As raparigas enfrentam muitos desafios, como gravidezes precoces, uniões prematuras, abandono escolar e abuso sexual e, para reverter este cenário preocupante, é necessário que a sociedade, no seu todo, invista na rapariga, segundo advogam psicólogos.
Segundo vários especialistas, a transição de adolescência à fase adulta é de turbulência, na qual a jovem rapariga recebe pressão de todos os lados, desde a família, sociedade, até comunidade. É uma fase acompanhada de muitos desafios, desde gravidezes precoces, uniões prematuras, abandono escolar, abuso sexual, entre outros. No entanto, há vários assuntos pertinentes, como a saúde sexual-reprodutiva, que não são abordados, o que as deixa vulneráveis.
Pesquisas feitas no país apontam que 48% das raparigas de 15-19 anos foram mães ou já estiveram grávidas. Adélia Machel fez parte desta estatística. “Tive o meu filho com 18 anos de idade, os meus pais nunca haviam conversado comigo sobre a saúde sexual e reprodutiva. Se calhar se tivesse tido uma conversa mais abrangente sobre o assunto, teria retardado”, contou Adélia Machel.
Adélia lembra-se, com angústia, dos desafios que teve como jovem mãe solteira para cuidar do seu filho, e uma das coisas que teve de fazer foi abrir mão dos seus estudos. O abandono escolar tem sido um dos grandes desafios do Governo e cerca de 50% das raparigas e mulheres jovens não terminam o Ensino Primário devido às uniões prematuras e gravidezes precoces.
Para garantir a sua sobrevivência e do seu bebé, Adélia contou com a Associação Coalizão da Juventude Moçambicana, que apoia os adolescentes e jovens a desenvolverem as suas competências para a vida.
Segundo Ana Ndove, coordenadora do projecto Rapariga Biz, para além da assistência na saúde sexual e reprodutiva, a instituição recebe raparigas vulneráveis e dá apoio, como o uniforme escolar, e capacitam-nas em cursos técnicos para que possam empreender e ter independência financeira.
Foi através da capacitação que Adélia começou a empreender e teve sucesso. Hoje, ela é activista e ensina as meninas dos 14-24 anos de idade, de Mahubo, no distrito de Boane, a empreenderem e fazerem poupança, de modo a que conquistem a liberdade financeira sem depender de terceiros.
O HIV-SIDA tem sido um dos grandes desafios das raparigas, até porque, segundo as estatísticas, cerca 13% dos adolescentes vivem com HIV, dos quais 10,2% são raparigas. Estando neste estado, elas têm sido discriminadas, tanto na sociedade, como na família. É o que aconteceu com Jéssica, nome fictício de uma jovem de 20 anos de idade.
“Eu sempre fui uma menina doente, perdi a minha mãe com oito anos e a minha avó com nove anos. De tanto ficar doente, os meus familiares levaram-me ao hospital para fazer o teste. Quando saíram os resultados, não me disseram o meu estado, apenas o meu irmão me disse que eu tinha gastrite e devia alimentar-me bem”, disse Jéssica.
A menina, que na altura tinha 12 anos de idade, acreditou nas palavras do irmão, mas diz ter começado a notar distanciamento por parte dos seus familiares. A gota de água veio quando a provedora da Saúde lhe informou, na maior inocência, que era seropositiva. Já sabendo do seu estado, Jéssica começou a isolar-se de todos, até das amigas, mas elas, mesmo depois de terem tomado conhecimento disso, apoiaram-na, fazendo-lhe companhia, inclusive nas horas em que devia tomar os antirretrovirais.
Não obstante esta situação, Jéssica diz ter arregaçado as mangas e, hoje, o seu maior sonho é formar-se em psicologia e tornar-se numa grande activista para apoiar outras raparigas e mulheres que enfrentam os actos discriminatórios.
Algumas organizações, como a Ocsida, têm prestado apoio psicossocial aos adolescentes e jovens, porém os psicólogos defendem que o apoio familiar à rapariga é indispensável. Constantino Tivane, por exemplo, é da opinião de que as famílias devem providenciar o devido apoio à rapariga, independentemente do seu estado de saúde.
A discriminação da rapariga seropositiva pode trazer consequências negativas graves, na medida que pode causar enorme sofrimento e levá-la a desistir da medicação e optar por isolamento total.
Além disso, Tivane defende que deve haver um investimento à rapariga para que ganhe autonomia, auto-estima e dignidade, o que pode contribuir para a redução dos índices de discriminação, violência baseada no género e pobreza.