâmico, base sólida para o crescimento sustentável do sector.
O turismo, porém, não pode ser visto isoladamente. Como motor da economia, deve impulsionar outras áreas estratégicas. A industrialização, associada ao processamento de produtos locais, é prioridade para acrescentar valor à produção agrícola e às matérias-primas da região. A agricultura deve ser estimulada para abastecer o sector turístico, garantindo cadeias curtas e sustentáveis de fornecimento. O mercado de seguros precisa de crescer, oferecendo garantias modernas para investidores, empresários e turistas. As clínicas e serviços de saúde devem ser fortalecidos para responder tanto às populações locais como à procura internacional. A modernização dos aeroportos, a revisão do modelo de concessão de vistos e a eficiência do sector dos transportes são condições indispensáveis para atrair fluxos turísticos consistentes.
Ao mesmo tempo, é necessário inovar na forma de envolver as comunidades. Uma ideia estratégica é associar estâncias turísticas a famílias locais, construindo programas bem definidos que ofereçam aos visitantes experiências únicas de interação cultural, social e gastronómica. Para isso, é essencial capacitar as famílias, criar sistemas de acompanhamento e certificação e garantir que estas vivências sejam organizadas e sustentáveis. Assim, o turista não encontra apenas um destino bonito, mas mergulha num universo humano e autêntico que só Inhambane pode oferecer.
A consolidação desta visão exige, porém, uma transformação profunda das infra-estruturas. Não há turismo competitivo sem estradas de qualidade, linhas férreas que liguem os distritos, energia estável, telecomunicações modernas e saneamento básico. Estas são condições estruturantes que determinam a hospitalidade e, sobretudo, a confiança de investidores que não podem arriscar em ambientes de fragilidade logística. Inhambane precisa de pensar em grande, construir com futuro e integrar o turismo numa lógica de desenvolvimento global.
O lançamento da Conferência Internacional de Turismo — Global Sustainable Tourism Summit — representa uma viragem estratégica. Prevista para se realizar de dois em dois anos, alternando entre Inhambane e Vilankulo, a conferência será mais do que uma vitrine: será uma plataforma de projecção internacional, de atracção de capital e de promoção de parcerias globais. Ao reunir decisores, investidores, empresários e comunidades, este encontro discutirá inovação digital, economia azul, turismo comunitário e conservação ambiental, projetando Inhambane como um destino que alia potencial económico à sustentabilidade.
Entretanto, o sucesso desta transformação depende de um factor decisivo: a confiança. Sem uma regulação fundiária clara e sem a eliminação da especulação de terra, nenhum grande investidor se fixará em Inhambane. É essencial que o Governo assuma uma postura firme, definindo áreas específicas para construção de hotéis e restaurantes, em especial junto ao mar, e garantindo que a concessão de licenças seja rápida, transparente e previsível — idealmente num único dia. O tempo da burocracia paralisante tem de dar lugar a um ambiente competitivo, capaz de atrair investimentos estruturantes e visionários.
Inhambane precisa de pensamento disruptivo. Precisa de autorizações especiais que acelerem a criação de resorts, hotéis e infra-estruturas turísticas modernas. Precisa de uma articulação inteligente entre Governo Provincial, Autoridade Tributária, APIEX, ANAC, sector bancário e curadores da conferência, para apresentar aos investidores — nacionais e estrangeiros — uma proposta verdadeiramente competitiva. Cada dia perdido em burocracias e indefinições é uma oportunidade desperdiçada de gerar empregos, receitas fiscais e divisas.
Se os projectos forem implementados com responsabilidade, transparência e envolvimento das comunidades locais, Inhambane deixará de ser apenas conhecida como “Terra da Boa Gente” para se afirmar como capital do turismo nacional e motor económico de Moçambique. A província tem todas as condições para ser, não apenas um destino turístico de referência em África, mas também um exemplo de como o turismo pode transformar sociedades, gerar riqueza, criar identidade e afirmar um país no mapa mundial.
Com mar, safáris, cultura vibrante, hospitalidade autêntica e investimentos à vista, Inhambane está perante uma oportunidade histórica. Transformar-se-á ou não numa capital do turismo? A resposta depende da capacidade de Moçambique acreditar no seu próprio potencial, romper com as barreiras do passado e construir um futuro em que o turismo seja, não apenas lazer, mas o verdadeiro motor da economia nacional.
