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Eleven: um CD para ouvir e sonhar

Todo o poder humano é composto de paciência e de tempo.

Honoré de Balzac

O disco com oito músicas já não é assim tão recente, no entanto, é como se fosse, afinal, tendo sido lançado em 2018, no formato digital, desde deste já velho 2019 é que está disponível no formato físico. Eleven é o título e traduz uma criatividade da cantora que extrai dos números substantivos possíveis e talvez inimagináveis.

Tégui é o nome, a voz para ouvir, sonhar e, certamente, vaticinar um futuro a afirmar-se mediante paciência e tempo. Balzac disse tudo nesse muitas vezes citado Eugénia Grandet. E Tegui, como se tivesse lido o romance, vai fazendo do poder dos seus silêncios o eco do seu talento. Logo, quem a ouve à partida compreende o real valor estético da música moçambicana.

26 anos apenas, e nela já se sentem as vibrações de grandes artistas. Tégui é voz, emoção, sedução, simplicidade, ternura, energia, léxico, poesia e promessa. No seu Eleven (aproximadamente 30 minutos de música), ouvem-se, desde o primeiro tema que intitula o disco, uma sonoridade ao nível R&B/ Soul, muito além do que fazem os cantores quotidianos nacionais.

A propósito dos números, o título do disco de Tégui resulta do somatório de cada algarismo que compõe 2018, ano do lançamento das músicas. Então Eleven também é isso: tempo e adição de vários fragmentos que suportaram o percurso da cantora até ao disco. Há-de ser por isso que uma das músicas é intitulada “Kaleidoscópio” (com participação de J.Mc.Edwins), a metáfora da combinação da cor, da absorção da luz e da beleza. Não obstante, nessa música em particular sente-se qualquer coisa de música electrónica, próximo a um timbre vocal brasileiro. Influências ou apropriações? Seja qual for a resposta, uma coisa é certa, Tegui assimila na roda criada a originalidade de como a pretende movimentar.

De facto, nesta apresentação musical Tégui estampa muito de si, desse seu universo feminino, delicado, todavia sem nunca resumir a música a isso. “Mais eu” (com participação de Guto), segunda música do disco, a lembrar +Eu, álbum de estreia de Assa Matusse, é uma narrativa sobre a superação da mulher, determinação e, com efeito, motivacional. Mesmo assim, em muitos casos, o disco é carregado de melancolia. Facilmente se observa essa marca em “Nungungulo” (do bitonga, uma das línguas faladas em Inhambane, significa Deus), em “Au revoir” (com participação de Iron Br11) ou “Open for you”.

Com Eleven Tégui coloca hipoteticamente a música moçambicana num patamar elevado, dando-a uma dimensão universal, longe dessa tendência muito circunstancial. Considerando esta assunção, então, não admira que a suavidade da sua voz seja, a certa altura, uma aproximação a tão apreciável Eefje de Visser, cantora holandesa autora de títulos como “Er is”, “Scheaf”, pkl“Nee Joh”, “Naast me” ou “Verdriet”. Evidentemente, a cantora e compositora moçambicana ainda terá de crescer e superar-se. Para o efeito, na longa estrada adiante, não lhe faltará talento, tempo e paciência.

 

Título: Eleven

Autora: Tégui

Classificação: 15

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