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França e Senegal participam no Mozambique Fashion Week

A edição 2023 do Mozambique Fashion Week (MFW), que decorre em Maputo, conta com a participação da estilista franco-senegalesa Rama Diaw e da directora francesa Nadine Gonzalez. As duas profissionais vieram a Maputo a convite da Embaixada da França em Moçambique e estão a identificar talentos que vão beneficiar de iniciativas como residências artísticas.

Rama Diaw é franco-senegalesa. Na sua área de actuação, a estilista apresenta-se como uma profissional aberta, quer na concepção, quer na criação das suas peças de moda. Apesar de viajar muito pelo mundo, de África à Ásia ou da Europa à América, nunca tinha estado num país banhado pelo Oceano Índico. Por isso mesmo, nesta sua primeira vez na Cidade de Maputo, para o Mozambique Fashion Week, tudo é uma boa novidade e um mar de descobertas.

A estilista chegou à capital moçambicana no passado dia 4 deste mês de Dezembro. Não sabe muito da cultura moçambicana. Logo, para preencher essa falta de conhecimento, mal aterrou saiu à rua para procurar tecidos tipicamente tradicionais de Moçambique, longe das capulanas produzidas nas fábricas e, em muitos casos, importadas. No entanto, não encontrou nada e a sua procura continua…

Um dos grandes projectos de vida de Rama Diaw é inspirar pessoas. “Eu gosto de ser inspiradora. No caso, do ponto de vista artístico. Sou uma estilista autodidacta e lutei muito para estar no lugar onde me encontro. Por essa razão, o que me interessa é inspirar outros jovens, que, inclusive, não têm a formação em moda, mas a paixão por esta arte. Com inspiração eles podem atingir os seus objectivos pessoais”.

Engajada na promoção da identidade africana negra, Rama Diaw tem uma exposição no Museu de Arte Africana em Washington, nos Estados Unidos, com a fotógrafa norte-americana Ayana V. Jackson. “É uma exposição sobre o trabalho profundo inerente à identidade africana e da mulher africana, pensando o passado e o presente como forma de definir o futuro”.

A exposição em causa, depois de Washington, será itinerante, devendo seguir para Nova Orleães, nos Estados Unidos, e, depois, para Dakar, no Senegal. Enquanto isso não acontece, parte do que essa exposição é, Rama Diaw trouxe a Maputo para o MFW, até porque, segundo acredita, “A moda é uma forma de exprimir uma identidade de forma positiva”. Em parte, esta é a razão que a levou a viajar para Moçambique, com a pretensão de encontrar estilistas nacionais e africanos para juntos compartilharem perspectivas e possibilidades. “Eu gosto de descobrir outros povos. O mais importante é esta mistura entre nós e de materiais com os quais estamos a trabalhar”.

Para o MFW, sessão marcada para 21h30 deste sábado, na Galeria do Porto de Maputo, o que Rama Diaw trouxe são vestidos de diferentes materiais e de diferentes países africanos. A estilista gosta de inserir na sua criação elementos dos lugares por onde passa. Assim, nesta estadia em Maputo, que vai durar oito dias, também espera levar consigo materiais moçambicanos para as suas próximas colecções, o que pode testemunhar a sua passagem por Moçambique.

Ao todo, na colecção “O mar”, 15 modelos moçambicanas vão vestir mais ou menos 30 peças da estilista franco-senegalesa. Trata-se de um trabalho ainda em construção, que, independentemente de ser apresentado no Senegal ou não, representa uma homenagem às mulheres que têm uma relação especial com o mar. E lembra: “No tempo da escravatura, as mulheres grávidas eram lançadas ao mar. E outras lançavam-se pessoalmente porque, uma vez grávidas, sabiam que não tinha escapatória. Essas mulheres partiram desta vida, mas acredita-se que há um reino no fundo do mar, onde elas existem”.

Partindo dessa história triste, quer na exposição nos Estados Unidos, quer na colecção que vai apresentar em Maputo, Rama Diaw recupera um passado para homenagear a grandeza da mulher africana.

Além de apresentar o seu trabalho no MFW, Rama Diaw quer identificar criadores, porque tem em manga um evento ao redor da moda para Senegal. Portanto, a estilista espera convidar talentos moçambicanos para se apresentarem no outro lado de África.

NADINE GONZALEZ TRAZ CASA 93 A MAPUTO

A pretensão de dar extensão à moda, de encontrar novos mercados, de reaproveitar materiais e de expandir parcerias também constitui uma prioridade para Nadine Gonzalez, Directora da Casa 93, no Norte de Paris. Igualmente pela primeira vez em Maputo, nesta capital se encontra desafiada para estudar a possibilidade de criação de uma incubadora da área da moda em Moçambique.

A Casa 93 é um projecto de uma associação que, há 18 anos, surgiu no Rio de Janeiro, no Brasil, com objectivos de identificar jovens, formar, valorizar e inserir no mercado da moda. O subúrbio é a sua prioridade, todavia, uma vez que o MFW acontece na zona cimento de Maputo, a missão da sua directora, confiada pela Embaixada da França em Moçambique, é, depois de ver os desfiles, escolher um(a) estilista moçambicano(a) que poderá ter uma residência artística em Paris e ainda participar no Paris Fashion Week, tendo como alguns critérios relacionados com a qualidade e originalidade. A pessoa seleccionada, com efeito, será anunciada sábado à noite.

O assunto critério, para Nadine Gonzalez, é fundamental, no contexto da selecção de um ou uma estilista no MFW, pois a Casa 93, por si dirigida, é muito exigente em questões de produção e criação. “Vi muitos desfiles tradicionais, e vi com vários critérios, porque a nossa escola não é comum, é humana, consciente, preocupada com a concepção e reciclagem”.

Segundo acredita Nadine Gonzalez, o mundo já produziu vestuários demais. O que se propõe, doravante, é reaproveitar o que já existe e de forma ecológica e, inclusivamente, em zonas alternativas, como os subúrbios. “Os subúrbios são centros de muita criatividade. A ideia é transformar as frustrações do subúrbio em criação. Nós reaproveitamos as coisas para fazer novidades. Pegamos roupa com defeito ou usada, e reaproveitamos. Para o efeito, contamos com grandes parceiros”.

Uma das coisas que a Casa 93 tem feito é imaginar o futuro da moda daqui a 30 anos. Ao invés de produzir novos tecidos, prefere reaproveitar. “Precisamos de muita reflexão e de investir em outras maneiras de fazer as coisas”. Nesse sentido do reaproveitamento, realça Nadine Gonzalez, um dos exemplos que Moçambique tem é Gonçalo Mabunda, “um artista de dimensão global e que traz essa inspiração para jovens estilistas. Na sua arte, Gonçalo Mabunda recupera tudo”.

Referindo ao facto de o MFW contar com a participação de variados públicos, provenientes de imensos países, Nadine Gonzalez entende: “Acho importante que dentro dos colectivos como o MFW haja estrangeiros ou estilistas de outras proveniências, para consolidar projectos de intercâmbio, para todos nos realimentarmos de culturas diferentes. Por isso, nesta vinda, consideramos o critério sociocultural, de modo que o que é aqui produzido, com as suas especificidades, possa beneficiar a França. Esta é uma troca que será importante para os dois países”.

Referindo-se ao papel da moda, actualmente, a Directora da Casa 93, de Paris, sublinhou que esta arte é importante para os profissionais se exprimirem, experimentarem e contestarem. “A roupa é uma boa maneira para as pessoas se exprimirem e, igualmente, revelarem o seu engajamento na protecção do planeta”.

Tanto Nadine Gonzalez, bem como Rama Diaw participam no MFW a convite da Embaixada da França em Moçambique.

 

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