A Focus Fístula Moçambique, uma organização não-governamental, sem fins lucrativos, que intervém na saúde uro-ginecológica, com foco na prevenção e tratamento da fístula obstétrica, em parceria com a EngenderHealth e o Ministério da Saúde e com o apoio da USAID, realizou, de 15 a 18 de Fevereiro, uma formação de enfermeiras do Serviço Materno Infantil (SMI) das províncias de Nampula e Niassa sobre prevenção, diagnóstico e cuidados da fístula obstétrica, escreve o sítio da Rádio Moçambique.
A formação tinha em vista dotar as enfermeiras de conhecimentos e habilidades em aspectos críticos da prevenção, diagnóstico, encaminhamento e cuidados pré e pós-operatórios de pacientes de fístula obstétrica, visando contribuir para reforçar os cuidados de SMI no âmbito da prevenção e combate à fístula obstétrica em Moçambique.
Segundo Emília Sueia, médica ginecologista, uma das formadoras, esta formação é acertada, pois vai permitir às enfermeiras terem a fístula obstétrica no centro das suas atenções.
“A fístula obstétrica é um problema de saúde pública e requer uma intervenção a todos os níveis. As enfermeiras lidam com a comunidade e têm um papel central na prevenção da fístula. No entanto, elas não podem exercer devidamente este papel sem estarem munidas de conhecimentos sobre a doença, das causas, como prevenir, como diagnosticar e encaminhar para o tratamento”, disse, indicando que, com a formação, espera ver mudanças com vista à redução dos casos da doença.
“Espero que haja mudanças nos nossos locais de trabalho. Mudança no sentido positivo, na componente preventiva, que é no pré-natal, e na componente prática, que é nas nossas salas de parto, na monitorização das nossas utentes, pois, ao fazermos isso, penso que 90 por cento do trabalho estará feito para reduzir a ocorrência de fístulas. As enfermeiras do SMI têm muita interacção com a comunidade, mas esta componente de fístula é muito esquecida. Mas esperamos que, com esta formação, já vai fazer parte das nossas palestras e do nosso trabalho.”
As enfermeiras que se beneficiaram da formação são provenientes dos distritos de Nampula, Moma, Eráti, Nacala, Monapo (Nampula), Lichinga, Mandimba, Cuamba, Lago e Marrupa (Niassa).
Natália Leonel, enfermeira do SMI no Centro de Saúde de Marrupa na província de Niassa, aponta a chegada tardia das mulheres às unidades sanitárias e os partos realizados fora das unidades sanitárias como os grandes desafios para a eliminação da fístula.
“No distrito onde estou, temos, sim, casos de fístula, embora não se registem números elevados. Os casos que temos recebido resultam de trabalho de parto prolongado, muitas vezes devido à demora na chegada às unidades sanitárias. E nós, como enfermeiras do SMI, quando se tratava de fístula, ainda estávamos muito adormecidas. Dificilmente, conseguíamos diagnosticar que uma mulher tinha fístula. A nossa interpretação era que se tratava de uma infecção urinária, ou não dávamos atenção àquela paciente. Isto acontece porque se fala muito pouco da fístula nas unidades sanitárias. É algo diferente do que acontece com outros programas como planeamento familiar. É algo que falamos todos os dias nas palestras, mas, quanto à fístula, é algo que ficava sempre esquecido”.
Com a formação, acredita que o cenário vai mudar. “Nós ouvíamos falar da doença, mas não sabíamos qual era a causa, o que acontece com a mulher com fístula, como podemos prevenir, enfim, com a formação, pude compreender a gravidade da doença e qual é o nosso papel, como enfermeiras do SMI para travar a doença. Acredito que cada uma das enfermeiras que esteve na formação vai fazer a sua parte para mudar o cenário quanto a esta doença. Vamos incluir este tema nas nossas palestras que formos a fazer na comunidade e na unidade sanitária. Vamos trabalhar com os nossos colegas do envolvimento comunitário, pois eles são a chave na prevenção das doenças”.
Por sua vez, Margareth Josseph, enfermeira do SMI em Moma, diz que apesar de uma tendência de redução de casos no distrito de Moma, onde são realizadas cirurgias de casos simples, prevalecem práticas de risco nas comunidades.
“Tínhamos muitos casos de fístula no nosso distrito, e a maioria era de mulheres com idades inferiores. Agora temos estado a trabalhar com líderes comunitários para acabar com casamentos prematuros, e está a diminuir um pouco. Em Moma, descobrimos um centro onde realizavam partos. Havia parteiras tradicionais que incentivavam aquelas práticas. Tivemos de realizar palestras com líderes comunitários e temos estado a ajudar para a redução de casos, mas ainda temos casos de mulheres que realizam partos fora das unidades sanitárias.”
Em relação à formação, considera que foi uma mais-valia, pois a informação em relação à doença ainda era escassa.
Em Moçambique, os dados apontam para a existência de mais de 2500 novos casos de fístula obstétrica por ano.